Revista Exame

Mais do que 700 milhões de reais do Carlyle

Nove meses após compra da CVC, o fundo de investimento Carlyle mostra que não veio apenas colocar dinheiro - e prepara a empresa para entrar em novos negócios

PATRIANI, PRESIDENTE DA CVC: ele agora convive com 15 executivos sem experiência em turismo, focados em criar novos negócios (Omar Paixão/EXAME.com)

PATRIANI, PRESIDENTE DA CVC: ele agora convive com 15 executivos sem experiência em turismo, focados em criar novos negócios (Omar Paixão/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 18 de fevereiro de 2011 às 11h39.

Para explicar as dimensões do navio de cruzeiro Zenith aos moradores de São José do Rio Preto, no interior de São Paulo, a operadora de turismo CVC criou um folheto com uma linguagem familiar para a região. Segundo o anúncio, o Zenith pesa o equivalente a 945 caminhões de cana-de-açúcar. Embarcar num navio desse porte para a rota Santos-Búzios no próximo verão, explica o encarte amarelo e azul, custa apenas dez parcelas de 110 reais. Tem sido assim nos últimos 38 anos. Mensagens simples e produtos com preços agressivos ajudaram a CVC a alcançar a liderança do mercado brasileiro de turismo, com cerca de 70% de participação. "Somos uma espécie de Flamengo", diz Valter Patriani, presidente da CVC. "Temos liderança, não importa em que classe social." Nos últimos meses, porém, a CVC começou pela primeira vez a articular negócios além da seara em que atua há mais de três décadas. Nove meses depois que o fundo de private equity Carlyle pagou 700 milhões de reais por 63,6% de suas ações, a empresa se prepara para entrar em novos negócios. "Esse caminho será fundamental para acelerar a expansão", diz Fernando Borges, principal executivo do Carlyle no Brasil, que pretende dobrar as vendas da CVC até 2013.

A ideia é buscar oportunidades que não exijam muito investimento e deem retorno rápido. O primeiro exemplo é a entrada da CVC no negócio de locação de automóveis, numa parceria com a americana Avis. No fi m de setembro, a empresa começou a oferecer o serviço de aluguel dentro de suas 530 lojas pelo país. A única adaptação necessária foi treinar 1 000 funcionários que já trabalhavam nessas unidades. Estima- se que a operação de aluguel de carros renderá 40 milhões de reais já no primeiro ano de operação. Outros dois novos negócios estão prontos para sair do papel. Um deles é a ampliação do canal de vendas online, hoje responsável por apenas 10% das receitas. Atualmente, uma equipe de 100 funcionários da CVC trabalha com vendas virtuais. A meta é dobrar esse time nos próximos cinco anos. O outro é a criação de uma unidade de serviços fi nanceiros, similar ao de grandes varejistas, para lançar, por exemplo, um cartão de crédito próprio. "Faz todo o sentido para uma companhia focada na classe C", diz Flavio Litterio, diretor da consultoria Roland Berger.


À frente desses projetos está uma equipe de 15 executivos sem nenhuma experiência prévia no setor de turismo. Eles formam a recém-criada diretoria de planejamento e novos negócios da CVC, liderada por Sandro Sant’Anna, contratado em junho da Monsanto, e com passagem pela Credipronto, empresa para fi nanciamento de imóveis criada pela Lopes e pelo banco Itaú. Sant’Anna teve apenas três meses para contratar toda a equipe. "Estamos transformando uma companhia familiar numa empresa profi ssional", diz Borges, do Carlyle. Na expansão da área fi nanceira, Sant’Anna terá a missão de criar novas modalidades de vendas parceladas, que respondem por 70% das receitas. Atualmente, a CVC possui parceria com o banco Fibria. Na negociação atual, a operadora poderá fechar acordo com outro parceiro até o fi m deste ano.

Ao mesmo tempo que expande as vendas, o Carlyle lidera um intenso corte de custos nas estruturas da CVC. A margem de lucro operacional até 2009, de cerca de 5%, era considerada muito baixa para uma empresa com tamanha participação de mercado. Nos últimos meses, a equipe fi nanceira analisou os custos com lupa. Os contratos enviados aos passageiros, por exemplo, foram reduzidos de 13 páginas para apenas três — uma economia de 1,5 milhão de folhas de papel por ano. Mudanças assim dobraram a margem de lucro. Em junho, o Carlyle contratou um novo vice-presidente de fi nanças — Luiz Fogaça, ex-executivo da empresa de bebidas mexicana Femsa. "Pela primeira vez, os resultados viraram prioridade para a CVC", diz José Ernesto Marino Neto, presidente da BSH International, consultoria especializada em turismo.

As mudanças na CVC seguem a mesma lógica expansionista — e intervencionista — demonstrada pelo Carlyle em outros países. (No setor de turismo, o fundo tem participação em hotéis em Las Vegas e em operadoras de viagem, como a espanhola Orizonia.) Na Orizonia, comprada em 2006, as mudanças incluíram a troca do principal executivo. Na CVC, a manutenção de Patriani à frente dos negócios foi condição para a venda. A expansão na Espanha incluiu a criação de empresas-filhote — a Solplan, especializada em viagens de mergulho e com rede de lojas próprias, e a Racc Travel, que organiza viagens de carro, expedições e competições automobilísticas. O mesmo caminho poderá ser seguido pela CVC. Se der certo, a empresa se tornará um cartão de visita para o segundo maior fundo de private equity do mundo, com 158 bilhões de dólares investidos em 260 companhias ao redor do planeta, e ampliará sua diminuta relevância no Brasil. (Além da CVC, controla a operadora de saúde Qualicorp e a fabricante de produtos têxteis Scalina.) O Carlyle ainda tenta levantar seu primeiro fundo voltado apenas para empresas locais. Por enquanto, o dinheiro vem de fora. “O Brasil é uma prioridade para nós”, diz Borges, do Carlyle. "Não podemos errar."

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