(Getty Images/Reprodução)
Agência de notícias
Publicado em 18 de agosto de 2024 às 11h40.
Quando Marisa Correia da Cunha chegou à Universidade Presbiteriana Mackenzie, em Higienópolis (região central de São Paulo), às 6h30 deste domingo (18), a Rua Itambé estava praticamente vazia. Por volta das 7h, quando já havia bastante gente por lá, ela era a segunda pessoa na fila que se formava no portão da universidade, subia a ladeira, dobrava a Rua Piauí e chegava ao metrô Higienópolis-Mackenzie, na esquina com a Rua da Consolação. A primeira pessoa da fila não estava a fim de falar com a reportagem e a terceira era Maria do Socorro Correia da Cunha, mãe de Marisa.
A filha estava ali para fazer as provas do Concurso Público Nacional Unificado (CNU), o “Enem dos concursos”. A mãe veio ali para dar apoio moral — e porque “gosta dessas coisas”, diz ela, referindo-se ao clima de agitação e expectativa. Com mais de 2 milhões de inscritos, o primeiro CNU acontece neste domingo em 228 cidades de todo o país.
Marisa tem 39 anos e é técnica de enfermagem. Trabalhou oito anos na rede de saúde privada, perdeu o emprego e agora busca uma colocação no setor público. Ela presta as provas para o Bloco 5, que inclui carreiras em Políticas Sociais, Justiça e Saúde. Marisa e a mãe vieram de Anhanguera, na Zona Norte da capital paulista. A “concurseira” diz ter estudado “bastante”.
— Mas depende do que é bastante para você (risos). Para mim, foi bastante. Gostaria de ter estudado mais, mas eu tinha outras ocupações. Precisei fazer uns bicos como vendedora de semijoias — afirma ela, que procura uma vaga de técnica em enfermagem e almeja a estabilidade proporcionada pelo serviço público.
Leidiane Silva Nagape é outra que madrugou em Higienópolis. Ela saiu de Mairiporã, na região metropolitana de São Paulo, às 5h30. O marido dela estava ansioso, queria que ele saísse logo de casa, com medo de que houvesse trânsito e a candidata se atrasasse para o exame. Mas não havia trânsito, e Lidiane, que se deslocou de carro, já estava no Mackenzie às 6h30.
Aos 42 anos, ela é formada em comunicação social e foi aposentada por invalidez da Polícia Militar após um acidente de motocicleta. Ainda em tratamento, quer ingressar na carreira de auditor fiscal do trabalho. Seu objetivo é resgatar pessoas em situação análoga à escravidão.
— Quando eu era PM, cheguei a resgatar bolivianos em situações degradantes, que trabalhavam em oficinas de costura no centro de São Paulo — conta.
Inicialmente, o CNU estava marcado para o dia 5 de maio, mas foi adiado devido às enchentes no Rio Grande do Sul. Lidiane aproveitou a mudança de data para estudar mais, especialmente a parte de finanças públicas, área em que tem mais dificuldade.
— Esses últimos meses me deram um gás a mais para estudar. Acho que a prova vai ser difícil. Na minha área, tem muitos candidatos médicos e psicólogos, mas me sinto bem preparada. Estudei nove meses e brinco que o hoje é o dia do parto — diz.
Nem todos os candidatos acharam o adiamento das provas um bom negócio. Marcos Vinícius Alves dos Santos reclamou que a alteração no calendário do CNU atrapalhou seu planejamento de estudos. Em maio, ele já estava com o conteúdo todo na ponta da língua, tinha até tirado férias para revisar.
— Ter que estudar tudo de novo mais atrapalhou que ajudou — diz ele, que tem 27 anos.
Marcos Vinícius já é funcionário público. Ele trabalha como auxiliar administrativo, um cargo concursado, na Prefeitura de Francisco Morato, na região metropolitana de São Paulo. É, porém, formado em engenharia elétrica e busca trabalhar na área, mantendo a estabilidade do funcionalismo público. Ele mora em Jundiaí, cidade que fica a cerca de 50 quilômetros de São Paulo. Fazer o CNU em Campinas seria mais perto, mas como ele conhece melhor a capital, achou que valia a pena o deslocamento (uma hora e meia de trem).
Quando conversou com o GLOBO, já passava das 8h e os portões do Mackenzie estavam abertos havia mais de 30 minutos. Marcos Vinícius, no entanto, preferia ficar tomando ar na calçada em vez de esperar a prova já na sala de aula.
— Não gosto de ficar muito tempo esperando lá dentro, mas vou entrar daqui a pouco. Estou um pouco nervoso, vou ver se lembro de todo o conteúdo — comenta.
Às 8h30, os portões do Mackenzie começaram a se fechar. Ainda havia uma fresta aberta quando Carlito Aragão dobrou correndo a esquina da Rua Maria Antônia com a Rua Itambé. Ele subiu a ladeira o mais rápido que pôde, chegou ofegante, mas os portões já haviam sido fechados. Carlito tem 57 anos e trabalha como motorista de aplicativo. Ele se atrasou porque pensava que a entrada seria pelo outro portão da universidade, na Rua da Consolação.
— Dei uma vacilada, geralmente eu saio mais cedo de casa — conta ele, que é morador de Embu das Artes, na região metropolitana.
Carlito comemorou o adiamento das provas, pois teve mais tempo para estudar. Ele passa entre 10 e 12 horas por dia atrás do volante. Tinha tão pouco tempo para focar no concurso que até pensou em desistir.
Depois de mais de 20 anos trabalhando com pesquisa de mercado, ele virou motorista de aplicativo quando decidiu voltar a estudar. Graças ao Enem, conseguiu uma vaga no curso técnico de sistemas eletrônicos do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo.
— Achei que trabalhando por conta ia ter mais flexibilidade, que ia conseguir aliar trabalho e estudo, mas nem sempre é assim — diz Carlito, ainda ofegante da corrida até o portão fechado.
Correção no GLOBO
A prova da manhã teve início às 9h (com fechamento dos portões às 8h30) e vai até 11h30. Já no turno da tarde, as provas começam às 14h30 e serão realizadas até 18h. O GLOBO, em parceria com o Direção Concursos, divulgará, a partir das 19h45 deste domingo, o gabarito extraoficial das provas. Haverá uma live com transmissão no site e nas redes sociais do GLOBO, na qual mais de 20 professores comentarão as principais questões de todas as provas. Para acompanhar a live, clique no link:
https://www.youtube.com/live/yRbLLZ6E4VQ