Revista Exame

A Ben & Jerry’s da tecnologia seduz a geração Y

Seguidora da ideia de um capitalismo mais consciente, a empresa americana de TI ThoughtWorks parece a meca da geração Y

Guo Xiao, da ThoughtWorks: “Não temos preconceito contra candidatos a vagas que sejam homens brancos” (Marcelo Curia/Exame)

Guo Xiao, da ThoughtWorks: “Não temos preconceito contra candidatos a vagas que sejam homens brancos” (Marcelo Curia/Exame)

DR

Da Redação

Publicado em 12 de setembro de 2016 às 16h16.

Última atualização em 14 de junho de 2018 às 17h49.

São Paulo — Se na companhia em que você trabalha ainda é comum ouvir algum “sem noção” dizer “isso é coisa de veadinho”, atenção se um dia contratar a empresa de TI americana ThoughtWorks, que desenvolve softwares. Recentemente, membros da equipe da ThoughtWorks destacados para trabalhar numa grande empresa em São Paulo ouviram algo nessa linha, sentiram-se incomodados e decidiram dar um toque no cliente.

O episódio revela alguns traços dessa multinacional de porte médio, com faturamento de 400 milhões de dólares, com sede em Chicago, presente em 12 países e há seis anos no Brasil. Trata-se de uma empresa que busca o lucro, é óbvio, mas que tem uma força de trabalho que se diz disposta a mudar o mundo. “Uma de nossas missões é ajudar a humanidade”, diz o chinês Guo Xiao, presidente global.

Inspirada nas ideias de um capitalismo mais humano desenvolvidas por Ben Cohen e Jerry Greenfield, fundadores da marca de sorvetes americana Ben & Jerry’s, a ThoughtWorks incentiva seus funcionários a participar de programas com impacto social durante parte do horário de trabalho.

Eles já criaram um sistema para gerenciar prontuários de hospitais na Índia, fizeram um aplicativo, em parceria com a Unicef, para achar crianças perdidas em Uganda e no Sudão e desenvolveram um software para melhorar o atendimento de urgência às vítimas de ebola em Serra Leoa. A pegada internacional não se resume a projetos sociais.

Todos os recém-graduados admitidos em suas unidades pelo mundo são enviados para um treinamento de seis semanas na Índia. Cerca de 15% dos 3 600 funcionários da empresa trabalham num país diferente daquele em que foram contratados.

Enquanto empresas de diferentes setores reclamam dos desafios impostos pelos millennials — trabalhadores nascidos depois de 1980 com outras preocupações além de apenas ganhar dinheiro —, a ThoughtWorks parece estar em sintonia com os anseios dessa geração.

A empresa tem uma política ativa de diversidade na contratação: busca profissionais que não sejam todos homens brancos, perfil predominante no setor de tecnologia da informação na maioria dos mercados em que atua. No Brasil, as mulheres são somente 16% dos graduados em cursos de computação, mas na Thought­Works elas representam 35% da força de trabalho.

Fazem parte da linha de frente. Caroline Cintra e Gabriela Guerra, as duas executivas responsáveis pela operação brasileira, dão palestras periódicas em universidades para mostrar às sempre poucas moças presentes que elas podem ir longe. Em linha com o que acontece nas demais filiais da empresa, no Brasil a diversidade também inclui minorias.

De cada dez funcionários, dois são negros. Os autodeclarados gays representam 15% e os transexuais são 2%. Os programas sociais e a estratégia de recrutamento da empresa parecem ter saído de um livro-texto sobre o que é ser politicamente correto. E podem gerar dúvidas. Para quem sonha em ser admitido, fica a pergunta se existe preconceito contra homens brancos.

Para os potenciais clientes, a questão é se o preço de toda essa política de diversidade acaba sendo uma força de trabalho menos capaz tecnicamente. Guo Xiao, presidente global, defende-se explicando como funciona a seleção de pessoal. Depois de receber currículos de interessados, os recrutadores buscam no mercado possíveis candidatos de grupos minoritários.

Em seguida, montam um time eclético entre os próprios funcionários para participar do processo de entrevistas — com homens, mulheres, brancos, negros, heterossexuais, gays e pessoas de religiões diferentes.

“Procuramos aumentar o pool de talentos e selecionar sem viés, mas nosso objetivo é sempre contratar os que nos parecem ser os melhores. Isso não é ser preconceituoso nem negligente com a qualidade”, diz Guo Xiao. Basea­do num levantamento com 170.000 candidatos a vagas no mercado americano, o site de empregos glassdoor.com fez um ranking dos processos de recrutamento mais difíceis dos Estados Unidos.

O primeiro lugar ficou com a consultoria McKinsey. A ThoughtWorks apareceu na segunda colocação.

E os clientes?

A diversidade nas empresas é um dos temas mais estudados nas universidades de ponta dos Estados Unidos.

“Ainda há muito o que investigar, mas várias pesquisas indicam que grupos de pessoas parecidas — sejam eles compostos só de homens brancos ou só de mulheres negras — tendem a pensar de forma mais homogênea do que grupos com tipos variados”, diz Neal Hartman, professor de liderança na Sloan School, es­cola de negócios do Massachusetts Institute of Technology (MIT).

Por outro lado, há críticas crescentes na socie­dade americana sobre a tentativa de for­çar a equidade na marra — as políticas de ação afirmativa, por exemplo, são hoje vistas com muitas ressalvas. Na companhia aérea Latam, a maior cliente da ThoughtWorks na América Latina, a avaliação é favorável à diversidade.

“O pessoal deles tem um perfil diferente. Quer entender o porquê de tudo e tem boa capacidade de inovação”, diz o chileno Eli Senerman, diretor do departamento digital da Latam. A empresa contratou os serviços de um time de seis pessoas da ThoughtWorks no início de 2015 e hoje tem 90 deles trabalhando em projetos de sua área digital.

Até agora, não houve registro de mal-estar. Senerman garante que ninguém da Latam deixou escapar algum comentário preconceituoso.

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