O trio Ganso, Robinho e Neymar, do Santos: comercial visto 5 milhões de vezes no YouTube (Divulgação)
Da Redação
Publicado em 18 de fevereiro de 2011 às 11h38.
Amanhã do sábado 15 de maio foi especialmente festiva para os habitantes da cidade de Jaguariúna, a 120 quilômetros de São Paulo. Num palco improvisado às margens de dois lagos artificiais (destinados ao tratamento de resíduos), o prefeito do município, um padre e um mestre de cerimônias comemoraram a inauguração da 33a fábrica do grupo Marfrig, segundo maior frigorífico do país, com faturamento na casa dos 10 bilhões de reais. A solenidade, que reuniu aproximadamente 100 entusiasmados jaguariunenses, foi aberta com um discurso do executivo José Mayr Bonassi, diretor da Seara, marca adquirida da Cargill em setembro de 2009 por 900 milhões de dólares.
O encerramento foi programado para ser apoteótico, embalado pelo Tema da Vitória, música imortalizada nas vitórias do piloto brasileiro Ayrton Senna na Fórmula 1. Marcos Molina dos Santos, de 40 anos, presidente e fundador da Marfrig, assistiu a tudo em meio à plateia, deu alguns apertos de mão e saiu sem fazer declarações. Embora discreta, sua presença revela a importância que a Seara ganhou para o grupo - é com ela que a Marfrig pretende encostar na BR Foods, líder na fabricação de alimentos industrializados do país e dona da Perdigão e da Sadia. "Antes, éramos apenas uma multinacional de marcas regionais", afirma Bonassi. "Com a Seara, ganhamos uma marca para competir nacionalmente."
Por enquanto, trata-se de uma competição desigual. A BRF tem um faturamento quase 14 bilhões de reais superior ao da Marfrig. Por isso mesmo, Molina, uma das novas faces do capitalismo brasileiro, partiu para soluções pouco convencionais. A mais surpreendente foi o investimento em futebol, algo inédito na história da Marfrig, fundada em 2000. Para promover a marca Seara nacionalmente, estima-se que a Marfrig tenha investido 25 milhões de reais em contratos de patrocínio com o Santos Futebol Clube, a seleção brasileira e as Copas de 2010 e 2014. É, de longe, o maior investimento do frigorífico em uma única marca. A ousadia de Molina ficou evidente na irreverência demonstrada por sua empresa ao veicu lar seu mais recente comercial na TV. Nele, o badalado trio de garotos do Santos - Robinho, Neymar e Paulo Henrique Ganso - imita a curvilínea cantora americana Beyoncé. O vídeo com a paródia do hit Single Ladies foi visto mais de 5 milhões de vezes no YouTube. "Escolhemos o Santos porque é um time sem rejeição", afirmou a EXAME Marcos Molina, um corintiano convicto. "Mas nunca imaginei que os meninos fossem dar esse show."
Um salto de 7 bilhões de reais
A abertura de capital, em 2007, deu fôlego para a Marfrig financiar sua expansão e aumentar o faturamento em 178% em três anos.
A trajetória de Molina é simbólica dos novos tempos nos negócios brasileiros. Sua empresa, até há pouco tempo desconhecida, é o centro do que hoje é um dos maiores grupos brasileiros, segundo levantamento da edição especial Melhores e Maiores 2010. O paulista Molina, por sua vez, é a personificação de um espetacular movimento de mobilidade social ocorrido nos últimos anos em economias emergentes como o Brasil.
Na década de 80, ele iniciou sua carreira vendendo os miúdos de boi que sobravam no açougue de seu pai. Logo depois, descobriu que poderia expandir o negócio vendendo carne diretamente para restaurantes do ABC, na Grande São Paulo. Juntamente com o JBS-Friboi, maior empresa brasileira do setor, transformou-se nesta década num dos grandes consolidadores do mercado de carnes. Sua formação educacional é básica - na última conferência de resultados com analistas, realizada em maio, afirmou que gostaria de fazer da Seara uma marca "grobal". Trata-se de um caminho que ele já percorreu. A Marfrig tem fábricas em sete países, entre eles França, Reino Unido e Holanda, e vende seus produtos em uma centena de mercados. De 2007 para cá, seus negócios praticamente triplicaram de tamanho. Molina não posa para fotos e concede raríssimas entrevistas. Ele faz negócios. Neste ano, seu frigorífico deve lançar 120 novos produtos, 100 deles com a marca Seara (em 2009 foram apenas 14). A maior parte dos 28 itens que já chegaram às gôndolas é composta de variações de sabores de produtos da linha antiga - e apresenta uma inegável semelhança com asembalagensda Sadia. "A Seara terá um preço intermediário entre Sadia e Perdigão", diz Ricardo Florence, diretor de planejamento da empresa.
Nessa disputa com a BR Foods, a Marfrig tem contado com um aliado: o varejo. A união da Sadia com a Perdigão, celebrada em maio de 2009, fez com que a concentração de mercado em alguns setores, como o de congelados de carne e massas, chegasse perto dos 80%, reduzindo o poder de barganha de muitos revendedores. Parecia o ambiente perfeito para o segundo colocado se apresentar. Para ganhar mais espaço nas gôndolas, estima-se que a Marfrig tenha aumentado em 20% as verbas para promoções em padarias e supermercados. Além disso, passou a oferecer sete dias a mais de prazo para o pagamento das mercadorias (o prazo médio no setor é de 28 dias). "A Seara sempre foi uma concorrente natural, mas estava desaparecida das prateleiras", diz Everton Muffato, diretor comercial da rede paranaense de supermercados Muffato. Na tentativa de ganhar força nas negociações, em março a Marfrig unificou as equipes de vendas de todas as suas seis marcas no Brasil.
Enquanto Molina se movimenta, a BR Foods vive o impasse da fusão. A união entre Sadia e Perdigão ainda não foi aprovada pelo Cade - e, com isso, a BRF está impedida de juntar suas estruturas. Para a Marfrig, trata-se deumavantagem, mas não de uma garantia de sucesso. No mercado de capitais, a cotação das ações do frigorífico expressa o ceticismo de analistas e investidores. Desde o início deste ano, o valor dos papéis caiu 15% - no mesmo período, as ações da Brasil Foods desvalorizaram 2%. "Ainda não está claro qual será o impacto da Seara nos resultados da Marfrig", afirma Rafael Cintra, analista da Link Investimentos. A nova fábrica de Jaguariúna aumentou em 11% a capacidade de produção da empresa. Mas ela continua a ser metade do que é a BR Foods. O caminho de Molina é longo. Fazer três dos mais geniais craques brasileiros brincar com a bola ao som de Beyoncé é só um (divertido) começo.