Bagnoli (à dir.) com analistas da Constellation: eles voltaram a estudar só para avaliar a faculdade em que investem (Alexandre Battibugli/EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 8 de novembro de 2012 às 11h08.
São Paulo - Depois de se formar em engenharia de produção pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo e fazer mestrado com foco em finanças em Milão, o paulista Alexandre Bagnoli, de 29 anos, voltou a frequentar as salas de aula de uma maneira que não esperava.
Analista da gestora de fundos de ações Constellation, ele se tornou aluno do curso de graduação em administração de empresas da Uniasselvi, uma faculdade de ensino a distância. Nas noites de segunda-feira, Bagnoli sai do escritório na Vila Olímpia, na zona oeste de São Paulo, numa viagem de 70 quilômetros até o município de Mairinque, onde assiste à aula presencial que ocorre uma vez por semana.
O conteúdo pode até complementar sua formação, mas o que Bagnoli faz lá é acompanhar de perto a operação da universidade adquirida recentemente pela Kroton, rede de faculdades na qual a Constellation possui 240 milhões de reais investidos, o que corresponde a 5,4% do capital da empresa.
“O objetivo é saber se o que a empresa faz bate com o que diz nos relatórios a investidores”, diz Bagnoli. Para testar o sistema de cobrança da escola, o analista acaba de dar calote na mensalidade — quer saber quanto tempo levará para ser cobrado.
Mais dois analistas da Constellation também se matricularam em outras faculdades para comparar a Kroton com a concorrência. Outro analista da Constellation tornou-se revendedor de cosméticos da Natura para conhecer como funciona a operação.
Pouquíssimos analistas fazem algo parecido, mas o número vem crescendo entre as gestoras que têm como estratégia concentrar os investimentos em poucas empresas. Esses gestores mantêm as ações em carteira por anos para ganhar com o crescimento de seus negócios, e não apenas com os altos e baixos da bolsa.
No jargão do mercado, são chamados de fundamentalistas porque analisam as empresas no detalhe. É o caso das gestoras Fama, Orbe e Rio Bravo, além da Constellation. Três analistas da Fama, por exemplo, passaram três meses visitando mercadinhos nas periferias de Fortaleza e Salvador, cidades que concentram boa parte das vendas da fabricante de alimentos M. Dias Branco.
Descobriram que os donos dessas lojas compravam mais dessa empresa do que das multinacionais Kraft e Nestlé porque a M. Dias Branco vende lotes menores e mais vezes durante o mês, o que facilita o pagamento desse pequeno comércio.
Os fundos da Fama, precursora desse tipo de estratégia, aplicaram nos papéis da companhia em 2006 e ganharam 220% com o investimento até agora. Atualmente, pelo menos um analista vai ao Nordeste a cada três meses para acompanhar as vendas da empresa.
Apesar da trabalheira, é claro que o jeito mão na massa não é infalível. A Constellation viu suas ações da fabricante de painéis de madeira e metais sanitários Duratex desvalorizar 25% no ano passado, quando os preços dos painéis caíram em razão do aumento da concorrência.
O desempenho dos fundos com esse perfil é desigual. Enquanto o principal fundo da Fama rendeu 43% em 12 meses e 42% em três anos, o da Orbe valorizou apenas 7% e 18% nos mesmos intervalos. Os fundos da Constellation ganharam 50% desde 2009, retorno acima da média dos fundos de ações do mercado.
Nos Estados Unidos, o cenário é parecido. Os fundos das gestoras Lone Pine e Maverick, conhecidas pela estratégia mão na massa, destacaram-se neste ano com um ganho de cerca de 20%, acima da média do mercado, mas não bateram a concorrência nos três anos anteriores.
O investidor tem uma certeza quando aplica em fundos desse tipo: a de que o analista realmente conhece os negócios da empresa — em alguns casos, quase tão bem quanto seus executivos. Mas a rentabilidade depende, como sempre, do uso que o analista faz dessas informações — por melhores que elas sejam.