Bochi, diretor de novas tecnologias para cana da Syngenta: em uma década, a empresa prevê colocar no mercado uma variedade de cana transgênica (Germano Lüders/EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 18 de fevereiro de 2011 às 11h39.
Em fevereiro de 2009, o gaúcho Marco Bochi, diretor de novas tecnologias para cana da subsidiária brasileira da suíça Syngenta, fez uma peregrinação por lavouras de dez usinas de cana no interior de São Paulo. Em todas as terras estavam plantados milhares de pedaços de caule de cana que, depois de quimicamente tratados, haviam ganhado uma bizarra tonalidade rosa-choque - e viriam a germinar dois meses depois. Batizado de Plene, o primeiro produto 100% desenvolvido pela Syngenta no país entra em escala industrial a partir de janeiro, quando a fábrica para o corte, o tratamento e a embalagem dos pedaços de cana ficará pronta em Itápolis, a 350 quilômetros da capital paulista. Mais do que uma inovação, o Plene representa a estreia da Syngenta num mercado que fatura mais de 1 bilhão de reais por ano - o de mudas para o plantio de cana -, até agora praticamente restrito às pesquisas de associações sem fins lucrativos mantidas pelos próprios produtores. "Fechamos o primeiro contrato em julho e já estamos com pedidos de quase 400 milhões de reais para os próximos três anos", diz Bochi.
O embrião do Plene surgiu em 2006, quando a Syngenta criou um portal de inovação para estimular funcionários a mandar ideias que pudessem gerar novos negócios para a companhia. No ano seguinte, um dos 200 pesquisadores da empresa, o paulista Antônio Carlos Nascimento, propôs usar produtos químicos em pedaços de cana, de modo a transformá-los em uma espécie de "semente" - o objetivo era criar uma alternativa ao plantio tradicional, que exige a dedicação de pelo menos 5% da área da lavoura ao cultivo de mudas. A partir daí, o projeto foi encampado pela área de novos negócios da Syngenta. A primeira tarefa dessa equipe foi convencer a matriz a financiar a iniciativa. "Filmamos o método convencional, fizemos desenhos animados do que imaginávamos que seria o Plene e fomos à Suíça com dados sobre o potencial do mercado", diz Bochi. "Meses depois, conseguimos a aprovação para seguir em frente."
Com o sinal verde, o projeto passou a ser tratado como uma espécie de startup dentro da empresa - um negócio com lógica própria. Na sede da Syngenta, em São Paulo, um andar inteiro foi ocupado pela recém-criada divisão de novas tecnologias em cana. Em seis meses, Bochi recrutou cerca de 50 pessoas para compor as equipes de pesquisa, vendas e marketing dedicadas exclusivamente ao projeto. Todo o processo foi acompanhado de perto pela matriz. Um comitê executivo composto de oito diretores baseados na Suíça encarregou-se de cobrar os resultados e aprovar o envio de verbas gradualmente. A lógica era desvincular o desenvolvimento do Plene do orçamento anual da subsidiária. A última leva, de 60 milhões de reais, chegou em junho (a empresa não revela o investimento total) e será suficiente para terminar as obras da fábrica de Plene, cuja patente está protegida desde 2007. "Dar dinheiro conforme avança o projeto pode ser muito mais eficiente do que aprovar um orçamento gigante logo de cara", afirma José Cláudio Terra, diretor da consultoria TerraForum, que ajudou a Syngenta a estruturar a metodologia de inovação.
Rumo aos transgênicos
Para levar a ideia adiante, foi preciso buscar ajuda fora da companhia. Com a John Deere, por exemplo, a Syngenta fechou um acordo para criar uma plantadeira específica para o Plene. Cerca de 20 engenheiros da fabricante de máquinas agrícolas no Brasil e nos Estados Unidos trabalharam ao longo de dois anos sobre cinco protótipos até chegar ao modelo ideal. A busca por parcerias também foi decisiva para os experimentos realizados em campo. Ao se aproximar dos 40 maiores grupos usineiros do país, a empresa conseguiu não apenas apresentar melhor a tecnologia como também fazer testes que ajudaram a definir a versão final do produto. "Calculamos que podemos diminuir o custo total do plantio em até 15% ao utilizar esse sistema", afirma Eduardo Junqueira da Motta Luiz, sócio da usina paulista Guaíra, primeiro comprador do Plene.
A partir de agora, a empresa terá de mostrar que a estrutura criada para o Plene pode oferecer mais do que apenas um método alternativo para plantar cana. Novata no ramo, a Syngenta nem ao menos possui variedades próprias da planta. Um longo caminho de pesquisa e desenvolvimento terá de ser feito para alcançar concorrentes como a Monsanto, que em 2008 comprou da Votorantim Novos Negócios a Alellyx e a CanaVialis, especializadas no desenvolvimento de novas variedades de cana - hoje são vendidas no mercado. O cronograma da Syngenta prevê que em cinco anos a empresa poderá colocar no mercado variedades desenvolvidas dentro de casa e até o final de uma década desenvolver uma cana transgênica. A razão para previsões tão otimistas é simples - impulsionada pela expansão do etanol, a cana é o produto agrícola que mais cresce no país e ocupa o segundo lugar entre as maiores culturas agrícolas, atrás apenas da soja. "Só recentemente a produção de cana atingiu volume suficiente para atrair essas empresas", diz o biólogo Fernando Reinach, fundador da Alellyx e da CanaVialis e um dos maiores especialistas do país em tecnologia para o agronegócio. Embora tenha entrado atrasada nesse jogo, a Syngenta agora sonha alto. "Estamos apenas começando", diz Bochi.