Protesto de estudantes na Inglaterra: como sempre ocorre em tempos de incertezas, a tentação das políticas protecionistas vai voltar (Christopher Furlong/Getty Images)
Da Redação
Publicado em 18 de fevereiro de 2011 às 11h40.
Logo depois de sofrer uma derrota humilhante nas eleições legislativas de novembro, Barack Obama foi obrigado a engolir um remédio amargo. O presidente dos Estados Unidos quebrou uma das principais promessas de sua campanha eleitoral: aceitou estender por dois anos um corte de impostos para os americanos mais ricos determinado por seu antecessor, George W. Bush. Em troca, obteve uma ampliação dos benefícios emergenciais para os desempregados. Foi a primeira de muitas concessões que estão no horizonte de Obama nos dois anos finais de seu mandato.
E, a julgar pelo tom da campanha eleitoral, logo o alvo dos políticos americanos vai se voltar para fora do país. Embora o pior da crise econômica tenha ficado para trás, as taxas de desemprego nos Estados Unidos seguem perto dos 10%, e não há expectativa de que elas caiam de forma significativa no curto prazo. O problema pode ter sido gestado dentro do país, mas o vilão escolhido, claro, é a China. Uns culpam as empresas que continuam criando empregos do outro lado do mundo; outros, os bilionários empréstimos que o capa | tendências 2011 governo americano tem de contrair dos chineses para pagar suas contas.
Como sempre ocorre em tempos de incerteza, a tentação das políticas protecionistas vai voltar para a agenda da maior economia do mundo. Mas o argumento inverso é igualmente poderoso. A ascensão de uma nova classe média global, nos países emergentes e especialmente na Ásia, parece ser a força mais importante de uma recuperação econômica dos países ricos. “A Europa e os Estados Unidos precisam se reequipar e ser capazes de exportar suas inovações e marcas para esse novo bilhão de consumidores de classe média”, escreveu recentemente Gordon Brown, ex-premiê britânico na época do estouro da crise do crédito de 2008 e autor do recém-lançado Beyond the Crash: Overcoming the First Crisis of Globalisation (“Além do crash: superando a primeira crise da globalização”, numa tradução livre). Agora, a melhor esperança dos ocidentais que se acostumaram a comprar bens produzidos por trabalhadores na China é, ironicamente, ter um trabalho cujo produto final seja comprado pelos chineses.
Quanto os chineses estão dispostos a comprar é questão essencial para uma verdadeira recuperação econômica global e, por consequência, para os rumos da globalização. Estima-se que o renminbi, hoje, tenha um valor próximo ao de 1990. Ao manter a moeda artificialmente desvalorizada, os chineses conseguem baratear suas exportações e atrair fábricas e empregos — mas também encarecem tudo o que é importado. Além disso, muitos dos trabalhadores que migram do campo para trabalhar em fábricas não têm a permissão de se estabelecer com sua família nas cidades, o que impõe limites às populações urbanas e, portanto, ao consumo de mais bens e serviços. Sem contar, é claro, que o milagre econômico no país, por mais admirável que seja, ainda não chegou a uma parte enorme do 1,3 bilhão de habitantes. Em média, cada chinês consome apenas cerca de 2 500 dólares por ano. Nos Estados Unidos, esse valor é 12 vezes maior.
A proposta americana de buscar alguma forma de equilíbrio nas balanças comerciais das principais economias do mundo foi recebida com frieza por países como a China e a Alemanha. Ambos são grandes exportadores e, na prática, teriam de encontrar maneiras de reduzir seus superávits comerciais — justamente o que permitiu aos dois países escapar do pior da crise financeira mundial. Na Europa, as dificuldades na zona do euro ainda não permitem afastar a possibilidade de fracasso do mais arrojado experimento de integração econômica jamais concebido.
O desejo de alguns países de retomar o controle sobre a política monetária — desvalorizando a moeda para melhorar a competitividade internacional do país — pode levar ao começo do fim da moeda única. A crise também está acirrando as tensões políticas internas dos países do bloco, e os sacrifícios impostos pelas medidas de austeridade continuam gerando protestos violentos por todo o continente. Para além da questão do consumo em países ainda pobres em sua maioria, e historicamente frugais, a chave para desatar o atual nó vai depender de complicados concertos.