Revista Exame

Denise Johnson não aguentou a pressão na GM

Após oito meses no cargo, Denise Johnson deixa o comando da GM no Brasil alegando motivos pessoais — mas uma série de desentendimentos pode ter apressado sua decisão

A americana Denise Johnson, ex-presidente da GM: o embate de opiniões com outros executivos teria provocado seu desgaste (Divulgação/GM)

A americana Denise Johnson, ex-presidente da GM: o embate de opiniões com outros executivos teria provocado seu desgaste (Divulgação/GM)

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Da Redação

Publicado em 31 de março de 2011 às 10h23.

Achegada da engenheira americana Denise Johnson ao comando da subsidiária brasileira da General Motors, em junho do ano passado, pegou funcionários, concessionárias e concorrentes de surpresa. Primeiro, por se tratar da indicação de uma mulher para atuar à frente de uma montadora, algo até então inédito no mercado brasileiro.

Em segundo lugar, por Denise ser praticamente uma desconhecida fora dos limites de Detroit, a sede mundial da GM. Na época com 43 anos de idade, Denise chegava ao Brasil depois de passar por diversos cargos no chão de fábrica e de alcançar o cargo de vice-presidente de relações trabalhistas.

Sua missão era dar fôlego novo a uma operação vital para a recuperação e o crescimento da corporação. Com um faturamento de quase 17 bilhões de reais em 2010, equivalente a 8% do resultado global, a subsidiária brasileira é a terceira mais importante do grupo, atrás somente de China e Estados Unidos.

No dia 22 de fevereiro, porém, Denise surpreendeu mais uma vez. A operação brasileira emitiu um lacônico comunicado avisando que a executiva havia se desligado da GM após 21 anos de casa e pouco mais de oito meses de Brasil alegando problemas pessoais. “A pressão por resultados certamente pesou na decisão dela, mas não foi só isso”, diz o dono de uma das maiores redes de concessionárias da marca que pediu para não ter seu nome revelado. “Afinal, as vendas da GM já estiveram piores, e nem por isso um presidente caiu.”

Segundo executivos próximos à montadora, a passagem de Denise foi tão efêmera quanto turbulenta. Há cerca de três meses, envolveu-se numa sequência de atritos com pelo menos dois dos principais nomes da monta­dora na região: o colombiano Jaime Ardila, seu antecessor no cargo, promovido à presidência da até então inexistente unidade América do Sul, e Pedro Manuchakian, diretor de engenharia e funcionário de carreira da General Motors.


Tão logo assumiu o novo cargo, Ardila passou a ocupar uma sala contígua à de Denise no segundo andar da sede da empresa, em São Caetano do Sul, no ABC paulista.

Sua ligação direta com Detroit e a familiaridade com a operação brasileira — Ardila presidiu a GM no Brasil entre 2007 e 2010 — teriam feito com que alguns executivos passassem a procurá-lo diretamente para discutir projetos e lançamentos, deixando Denise em segundo plano. (Em dezembro, Ardila mudou-se para um escritório no bairro de Indianópolis, na zona sul da capital paulista, de onde vem despachando também como presidente interino da operação brasileira.) Procurados, os executivos da GM não deram entrevista.

Se com Ardila os problemas estavam na esfera da autoridade, com Manuchakian o desgaste de Denise teria se dado em torno de detalhes de engenharia e da qualidade dos veículos produzidos pela GM. Para voltar a ganhar espaço no Brasil, a montadora havia estabelecido, ainda durante a gestão Ardila, um plano de crescimento com base no lançamento de diversos modelos, que consumiriam boa parte dos anunciados 5 bilhões de reais em investimentos.

Daqui até 2012, nove carros novos devem sair do papel — três só neste ano. Insatisfeita com o nível dos automóveis produ­zidos no Brasil — Denise construiu parte de sua carreira auferindo o desempenho dos automóveis produzidos em território americano —, ela teria pedido alterações em diversos pro­jetos, o que poderia resultar em atrasos na produção. Os maiores impactos seriam sobre o projeto Ônix, uma nova plataforma para suceder o Celta e o Prisma, e sobre o sedã GSV, que fi­cará no lugar do Corsa.

O episódio seria mera discordância entre chefe e subordinado — não fosse essa uma questão crucial para o futuro da empresa. “A GM tem pressa para colocar esses produtos no mercado”, afirma David Wong, da consultoria Kaiser Associates, especializada no setor automotivo. “Sem produtos novos, as concessionárias não conseguem fazer com que as vendas decolem.”


Política de descontos

Ao analisar o recente desempenho das vendas da GM no Brasil, fica fácil entender por que o tempo corria contra Denise. Em janeiro, sua participação de mercado foi de 17,7%, a menor da última década e quase 5 pontos percentuais abaixo do registrado no mesmo mês do ano passado.

Ao longo de 2010, um ano em que a indústria automobilística nacional bateu recorde com a venda de 3,2 milhões de veículos, a GM conseguiu crescer 10% graças, em larga medida, a uma política de descontos em sua extensa linha de veículos. (Nesse mesmo período, Fiat e Volks cresceram magros 3% e 2%, respectivamente.)

A redução no preço de tabela, em alguns casos, chegou a 5%. A ordem, no entanto, é que tal estratégia não seja repetida em 2011, sob o risco de prejudicar as margens de lucro da montadora. Um ano e meio depois de entrar em concordata, a matriz americana finalmente apresentou bons resultados no final do ano passado.

A GM encerrou 2010 com uma receita de 136 bilhões de dólares e um lucro de 4,7 bilhões, o primeiro em sete anos. Aliviada lá fora, a montadora precisa agora acelerar o crescimento também por aqui. Mas essa já não é uma tarefa para Denise Johnson.

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