Eldar Saetre: “Queremos produzir gás no Brasil, mas faltam regras de apoio” (Aline Massuca/Exame)
Da Redação
Publicado em 19 de julho de 2018 às 05h20.
Última atualização em 19 de julho de 2018 às 05h20.
A Statoil, estatal petrolífera norueguesa criada em 1972, aprovou neste ano a mudança de nome: agora, a empresa se chama Equinor e ampliou o foco para o setor de energia como um todo, com atuação também em fontes renováveis. A empresa está se preparando para o mundo pós-petróleo, atendendo às exigências por mais sustentabilidade dos consumidores de diversos países. No entanto, a Equinor não deixará de investir no setor que carregou tanto tempo no nome, o de óleo e gás. E o Brasil é a maior prova disso.
A empresa pretende investir por aqui 15 bilhões de dólares no setor até 2030, contando os projetos que já estão em andamento ou foram há pouco conquistados em leilões promovidos pelo governo brasileiro. Novas apostas, porém, vão depender das regras do mercado, que recentemente mudaram para trazer mais competição ao setor. “Minha principal preocupação é com a estabilidade das regras, porque estamos num setor de investimentos de longo prazo”, diz o norueguês Eldar Saetre, de 62 anos, presidente global da Equinor. “Esse é meu desejo, independentemente do resultado das eleições.” O Brasil ganhou mais status na empresa, com acesso direto da cúpula local ao QG na Noruega. A seguir, a entrevista com Saetre, concedida a EXAME no escritório da Equinor no Rio de Janeiro.
A Equinor participou ativamente dos últimos leilões de petróleo e gás no Brasil. Qual tamanho a empresa pode alcançar no país?
Fora da Noruega, o Brasil é onde vamos investir mais nos próximos anos. Serão 15 bilhões de dólares até 2030. Nunca investimos tanto aqui: 10 bilhões de dólares desde 2001. Nossa produção crescerá dez vezes até 2030, para até 500.000 barris por dia. Mas, se fizermos descobertas maiores, os números serão superiores.
O que motiva o aumento dos investimentos no Brasil?
O Brasil precisa de investimentos para desenvolver o setor de óleo e gás. E as condições do mercado são importantes para que isso ocorra. Algumas delas mudaram nos últimos anos. Por exemplo, o fato de hoje haver a opção de outras empresas operarem em campos da camada chamada de pré-sal, não apenas a Petrobras, como ocorria anteriormente. Vale citar ainda a extensão do Repetro [regime fiscal aduaneiro para facilitar a importação e a exportação de equipamentos] e a maior flexibilidade acerca das exigências de conteúdo local. Tudo isso foi muito importante para trazer mais interesse e mais competição ao setor de óleo e gás no país.
O senhor teme que as eleições mudem o cenário regulatório, dependendo do candidato que vencer?
Seja qual for o resultado das eleições, não vamos mudar nossa estratégia que já está em curso. No entanto, quando olho para o futuro no Brasil, minha principal preocupação é com a estabilidade e a previsibilidade das regras do mercado, porque estamos num setor de investimentos de longo prazo. E somente com estabilidade podemos saber qual retorno esperar dos investimentos realizados. A estabilidade é o fator mais importante para nossa tomada de decisão. Esse é meu desejo para o país, independentemente do resultado das eleições.
O que o Brasil ainda precisa melhorar no tocante à regulamentação?
Muitas coisas boas foram feitas para o mercado nos últimos anos. Mas, ainda no caso da competição, os leilões têm regras e condições muito duras. Para participar, a empresa precisa de uma grande escala ou as descobertas precisam ser muito atraentes. E isso não faz sentido. No futuro, será preciso abrir o mercado para desenvolvedores menores ou descobertas menos ambiciosas.
A Equinor não explora ainda o gás natural no Brasil. Por quê?
Já descobrimos que nossos poços no Brasil têm quantidades significativas de gás. Porém, atualmente, não temos produção. Há um potencial para esse mercado ser desenvolvido, mas é preciso ajustar o sistema regulatório, determinando regras para a infraestrutura do gás que permitam dar mais acesso às empresas. O gás também poderia ser usado mais para outros propósitos — por exemplo, como um -backup para o abastecimento de algumas indústrias, como a de energia. Tudo isso geraria um forte impacto, e o gás ganharia o valor que ele realmente tem. Parte do desenvolvimento nos campos de Carcará e BM-C-33, neste último onde temos a descoberta da área chamada de Pão de Açúcar, está sendo feita para encontrar uma boa solução para o gás e ter produção no futuro. Mas não vamos desenvolvê-la a menos que a regulação dê o apoio necessário para que isso ocorra.
A Petrobras passa por vários reveses, como a greve dos caminhoneiros, que a levou a rever a política de preços. Como o senhor avalia essa situação?
Há muitos anos temos um relacionamento com a Petrobras. Agora, ele está evoluindo: estamos trabalhando em conjunto como sócios no campo de Roncador, no Rio de Janeiro. A Petrobras é uma empresa que respeitamos e, como não estamos atuando no mercado local de combustíveis, acompanhamos de longe esses acontecimentos. O importante é que a Petrobras está muito consciente de sua situação financeira e está determinada a resolver essa questão. Não vejo nenhuma mudança nesse compromisso.
O senhor esteve com o presidente da Petrobras, Ivan Monteiro. As duas empresas vão expandir os negócios que têm em conjunto?
Conversamos sobre o status de nossos projetos, como a parceria estratégica no campo de Roncador. No Brasil, veremos uma série de campos declinar em pro-dução pelo grau de maturidade que al-cançam, e recuperar parte disso é uma competência nossa. No campo de Roncador, com nossa experiência em recuperação avançada de reservatório, seremos capazes de aumentar as reservas de 1 bilhão para 1,5 bilhão de barris. Esses 500 milhões a mais significam a descoberta de um novo campo grande, como o Peregrino, onde operamos.
Onde estão as oportunidades no negócio de óleo e gás no Brasil: nos campos maduros ou nos novos leilões?
É possível crescer em todas as partes da cadeia de valor, já que temos projetos em várias fases. Em desenvolvimento, temos os campos de Carcará e BM-C-33. Estamos construindo a fase dois do campo de Peregrino, com uma terceira plataforma de exploração que será adicionada em 2020. Em produção, estamos ainda no Roncador, operado pela Petrobras. Nos últimos leilões, adquirimos três blocos com alto potencial [Carcará Norte, Uirapuru e Dois Irmãos], todos eles na área do pré-sal, mas o primeiro operado por nós; os outros dois pela Petrobras. Basica-mente, não precisamos participar de novos leilões, embora sempre avaliemos novas opções que estejam à mesa.
Temos visto uma disputa no comércio mundial, que pode trazer mais volatilidade ao preço das commodities. O que esperar no caso do petróleo?
A demanda continua crescendo, mas ainda há volatilidade, que decorre da situação geopolítica. Com base nisso, esperamos ver um aumento no preço do petróleo a 68 dólares o barril em 2020 e a 80 dólares em 2030. Só que pensar no preço do petróleo deve importar menos para que possamos tomar as decisões de investimento. Nosso portfólio da próxima geração, com entrega em 2022, tem um preço de equilíbrio (que não traz lucro nem prejuízo) de 21 dólares por barril, um valor que há alguns anos era de 70 dólares. Temos de ter resiliência e reduzir custos.
A Equinor mudou de nome e se tornou uma empresa do setor de energia, não apenas de petróleo. É uma resposta a um mundo mais sustentável?
A estratégia é continuarmos no setor de óleo e gás de forma sustentável. Alguém tem de fazer esse trabalho, então que faça de uma boa maneira. Isso faz uma diferença gigantesca, porque é um tipo de exploração que tem larga escala e muito impacto. Mas agora também temos de ter uma perspectiva de longo prazo, que permita olhar além do mercado de óleo e gás. É nessa estratégia que entra o investimento em energias renováveis, que já estamos fazendo no Brasil e no mundo.