Revista Exame

Brasília volta a assombrar com dinheiro

Tragado por suspeitas de tráfico de influência, o ministro da Casa Civil deflagra a primeira crise do governo Dilma — e traz de volta à cena econômica o risco político

Palocci, o ex-homem forte: de fiador da estabilidade a pivô da crise (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

Palocci, o ex-homem forte: de fiador da estabilidade a pivô da crise (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

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Da Redação

Publicado em 7 de julho de 2011 às 15h10.

Brasília - Na noite em que dilma rousseff se elegeu presidente, o país assistiu a uma cena de forte simbolismo político. Ao deixar sua casa imediatamente após a confirmação da vitória, ela escolheu um único assessor para acompanhá-la: Antonio Palocci, futuro ministro da Casa Civil.

Foi Palocci quem a convenceu a dar uma curta declaração de dentro do carro, cercado pela imprensa: “Agradeço aos brasileiros e brasileiras e prometo honrar a confiança que depositaram em mim”, disse ela. Naquele instante, a mão protetora de Palocci pousava sobre o ombro da nova presidente.

Segundo o cálculo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o mentor da candidatura, depois da vitória Dilma cuidaria do lado administrativo do governo, enquanto Palocci seria o articulador político, fazendo a ponte entre o Planalto e o Congresso.

Na condição de ex-ministro da Fazenda e de petista respeitado pelo setor privado, ele seria também o fiador da chamada “racionalidade econômica”, garantindo a continuidade da política que Lula herdara de Fernando Henrique Cardoso. E tudo caminhava conforme os planos do comandante supremo petista.

Bastaram três semanas de noticiário sobre o súbito enriquecimento de Palocci — que, nos últimos quatro anos, acumulou as funções potencialmente conflitantes de deputado e consultor econômico — para que o governo enfrentasse sua primeira grande crise.

Nos primeiros meses do ano, tudo indicava que os maiores riscos vinham do front econômico, ameaçado pelo aumento da inflação e pela instabilidade global.

Já na seara política, Dilma forjava a percepção de que, graças a seu perfil tecnocrático, a uma vasta coalizão partidária e ao fator Palocci, seu governo poderia superar em eficiência o do antecessor.

Nos últimos dias, porém, o que se viu foi a volta de certa tranquilidade na economia, com os primeiros sinais de arrefecimento da alta inflacionária.


E um nervosismo crescente no mundo da política. No dia 6 de junho, data de fechamento desta edição, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, decidiu não investigar Palocci.

Ainda assim continuavam as especulações sobre uma possível queda do ex-superministro, assim como as apostas sobre substitutos. Os candidatos mais citados ao cargo de Palocci eram os ministros Gilberto Carvalho e Paulo Bernardo — de perfil político —, a ministra Miriam Belchior e a diretora da Petrobras Maria das Graças Foster — ambas de perfil técnico e encaixadas na chamada categoria “Dilma da Dilma”.

Como entender o risco político embutido na crise em curso? Diz o economista e ex-ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros: “Apesar de não ser mais um articulador econômico, Palocci tem sido uma referência importante para o mercado. Sua queda enviaria um sinal negativo, reforçando o papel ideológico do PT no governo Dilma”.

Diversamente de períodos anteriores de turbulência, como no início do governo Lula, em 2003, durante o mensalão, em 2005, e novamente em 2006, quando o próprio Palocci deixou o governo em meio ao escândalo da quebra de sigilo bancário do caseiro Francenildo, desta vez o perigo não significa um retrocesso político imediato.

“Pode haver alguma marola, mas a crise Palocci não representa grandes riscos para a bolsa de valores ou o câmbio”, diz Roberto Padovani, economista-chefe do banco WestLB. “Mas o caso desnuda a fragilidade do governo justamente no momento em que sua agenda política prometia decolar.”

Ou seja, hoje o risco político se traduz em mais quatro anos de inércia, sem avanços reformistas imprescindíveis ao crescimento sustentável do país, e não necessariamente em uma guinada esquerdista súbita que pudesse abalar a economia.

Inércia no Congresso

Durante a campanha, Dilma prometeu o empenho de seu governo numa agenda pontual para combater a guerra fiscal e melhorar a gestão pública. São medidas que permitiriam a queda paulatina dos juros e, por extensão, do custo Brasil. Até agora, nada disso chegou ao Parlamento.


Um estudo da consultoria Patri comparando os cinco primeiros meses dos primeiros mandatos de FHC, Lula e Dilma revela uma queda expressiva, de 74%, no envio de matérias ao Congresso. Enquanto FHC enviou 73 projetos de lei e medidas provisórias, Lula enviou outras 48 matérias.

Já Dilma enviou 19 — com uma importante ressalva: a grande maioria diz respeito a temas pendentes do governo Lula. “A paralisia do governo Dilma em relação ao Congresso tem a ver com a disputa de espaço do PT com o PMDB”, diz o cientista político David Fleischer, da Universidade de Brasília.

“Era Palocci quem, em nome de Dilma, administrava com mão de ferro as nomeações do segundo escalão, que, por sua vez, iriam influenciar as votações no Congresso.” Sintomaticamente, após a divulgação do enriquecimento de Palocci, foi justamente o PMDB, partido do vice-presidente, Michel Temer, que infligiu ao go­verno uma dura derrota na votação do Código Florestal.

Para complicar mais a vida de Dilma, em meio à crise, Lula ressurgiu em Brasília dando conselhos e passando a mensagem subliminar de que ainda estaria no comando.

A presidente, não custa lembrar, é Dilma Rousseff. Foi ela que recebeu 56 milhões de votos nas últimas eleições. É ela que tem a missão de liderar o país, esteja quem estiver em sua equipe, numa agenda reformista capaz de dar continuidade às boas novas na economia.

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