Revista Exame

A indústria do luxo agora invade o interior do Brasil

Cansadas de disputar clientes em shoppings de São Paulo, as empresas de luxo estão descobrindo o consumidor do interior do país — que, rico como nunca, quer mesmo é esbanjar

O advogado Rezende e a noiva, Nathany: Ferrari e avião de 18 milhões de reais 
 (Cristiano Mariz/EXAME.com)

O advogado Rezende e a noiva, Nathany: Ferrari e avião de 18 milhões de reais (Cristiano Mariz/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 21 de setembro de 2013 às 09h00.

São Paulo - Mostrar que venceu na vida é a atividade predileta do advogado goiano Djalma Rezende. Aos 60 anos, tem um Porsche e uma Ferrari na garagem, um lustre de cristal Baccarat pendurado na sala e uma noiva de 22 anos, a estudante de direito Nathany Mendes, nos braços.

Em dezembro de 2012, ele se deu de presente um jatinho da italiana Piaggio Aero — marca que produz o avião da Ferrari —, avaliado em 18 milhões de reais. “Fui criado na roça e hoje faço questão de consumir o que há de melhor”, diz, com o orgulho típico dos novos-ricos.

Especialista em disputas de terra, Rezende fez fortuna ao atender fazendeiros e empresários da região. Entre seus clientes estão alguns dos empresários mais poderosos de Goiás, como Marcelo Henrique Limírio, fundador do laboratório Neo Química, e João Alves de Queiroz Filho, dono da empresa de bens de consumo Hypermarcas. 

Até pouco tempo atrás, ele costumava — as agruras dessa vida! — ir a São Paulo ou a Miami para torrar seu dinheiro em roupas, joias e vinhos. Mas, de dois anos para cá, as coisas ficaram mais fáceis para Rezende. Sua região ganhou empórios, joalherias e butiques. Seu avião, por exemplo, foi comprado em Uberlândia, a 360 quilômetros de sua casa, em Goiânia.

“Encontro quase tudo por aqui. Até caixa de Château Pétrus já dá para comprar em Goiânia”, afirma, referindo-se a um dos vinhos mais caros do mundo. As empresas de luxo estão descobrindo o óbvio: o interior do país nunca foi tão coalhado de gente rica — e disposta a gastar e a ostentar de um jeito que pegaria mal em cidades grandes.

As vendas do mercado de luxo no Brasil triplicaram nos últimos sete anos. Chegaram a 20,7 bilhões de reais em 2012. A expectativa é que haja um crescimento de 10% a 20% ao ano até 2020, segundo a consultoria MCF. Mais de 40 grifes internacionais — como a francesa Hermès e a italiana Prada — começaram a operar no país desde 2009.

Nos primeiros anos, era natural que essas marcas se estapeassem para conquistar os maiores mercados do país, São Paulo e Rio de Janeiro. A construção de shoppings como Cidade Jardim e JK Iguatemi, em São Paulo, é um reflexo disso. Mas, com a concorrência apertando, fica mais difícil alcançar as metas de vendas impostas pelas matrizes. O jeito tem sido ir atrás dos ricaços do interior.

O estado de São Paulo ainda concentra 49% dos milionários brasileiros, mas é no interior e nas cidades médias que o número de ricos mais cresce, segundo um levantamento do banco americano Haliwell, especializado em gestão de fortunas. De acordo com as contas do Haliwell, o número de moradores  do Centro-Oeste com pelo menos 1 milhão de dólares disponível na conta cresceu 10% nos últimos dois anos.


Em Cuiabá, o crescimento chegou a 23%. Cidades médias de outras regiões, como Porto Velho e Campina Grande, também estão entre as que mais ganharam milionários — em termos relativos, claro. Isso acontece porque, enquanto Rio de Janeiro e São Paulo têm uma economia diversificada e acabam refletindo o desempenho do PIB do país, o interior é influenciado por fenômenos locais. 

O maior exemplo é a agropecuária, que cresceu 13% nos últimos 12 meses e tem feito sobrar dinheiro em diversos estados do país.

As empresas de luxo, como consequência, nunca atacaram em tantas frentes. Em outubro de 2012, o shopping RioMar, em Recife, foi inaugurado com lojas da inglesa Burberry e da alemã Hugo Boss. Em setembro, será aberto o Pátio Batel, em Curitiba, com a francesa Louis Vuitton e a joalheria americana Tiffany.

É um mundo novo para as grifes, que são obrigadas a inventar formas de se aproximar da clientela. Em março, a grife italiana Ermenegildo Zegna despachou para Recife um vendedor italiano para mostrar aos pernambucanos que a empresa sabe fazer ternos apropriados ao clima do Nordeste.

Os 30 ternos encomendados foram feitos na Itália e enviados de volta com uma etiqueta bordada com o nome de cada cliente. As marcas também passaram a organizar eventos para se apresentar aos novos-ricos. A primeira-dama de Goiás, Valéria Perillo, organizou, em junho, um desfile da joalheria Tiffany e da estilista americana Diane von Furstenberg para 350 convidados.

A Tiffany também escolheu a designer de interiores Leandra Gualberto para ser sua embaixadora em Goiânia. No fim de agosto, ela reuniu em sua mansão 80 socialites, que puderam comprar por 300 reais chaves premiadas que abriam dez caixas de joias cedidas pela Tiffany. O dinheiro foi doado para caridade — fazer caridade pega bem entre as socialites.  

Para chegar a essas novas regiões, as empresas enfrentam dificuldades notórias. A marca suíça de relógios Jaeger Le-Coultre criou uma espécie de comércio eletrônico personalizado. Se alguém no interior quer comprar um relógio da grife, o vendedor entra num avião em São Paulo e vai até ele (essa trabalheira toda só faz sentido porque cada relógio custa pelo menos 20 000 reais).

Para diluir seus custos, a fabricante italiana de iates Ferretti, que vende barcos de até 50 milhões de reais, fechou parcerias para oferecer em suas lojas carros da Rolls-Royce, imóveis e relógios suíços. Já a Louis Vuitton, com sete lojas no país, adotou outra estratégia: lançou sua loja virtual em agosto para alcançar consumidores em regiões isoladas.

“O Brasil é grande demais, não faz sentido para uma grande marca de luxo pensar apenas em São Paulo”, diz Gabriele Zuccarelli, sócio da consultoria Bain & Company. Consumidores como Djalma Rezende vão continuar a aparecer. Sorte das grifes — e de revistas que, como EXAME, precisam de boas fotografias para ilustrar suas reportagens sobre luxo.

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