Protestos em Londres: desmatamento e queimadas na Amazônia afetam a reputação da produção agropecuária brasileira no exterior (Sopa Images/Getty Images)
Fabiane Stefano
Publicado em 22 de abril de 2021 às 09h32.
Última atualização em 23 de abril de 2021 às 09h59.
A vista da Amazônia em chamas virou ilustração comum para se referir à política ambiental do Brasil em reportagens dos principais jornais do mundo. No ano passado, foram mais de 11.000 quilômetros quadrados desmatados de floresta (a meta proposta pelo Brasil à Convenção do Clima em 2009 foi de 3.000).
Cerca de 30% da área do Pantanal — vizinho de muitas plantações nos grandes estados produtores do Centro-Oeste — foi afetada pelo ápice do incêndio que durou mais de dois meses no ano passado. Parte da perda é irreversível. Todos esses números não necessariamente têm relação com o agronegócio. Mas os debates passaram a ser indissociáveis. No começo do ano, o presidente francês, Emmanuel Macron, chegou a dizer que “continuar a depender da soja brasileira seria ser conivente com o desmatamento da Amazônia”.
O acordo comercial entre União Europeia e Mercosul, que abriria mercados valiosos para o agro brasileiro, segue emperrado. Em participação no evento online Superagro, da EXAME, o embaixador americano no Brasil, Todd Chapman, disse que a questão ambiental será também uma prioridade do governo Joe Biden.
“O importante é que todos não paguem pelo que é feito por alguns”, disse sobre o agro brasileiro. Estudo do professor Raoni Rajão, da UFMG, publicado na prestigiada revista Science, mostra que só 2% das fazendas são responsáveis por mais de 60% do desmatamento ilegal da soja que é exportada para a União Europeia. Mas não importa. Uma vez que a imagem da agricultura de ponta do Brasil é manchada, todos sofrem, dizem executivos do setor.
A visão negativa sobre o agro brasileiro pode se tornar um problema competitivo dos grandes. “Os negócios seguem sendo feitos, as commodities brasileiras estão baratas. Mas, se nossa vantagem é só o custo baixo, e se o produto atrapalha a reputação dos compradores, eles vão procurar uma alternativa em breve”, diz Rajão.
No ano passado, o governo brasileiro recebeu cartas de um grupo de investidores internacionais que somam mais de 4 trilhões de dólares sob gestão, pressionando acerca da política ambiental. Em reuniões no exterior, tornou-se quase impossível para os empresários brasileiros falar da produção agropecuária sem citar o meio ambiente.
“Uma boa parte não chega perto de áreas florestais; no entanto, toda a produção é contaminada”, diz o ex-diretor da Organização Mundial do Comércio e diretor de assuntos corporativos da empresa de alimentos Pepsico, Roberto Azevêdo. “Não é uma página que se vai virar da noite para o dia.”
O Brasil — incluindo as empresas do agro — terá de se esforçar para mostrar ao mundo que se importa com a preservação ambiental, empregando transparência extrema nas cadeias de produção e fiscalização séria para cumprimento das leis ambientais. Só neste ano, órgãos federais de monitoramento e fiscalização, como o Ibama e o Inpe, chegaram a sofrer cortes de até 46% no orçamento. É o menor patamar em cinco anos, segundo levantamento do projeto Achados e Pedidos, da Transparência Brasil e Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, em parceria com a organização de acesso à informação Fiquem Sabendo.
Números como esses não ajudam a transmitir a mensagem de que o Brasil está levando a sério o combate ao desmatamento. Há, é claro, uma série de interesses comerciais em jogo. Quanto aos concorrentes do agro brasileiro no exterior, sua intenção não é sempre das melhores ao se referirem à nossa política ambiental.
No entanto, o Brasil precisa fazer sua parte. As empresas e os produtores nacionais só têm a perder se o país não cuidar dos problemas que ainda existem — e são muitos. Imagens do Pantanal queimando por meses, certamente, não abrirão mercados.
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