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...e Noronha criou as “tchecas”

A cerveja Proibida ainda não existe. Mas ficou conhecida em todo o país quando o empresário João Carlos Noronha decidiu juntar beldades estrangeiras, humoristas incautos e o poder da internet

Michaela e Alicia, as “tchecas”: a farsa durou quase seis meses (Divulgação)

Michaela e Alicia, as “tchecas”: a farsa durou quase seis meses (Divulgação)

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Da Redação

Publicado em 4 de junho de 2011 às 08h00.

Michaela e Dominika, as JOVENS voluptuosas aí ao lado, nasceram na República Tcheca e sonhavam em conhecer o Brasil. Queriam tanto vir para os trópicos que gravaram um vídeo ambientado num dos quartos da casa delas, em Praga.

Sem nenhum recurso técnico e com pouco mais de 1 minuto de duração, o vídeo de Michaela e Dominika foi postado na internet em dezembro do ano passado em um site chamado welovebrazil. Nos meses seguintes, as moças desinibidas colocaram no ar mais 26 vídeos — em um deles, experimentavam os biquínis que usariam quando finalmente chegassem às praias brasileiras.

Michaela e Dominika, porém, não existiam — pelo menos não como se imaginava que existissem. Michaela Matejkova é uma personal trainer eslovaca. Dominika, ou Alicia Seffras, é uma modelo britânica.

O quarto, em Praga, não passava de um estúdio montado em Londres, e todo o enredo, concebido para parecer real, se prestava a criar barulho em torno do lançamento de um novo produto.

O empresário carioca João Carlos Noronha é dono e fundador da recém-criada Companhia Brasileira de Bebidas Premium (CBBP), criador da marca de cerveja Proibida e pai das “tchecas”, como as garotas ficaram nacionalmente conhecidas. “Não esperávamos fazer tanto barulho com o lançamento”, diz Noronha. “Ainda tenho uma cervejaria para colocar de pé.”

Desenvolvida pela agência We Comunicação e pelo publicitário Jader Rossetto, a estratégia de guerrilha das tchecas ganhou dimensão nacional ao ser encampada — aparentemente por ingenuidade — pelos humoristas do Pânico na TV, programa exibido pela RedeTV!

Apresentados aos vídeos, seus debochados apresentadores encantaram-se com a história e com os atributos das moças. Em fevereiro, criaram um reality show para mostrar as experiências das tchecas no Brasil.

Durante dez domingos seguidos, eles as exibiram no Carnaval na Sapucaí, em baladas paulistanas e em passeios de bugue em Fortaleza. A audiência adorou. As tchecas bombaram nas redes sociais. Tudo seria perfeito se a coisa toda não fosse uma farsa. E se essa farsa não estivesse a serviço da promoção de uma futura concorrente do único anunciante do Pânico, a cerveja Skol, da Ambev.


Tão logo a estratégia foi revelada, o reality show foi tirado do ar. No último episódio, no dia 15 de maio, uma audiência de 11 pontos esperava a revelação da identidade das tchecas. O quadro, porém, foi suspenso emergencialmente.

“Todo esse burburinho deu à Proibida uma visibilidade que ela jamais teria alcançado tendo por trás uma empresa do tamanho da CBBP”, afirma Abaetê de Azevedo, diretor-presidente da Rapp Latin America, agência especializada em propaganda digital.

Com a ajuda da exposição no Pânico, a Proibida ganhou 130 000 seguidores no Twitter, 40 000 a mais do que a Devassa e seis vezes o conquistado pela Brahma. Tudo isso com um investimento de 400 000 reais — para efeito de comparação, estima-se que a Schincariol tenha investido 100 milhões de reais no lançamento da Devassa, um projeto que teve Paris Hilton como garota-propaganda.

Aos 42 anos, Noronha tem tanta familiaridade com o negócio de cervejas quanto as tais tchecas com a língua portuguesa. Nascido no Rio de Janeiro, criado em São Paulo e há 20 anos morando em Recife, Noronha é um dos herdeiros do grupo pernambucano João Santos, dono da Cimentos Nassau, segunda maior de seu setor, com faturamento estimado em 2 bilhões de reais.

A morte de João Pereira dos Santos, patriarca e fundador do grupo, em abril de 2009, mergulhou os seis ramos da família num conturbado processo de sucessão — e Noronha, então cotado para assumir a liderança dos negócios, perdeu o posto para um de seus tios.

Em março do ano passado, após 18 anos ocupando diversos postos no grupo, ele deixou a operação, permanecendo como acionista. “Pensei em entrar no negócio de cartões e financeiras, mas desisti. O mercado de cervejas, além de crescer num ritmo mais acelerado, oferece melhores oportunidades para novas marcas”, diz. 

Para colocar a CBBP em pé, Noronha investiu 80 milhões de reais na construção de uma fábrica em Pindoretama, no interior do Ceará — parte disso com financiamento do BNDES e do Banco do Nordeste. Contratou 180 profissionais, entre executivos e vendedores, metade deles recrutada nas principais concorrentes, como Schincariol, Ambev e Coca-Cola.

A distribuição, um dos pontos nevrálgicos do negócio de cervejas, contará com a experiência de seu sócio, o empresário Dante Peló, cuja família até 1997 era dona da maior distribuidora da marca Brahma no Nordeste. A fabricação da Proibida deve começar em julho — e as vendas serão iniciadas na Região Nordeste.


“Dois terços do mercado nacional de cervejas estão nas mãos da Ambev”, diz Adalberto Viviani, diretor da consultoria Conceptnet, especializada em bebidas. “Para ganhar participação, a Proibida terá de criar estratégias bem pouco convencionais, além de forjar novas alianças com o varejo.”

Incógnita

Atrair a atenção do consumidor é um importante passo para qualquer empresa de bens de consumo. Mas é só o começo. O sucesso no mercado depende de uma série de fatores — tudo começa com o produto, depois passa pela capacidade de distribuição e por uma estratégia consistente de construção da reputação da marca.

A Schincariol causou frisson ao escolher Paris Hilton para lançar a Devassa em pleno Carnaval ca­rio­ca. Passada a novidade, a participação de mercado da cervejaria caiu de 12% para 11,2% entre o lançamento da De­vassa e março deste ano, segundo da­dos da consultoria Nielsen.

A Proibida nem sequer existe. O produto é uma in­cóg­nita. É impossível saber por quanto tempo o barulho em torno das tchecas e da marca perdurará.

Para tentar evitar que a marca caia no esquecimento antes da estreia, Noronha separou duas dezenas de outros vídeos para circular como virais na internet — um deles mostra um “jogo tcheco”, no qual um punhado de mulheres em trajes minúsculos tenta empurrar um “pobre” homem ao gol.

“Para o lançamento oficial da cerveja traremos de volta a dupla Dominika e Michaela”, diz Noronha. Sabe-se lá o que as “tchecas” farão dessa vez.

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