Revista Exame

Com Abilio, um novo plano para a BRF

Os fundos Previ e Tarpon explicam a EXAME por que se aliaram a Abilio Diniz para mudar a estratégia da BRF, uma das maiores empresas de alimentos do mundo


	Abilio Diniz: aliado a dois acionistas para comandar a BRF 
 (EXAME.com)

Abilio Diniz: aliado a dois acionistas para comandar a BRF  (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 22 de fevereiro de 2013 às 20h20.

São Paulo - Num país que preza tanto seus “campeões nacionais” dos negócios, parece uma loucura fazer reparos à trajetória da BRF, o gigante de alimentos que nasceu com a fusão entre as arquirrivais Sadia e Perdigão em 2008. Com faturamento de 28 bilhões de reais e presença em 140 países, a BRF é uma multinacional brasileira de verdade. Suas ações nunca valeram tanto. Atual­mente, a empresa vale 36 bilhões de reais na bolsa. Motivo para a felicidade dos acionistas? Nada disso.

Como hoje se sabe, um grupo de sócios liderado pela Previ, fundo de pensão do Banco do Brasil, e pela gestora de recursos Tarpon está arquitetando uma virada na estratégia da empresa. Pela mão forte dos dois, a aposentadoria do presidente do conselho de administração da BRF, Nildemar Secches, foi antecipada em um ano. Aliado a dois acionistas insatisfeitos está o empresário Abilio Diniz, que comprou mais de 1 bilhão de reais em ações da BRF e é o candidato do grupo ao cargo de Nildemar.

Assim, Abilio acumularia a presidência do conselho de dois colossos, um do varejo (o Pão de Açúcar) e outro da indústria (a BRF). É um plano mirabolante — e, até agora, seus arquitetos mantinham silêncio a respeito de suas intenções. Os milhares de acionistas da BRF, portanto, ainda estão no escuro.

À medida que se aproxima a assembleia de acionistas de abril, que definirá a composição do conselho de administração da BRF, as coisas começam a ficar mais claras. Representantes de Previ e Tarpon falaram com exclusividade a EXAME sobre seus planos. “Queremos que a nova administração da BRF tenha o espírito de transformá-la na líder mundial no setor de alimentos”, diz Marco Geovanne, diretor de participações da Previ, maior acionista da empresa.

De acordo com esse grupo de acionistas, a atual cúpula da BRF estava tão envolvida com o processo do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão de defesa da concorrência, que não tinha acordado para as oportunidades criadas pela fusão. A palavra de ordem, a partir de agora, é acelerar.

“A BRF não pode se acomodar na liderança em determinados mercados, precisa criar novos produtos ou até categorias”, diz Pedro Faria, sócio da Tarpon e conselheiro da empresa. Os acionistas miram uma margem de lucro operacional (margem Ebitda) de 15% a 19%, bem acima dos atuais 10%. A meta é levar o faturamento para 50 bilhões de reais até 2015.

Para alcançar esse objetivo duplo, será necessário usar a atual BRF como base para criar outra. Hoje, produtos in natura, como cortes de aves para exportação, representam 40% da receita total da companhia. Como são pouco rentáveis, esses itens deixam a empresa muito exposta à variação do preço das commodities usadas na ração animal.


Foi o caso em 2012, quando a alta do preço do milho corroeu a margem da BRF. Previ e Tarpon pretendem mudar drasticamente essa situação. O objetivo é aumentar a parcela da receita obtida com a venda de produtos mais elaborados, como pratos prontos ou carnes processadas. Em Abilio Diniz, os dois fundos encontraram um sócio com dinheiro no bolso, experiência de décadas no varejo e, como se sabe, ambição incomum.

Duas empresas são citadas como modelos para a BRF em sua nova fase. A primeira é a suíça Nestlé, vista como um exemplo tanto de gestão de marca quanto de presença na cabeça do consumidor. A segunda é a americana Sysco, que fatura 42 bilhões de dólares por ano com a venda de comida para hospitais, escolas e padarias. Seria o jeito, na visão dos acionistas, de crescer no Brasil sem chamar a atenção dos órgãos de defesa da concorrência: criando novos mercados.

Para os acionistas, o que sobra a Abilio é justamente o que faltou à administração da BRF nos últimos anos: ambição. Envolvida nas difíceis negociações com o Cade, que a obrigaram a vender marcas no Brasil para reduzir a concentração em alguns segmentos, a empresa não explorou outras oportunidades no mercado interno. Poderia, segundo essa visão, ter crescido nos mercados de lácteos, principalmente em queijos e sobremesas. “Por que a cervejaria Ambev tem 1 milhão de pontos de venda no Brasil e a BRF tem só 150 000?”, pergunta Faria, da Tarpon.

Ousadia no exterior

Também não houve grandes investimentos na expansão no exterior. Em 2012, a BRF anunciou a construção de uma fábrica nos Emirados Árabes e a compra, por 36 milhões de dólares, de uma empresa de distribuição no país. Na troca de ativos com o frigorífico Marfrig para cumprir o acordo com o Cade, entregou uma série de marcas e ficou com a Quickfood, dona da marca de hambúrgueres Paty na Argentina.  

“Com a vantagem competitiva do Brasil no mercado de proteína animal, a BRF tem condições de ser uma das maiores empresas de alimentos do mundo”, afirma Geovanne. A prioridade está nos países emergentes, onde a perspectiva de crescimento é maior. Dinheiro não é problema. Segundo Tarpon e Previ, a estrutura de capital pulverizada da BRF ajuda na hora de fazer grandes aquisições:  fica mais fácil emitir ações, já que não há um controlador preocupado com a diluição de sua participação.

O alvo mais claro até agora é o Oriente Médio, onde a marca Sadia é muito conhecida. Outro objetivo é sofisticar a oferta de produtos no exterior, produzindo especificamente para cada mercado. “A BRF tem de sair da exportação de commodities e oferecer produtos de alto valor adaptados a cada país”, segundo Faria, da Tarpon. A empresa avalia há alguns meses comprar uma empresa de alimentos na África do Sul. Outra possibilidade é acelerar os investimentos na China, onde a companhia tem uma joint venture para distribuição.


 O vazamento dos detalhes das negociações azedou o humor de outros sócios, como o da fundação Petros, e impediu o fechamento de um acordo em torno do nome de Abilio para a presidência do conselho antes que Secches apresentasse sua carta de renúncia. Em janeiro, especulou-se que a Petros lançaria uma alternativa a Abilio — o que não havia acontecido até o fim da primeira semana de fevereiro. 

A data limite para o lançamento de uma nova chapa é 9 de março. Mas Previ, Tarpon e Abilio já atuam como se estivesse tudo certo. Ficou definido que o presidente da BRF, José Antonio Fay, continuará no cargo pelo menos até 2014, quando completa 60 anos, idade limite para os presidentes da BRF, segundo o estatuto. Um executivo de Abilio seria, então, indicado para o cargo de presidente da operação brasileira e, até 2014, treinado como sucessor de Fay.

Para Abilio, mandar na BRF não sairá de graça, e não apenas porque ele já gastou 1 bilhão de reais em ações da empresa. Acumular o comando do conselho de companhias que dependem tanto uma da outra vai gerar a indagação: não há um conflito de interesses? O Pão de Açúcar não pode ser usado para melhorar o resultado da BRF e vice-versa? Abilio e seus advogados garantem que não.

Seus novos sócios afirmam que podem ser criadas regras que impeçam Abilio de participar de decisões em que o conflito seja mais óbvio. O Casino, sócio francês de Abilio no Pão de Açúcar, já avisou que não deixará barato: promete aproveitar a movimentação para forçá-lo a sair do Pão de Açúcar. Abilio, por sua vez, comunicou que não cederá. O que os acionistas da BRF estão achando de tudo isso? A resposta será dada em abril.

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