PAULO RABELLO, DO BNDES: ele acusa a “má governança recorrente da empresa” (Pilar Olivares/Reuters)
Da Redação
Publicado em 20 de outubro de 2017 às 05h55.
Última atualização em 2 de fevereiro de 2018 às 17h47.
À frente do BNDES há quatro meses, o economista Paulo Rabello de Castro defende os empréstimos feitos pelo banco na última década, mas diz que a instituição vai mudar. Em vez de despejar dezenas de bilhões de reais de recursos próprios em grandes projetos, vai funcionar como um banco de investimento, captar dinheiro no mercado e criar “modelos inovadores” para financiar quem precisa.
Como foram seus primeiros meses à frente do BNDES?
Acho que mudei o ânimo das coisas. O BNDES estava desligado da tomada, acossado, sendo alvo de todos os tipos de acusação. A polícia buscou aqui quase 40 colegas [37 funcionários foram levados a depor coercitivamente]. Como um liberal verdadeiro, antes de tudo antidogmático, fui buscar nas estatísticas a comprovação das coisas. Daí surgiu o Livro Verde, que explica como foram feitas as principais operações do banco nos últimos anos. O que está lá é surpresa positiva. Até o investimento no frigorífero JBS foi bom. Para quem é da casa, dá orgulho. Por outro lado, aos 65 anos, o banco está buscando novos caminhos. Está se perguntando: “Sou um velho caquético que merece, se não a morte, a aposentadoria? Ou sou um idoso enxuto, pronto para me reciclar e fazer da minha vida uma coisa útil para os outros?” Por isso estamos fazendo nosso planejamento estratégico, que ficará pronto em oito meses.
Como será o BNDES do futuro?
O banco vai deixar o quase vício de depender das verbas da União, tanto de tributos quanto de empréstimos. Vai buscar recursos financeiros na abundância de que o mundo dispõe.
Será um BNDES menor?
De forma alguma. Será do tamanho que o mercado necessitar. O que vai ditar o tamanho do BNDES é nosso talento em oferecer soluções financeiras inovadoras, operando, por exemplo, com moedas diferentes.
O BNDES vai ficar mais parecido com um banco de investimento e deixará de pôr tanto dinheiro próprio em projetos?
Bingo! E, diga-se de passagem, o banco sempre fez isso. A diferença é que esse formato vai se tornar quase a maneira de ser do BNDES. Estamos fazendo uma mudança dramática, que vai exigir um treinamento de nosso corpo técnico. Nós já estamos buscando essas fontes alternativas.
Como está sendo feito o novo plano estratégico?
Contratamos uma consultoria [a Roland Berger] que fez a reestruturação do banco de desenvolvimento alemão, o KfW. Ela tinha tanto interesse em participar que colocou quase todo o seu talento à nossa disposição por um valor quase módico, pouco mais de 7 milhões de reais, o que não é nem a entrada para um trabalho dessa natureza. Será um trabalho de oito meses.
Por que o senhor foi contrário à criação da taxa TLP?
Não fui contra nada. A TLP [nova taxa de juro proposta pelo Ministério da Fazenda] é uma nova fórmula que tenta reproduzir a TJLP [a taxa atual- do BNDES] com alguns avanços. O principal avanço é que o Conselho de Política Monetária não precisa mais se reunir para dizer qual é a taxa — ela já faz parte do mercado de título público. Eu só chamei a atenção para o fato de que a TLP oscilará mais do que a TJLP — esta, por ter certo grau de arbítrio, não prejudica planos de longo prazo.
A TLP não vai ajudar a reduzir os subsídios nos empréstimos?
Na verdade, a existência desses subsídios, na proporção que foi falada por aí, jamais foi comprovada. O banco capta recurso em TJLP, mas não devolve só TJLP à União. Devolve uma TJLP gordinha, considerando os tributos recolhidos pelo banco e os dividendos pagos à União. Quem argumenta que existe subsídio implícito esquece quanto a TJLP rende ao próprio governo. O problema que causou a celeuma dos subsídios implícitos foi o prolongamento do Programa de Sustentação do Investimento durante a maior recessão da história, combinada com alta inflação, de 2014 a 2016. Nesse contexto, as taxas de juro estabelecidas para o PSI se descolaram da Selic, que subiu para que o governo, altamente endividado, pudesse se financiar.
Mas o senhor não considera que o BNDES dá crédito subsidiado?
Não necessariamente. Na minha visão, o chamado subsídio do BNDES não passa de uma compensação dada ao setor produtivo, em razão de uma grave distorção que existe no Brasil: as taxas de juro mais altas do mundo. Essa distorção grave é criada pelo próprio governo, que aceita pagar taxas de juro altíssimas, das quais são formadas todas as outras taxas. E por que o governo aceita pagar? Porque gasta mais do que pode; porque aumenta o endividamento; porque tem de aumentar o prêmio para conseguir se financiar. As pessoas esquecem que o setor produtivo não consegue produzir com as taxas de juro brasileiras. Se não tiver essa compensação, não tem setor produtivo. Então, o que uns chamam de subsídio, eu chamo de compensação. E essa não é a melhor forma de organizar a economia.
Por que o senhor saiu do Partido Novo e se filiou ao PSC?
O Partido Novo é uma ótima proposta. Entrei em meados de 2016, fui ao João Amoedo [presidente da sigla] e disse que minha intenção era ter a chance de uma eventual atuação -político-eleitoral. Ele não me acenou com nada específico. O tempo passou, e o Novo me ignorou. Enquanto isso, várias agremiações me fizeram convites efetivos. Por isso, decidi me liberar do Novo. Curioso que, na saída, eles me ignoraram igualmente. Foi como acontece com a moça que sonha com o carinha mais rico e bonito do bairro, mas ele nunca dá a mínima. Não namoro mais rapaz escovadinho da zona sul. O primeiro partido a que me filiei foi o PV, em 2002, no qual permaneci até 2010. O cuidado com o meio ambiente é essencial.
O senhor tem pretensão de ser presidente da República?
Já disse isso e repito: Presidência é destino. Ponto. Fernando Henrique Cardoso não conseguiu a prefeitura de São Paulo e, no entanto, fez o Plano Real. E virou o candidato da moeda estável, que o elegeu duas vezes.
Mas sua atuação política seria no Legislativo ou no Executivo?
Sempre imaginei situações ideais, que não existem na prática. O caminho, hoje sei, se faz caminhando.
O senhor não tem medo de se queimar num governo em tantas denúncias de corrupção?
Justamente por ter mais experiência, não estou nem aí para o que acham de mim. O Brasil está precisando de gente que queira e que saiba transformá-lo numa coisa melhor. O governo Temer é um governo de transição, e está fazendo muito bem seu papel.
Por que o senhor decidiu entrar na política só agora?
Sou simpatizante do antigo PFL desde os anos 80, e acho o Jorge Bornhausen um grande líder. Mas nunca assinei a ficha por não considerar na época ser oportuno. Estava errado, pois meu rigor conceitual era exagerado. Hoje entendo que partido é apenas um veículo para a atuação política. Não dá para esperar que um partido político qualquer, mais ainda no Brasil, seja de fato tudo o que defende no nome. Há um componente financeiro também para essa decisão tardia. Tinha de ganhar a vida. Hoje estou mais tranquilo. Também tenho de trabalhar mais uns dez anos para restituir o Estado brasileiro, que me deu a oportunidade de fazer duas universidades gratuitas.