Por que o governo quer comprar leite em pó do produtor rural?
Alto custo de produção e baixo valor pago ao produtor desequilibram as contas da pecuária de leite. Para mudar o cenário, o Mapa anunciou a compra
Repórter freelancer de Agro
Publicado em 17 de agosto de 2023 às 06h00.
Última atualização em 17 de agosto de 2023 às 14h22.
Desde que a redução da tarifa de importação do leite e de outros produtos lácteos foi instituída no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, as compras externas do produto aumentaram e passaram a desvalorizar a cadeia leiteira nacional. Primeiro, em 2019, com o fim da taxação para importados da União Europeia e Nova Zelândia. Depois, no ano passado, quando passou a valer a menor tarifa para os lácteos do Mercosul, principalmente sobre o leite em pó.
Além disso, aqui no Brasil, mesmo com a redução atual das cotações dos grãos -- como o milho usado para alimentação animal --, os custos e os preços dos insumos continuam historicamente elevados, pressionando as margens da pecuária leiteira.
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Dado o cenário, pecuaristas e indústria se uniram para reinvidicar apoio ao governo federal, o que começa a surtir efeito. Na semana passada, o ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, anunciou que o governo irá comprar leite em pó apreços de varejo, como medida emergencial para socorrer os produtoresbrasileiros que enfrentam a concorrência de países do Mercosul.
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O Ministério da Agricultura e Pecuária, em parceria com o Ministério de Desenvolvimento Agrário e com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), aportou recursos de 200 milhões de reais para apoio à comercialização de leite em pó. "A medida pretende apoiar os preços do leite para dar rentabilidade às cooperativas e aos produtores. O produto será distribuído na merenda escolar e nos programas sociais", afirma a pasta àEXAME.
Importações do leite
Conforme publicação da Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), o volume total de litros de leite que deixou de ser captado no país equivale a 1,2 bilhão de litros, totalizando aumento de 268% em relação a 2022, maior volume da história para o período. Em valores, essas importações totalizam cerca de 443 milhões de dólares, contribuindo para que os preços no campo estejam em queda.
De acordo com dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex/MDIC), de janeiro a julho deste ano, o Brasil importou cerca de 161 milhões de toneladas de lácteos, entre produtos como leite, creme de leite e laticínios, exceto manteiga ou queijo. Apenas no semestre, as importações brasileiras de lácteos tiveram acréscimo de 158% em relação aos primeiros seis meses de 2022. O volume advém principalmente da Argentina e do Uruguai, que juntos somam 850 milhões de litros de leite exportados ao Brasil.
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Na avaliação do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), no mercado interno, o consumo de lácteos segue fragilizado, devido ao menor poder de compra da população em geral e valores.
Como fica a taxação ao Mercosul?
No setor lácteo, cerca de 29 produtos da cadeia foram excluídos desta redução na taxação dos produtos advindos do Mercosul. Assim, atendendo ao pleito de representantes da pecuária leiteira, o governo volta a aplicar de uma alíquota de até 14,4% aos importados, a depender do produto.
A alíquota do imposto de importação aplicada a queijo de pasta mole e de pasta azul e óleo de manteiga foi elevada a 18%. Em julho passado, o governo já havia atendido pleito do setor de elevação da alíquota de complementos alimentares também derivados do leito, como lactalbumina e outras albuminas.
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O impacto no campo
Pedro Augusto Fernandes Guimarães, presidente da Associação Brasileira das Pequenas e Médias Cooperativas e Empresas de Laticínios (G100), afirma que as importações de leite do Mercosul têm apresentado desafios tão grandes aos produtores e indústria locais que há o risco de muitos desistirem da atividade.
Ele também diz que o poder de compra do brasileiro também tem feito alguns produtores saírem do ramo leiteiro, enquanto muitas empresas de menor porte se encerram, e outras procuram parcerias estratégicas com fundo de pensões estrangeiros. "Os indicadores de renda média dos salários são negativos já há alguns anos e o salário-mínimo praticamente está estável, tudo isso contribuiu muito para o início de uma desestruturação do setor”, afirma Guimarães.
Atualmente, a G100 reivindica junto ao Governo Federal e ao Congresso Nacional políticas tributárias que não onerem a cadeia de produção do leite. Para Pedro Augusto é “preciso política de investimentos no mesmo nível que existe nos países que exportam para o Brasil e com a mesma taxa de juros”.
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Alexandre Amorim Monteiro, analista de desenvolvimento técnico da área de mercado do Sindicato e Organização das Cooperativas do Estado do Paraná (Ocepar), traz a perspectiva de que a desvalorização da produção local cause a dependência excessiva de produtos importados. "Isso pode prejudicar a produção local e a autossuficiência em produtos lácteos, afetando a economia rural e a geração de empregos nas áreas de produção", afirma.
Para ele, o receio do setor no campo inclui a continuidade das atividades no âmbito familiar. “Tendo como uma das principais questões a desigualdade na concorrência, isso coloca em jogo a capacidade das famílias brasileiras de manter suas operações leiteiras”, diz Monteiro.