Paranhos, no Mato Grosso do Sul: apesar de o delegado minimizar a possibilidade de o crime ter sido motivado por conflitos por terras, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) disse, em nota, que a região é foco de frequentes conflitos. (Reprodução/YouTube)
Da Redação
Publicado em 13 de junho de 2013 às 12h45.
Brasília – O delegado Rinaldo Gomes Moreira, responsável pelo inquérito instaurado para apurar o homicídio doloso contra o índio Celso Figueiredo, de 34 anos, ocorrido ontem (12) em Mato Grosso do Sul, adiantou que os depoimentos já prestados pelo pai e pela irmão da vítima sugerem que o crime não é resultado dos conflitos por terras, que, somente no último mês, já deixaram um índio morto e outro gravemente ferido no estado.
Celso Figueiredo foi morto com ao menos dois tiros, enquanto caminhava da aldeia guarani-kaiowá Paraguaçu onde vivia até uma fazenda localizada próxima aos limites entre as cidades de Paranhos e Sete Quedas, próximo à fronteira com o Paraguai. O delegado garantiu à Agência Brasil, no entanto, que a polícia vai investigar todas as hipóteses possíveis para esclarecer o crime. Ele não divulgou nome do suspeito do assassinato, que está sendo procurado.
De acordo com o delegado, o crime ocorreu por volta das 5h30 de ontem (12). Figueiredo e seu pai estavam a caminho da Fazenda Califórnia para receber o pagamento por serviços executados na propriedade, onde trabalhava como diarista, quando foram abordados por um homem usando capuz. Em seu depoimento, o pai da vítima contou que o assassino usou uma espingarda para disparar o primeiro tiro contra Figueiredo. Depois, com a vítima já caída no chão, o homem sacou um revólver e fez o segundo disparo.
“Parece ser uma hipótese, digamos, mais remota [a relação com conflito fundiário]. O próprio pai da vítima e a irmã, que têm interesse em ver o caso esclarecido, disseram que a convivência e o acesso à fazenda, por onde os índios costumam passar para ir pescar, é pacífico”, declarou o delegado, revelando que, mesmo assim, o capataz da fazenda será ouvido, já que seria ele quem pagaria Figueiredo pelos serviços prestados à propriedade. Ainda segundo o delegado, o dono da fazenda, que ainda não foi contactado, também vai ser ouvido.
O corpo de Figueiredo foi encaminhado ao Instituto Médico-Legal (IML) de Ponta Porã ainda ontem. O delegado aguarda o resultado do laudo necroscópico para ter certeza do número de tiros e do calibre dos projéteis que mataram o índio. Duas cápsulas foram apreendidas no local do crime.
Apesar de o delegado minimizar a possibilidade de o crime ter sido motivado por conflitos por terras, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) disse, em nota, que a região é foco de frequentes conflitos entre fazendeiros e comunidades indígenas que reclamam o reconhecimento de suas terras tradicionais. Foi nessa mesma região que, em agosto de 2012, tiros foram disparados enquanto representantes do Ministério Público Federal (MPF) se reuniam com os índios a fim de verificar as condições em que estes estavam vivendo.
Em agosto de 2012, índios guaranis-kaiowás e guaranis-ñhandevas retomaram parte da área conhecida como Arroio Korá, que afirmam ter pertencido aos seus antepassados. Em 2004, a Funai atestou, a partir de documentos antigos e fontes bibliográficas, que o território era ocupado pelos dois povos guaranis desde o século 18. Em 2009, a Presidência da República decretou como território de posse permanente dos dois grupos indígenas uma área de 7.175 hectares, denominada Terra Indígena Arroio Korá. Um hectare corresponde a 10 mil metros quadrados, o equivalente a um campo de futebol oficial.
A delimitação da área foi questionada no começo de 2010 por fazendeiros, que ajuizaram um mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) a fim de que o decreto presidencial fosse suspenso. Os donos da Fazenda Polegar, cujos 1.573 hectares ficam no interior da terra indígena, apresentaram documentos comprovando que a família havia adquirido a propriedade em 1923, estando devidamente regularizados. Além disso, argumentavam que a fazenda é produtiva, conforme atestado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
Passados três anos, o processo continua tramitando no STF, com relatoria da ministra Rosa Weber, que assumiu a tarefa em dezembro de 2011.