Revista Exame

Os sócios da Vallée estão em guerra por 1 bilhão

Como um cheque com nove zeros deflagrou um conflito societário que põe em risco uma das maiores empresas de medicamentos veterinários do país

Ronan Pereira, presidente da Vallée: para ele, o sócio quer complicar os negócios (Willian Dias/EXAME.com)

Ronan Pereira, presidente da Vallée: para ele, o sócio quer complicar os negócios (Willian Dias/EXAME.com)

DR

Da Redação

Publicado em 31 de maio de 2013 às 15h29.

São Paulo - Os sócios da mineira Vallée, uma das maiores empresas de medicamentos veterinários do país, não podem ser tachados exatamente de precipitados.

Ao longo de três anos, de 2008 a 2010, eles recusaram quatro ofertas de compra feitas pelo fundo de private equity Advent e por farmacêuticas como a americana Pfizer. A cada recusa, os valores oferecidos subiam, passando dos 500 milhões de reais. Mas os donos da Vallée resistiam.

Fundada nos anos 60 por três primos em Uberlândia, a companhia é líder nacional na fabricação de vacinas contra febre aftosa e faturava, dois anos atrás, mais de 200 milhões de reais. O lucro anual chegava a 20 milhões de reais, o suficiente para fazer dos descendentes dos fundadores — das famílias Pereira, Fernandes e Carneiro — alguns dos homens mais ricos de Uberlândia.

Até que, em fevereiro de 2011, a Elanco, subsidiária da farmacêutica Eli Lilly, fez uma oferta matadora: pagaria 1 bilhão de reais pela Vallée. Seria um baita motivo para festa entre os sócios. Mas o que se seguiu foi uma guerra — que ainda não terminou.

Assim como as outras, a oferta da Eli Lilly foi recusada. Mas, no processo, ficou evidente que havia um racha na sociedade. Ficaram em lados opostos Ronan Pereira, presidente da Vallée, e seu sócio Lincoln Fernandes, então presidente da holding que controla a companhia.

Cada um deles tem um terço das ações. E há tempos não conseguiam se entender sobre os rumos do negócio. A negociação com a Eli Lilly azedou as coisas de vez.

Depois de recusar a oferta, Ronan Pereira aliou-se aos Carneiro (também donos de um terço das ações) para expulsar os Fernandes do grupo. Pereira acusou Lincoln Fernandes de tentar vender a companhia sem a concordância dos sócios.


Em minoria, os dois representantes da família Fernandes de fato saíram do dia a dia do grupo (as famílias também controlam um moinho, uma granja e uma incorporadora). Advo­gados de Ronan Pereira e da família Carneiro dizem que o único interesse dos Fernandes continua a ser vender a empresa e criar dificuldades para a atual administração.

Os Fernandes garantem que todos participaram das negociações de venda e que vêm tentando várias soluções para o impasse.

A briga foi parar na Justiça. As acusações mútuas incluem até falsificação de documentos. Segundo os Fernandes, as outras famílias teriam falsificado uma ata de reunião do conselho que aprovou um pedido de crédito de 150 milhões de reais ao Banco do Nordeste.

Os Fernandes eram contra o empréstimo e alegam que sua vontade foi ignorada pelos sócios. Ao receber notificações da ação, o banco atrasou a liberação do empréstimo.

O imbróglio com o banco provocou mais uma ação judicial, desta vez dos Pereira e dos Carneiro contra os Fernandes, acusando-os de tentar prejudicar a Vallée. Em paralelo, tentou-se negociar a saída dos Fernandes da sociedade.

Mas as negociações não foram adiante. Para os Fernandes, a falta de solução é mau negócio. Ao se afastar da operação, deixaram de receber salários e bônus — e o grupo não paga dividendos, já que o resultado consolidado é um prejuízo. Ou seja, até que a paz seja negociada, eles não ganham um tostão.

A disputa societária afastou as multinacionais e os fundos de private equity que tinham tanto interesse em comprar a Vallée. Todos sabem que fazer propostas agora é perda de tempo. Até mesmo a venda de uma fazenda do grupo em Uberlândia para reduzir dívidas foi abortada — o comprador recuou em razão do impasse entre os sócios.

Enquanto isso, não é de espantar que a Vallée esteja sofrendo os efeitos da briga. Cerca de 40% de seu faturamento continua concentrado em vacinas antiaftosa, seu primeiro produto.

Essas vacinas têm margens de lucro mais baixas do que suplementos alimentares para bovinos ou medicamentos para animais de estimação, área em que a empresa está tentando crescer.

Mas a receita da Vallée subiu apenas 8% em 2012, enquanto o mercado de saúde animal avançou 20%. Recentemente, as negociações entre as famílias foram retomadas. Mas, dadas as feridas abertas pelo cheque de 1 bilhão de reais, ninguém aposta numa solução rápida.

Acompanhe tudo sobre:AgronegócioEdição 1040Eli LillyEmpresasEmpresas americanasEmpresas familiaresFusões e AquisiçõesIndústria farmacêuticaSóciosTrigo

Mais de Revista Exame

Borgonha 2024: a safra mais desafiadora e inesquecível da década

Maior mercado do Brasil, São Paulo mostra resiliência com alta renda e vislumbra retomada do centro

Entre luxo e baixa renda, classe média perde espaço no mercado imobiliário

A super onda do imóvel popular: como o MCMV vem impulsionando as construtoras de baixa renda