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Quem mora sozinho hoje é um ótimo mercado

Foi-se o tempo em que alguém que vivesse sozinho era visto como solitário e num momento de transição. São pessoas que preferem assim e estão dispostas a gastar mais para morar bem

A designer Vanessa Lima mora sozinha e trabalha em home office (Daniela Toviansky / EXAME PME)
DR

Da Redação

Publicado em 27 de fevereiro de 2014 às 19h46.

São Paulo - Nos últimos 20 anos, o número de domicílios ocupados por um único morador triplicou no país e hoje o montante chega a quase 8,5 milhões. É um crescimento grande, principalmente quando se considera que, no mesmo período, o número de casas e apartamentos não chegou a dobrar.

Essa foi a transformação quantitativa no grupo demográfico formado por quem vive sem companhia. Agora a mudança é qualitativa. Não muito tempo atrás, quem aceitasse o convite para subir ao apartamento de alguém que morasse sozinho deveria estar preparado para não encontrar um ambiente muito agradável.

O clichê é aquele que quase todo mundo já viu num flme ou seriado — caixas de pizza vazias de uma semana atrás empilhadas numa mesinha, meias espalhadas pelos cantos, almofadas no chão no lugar de um sofá decente. Na cozinha, desabastecimento pior, só na Segunda Guerra.

Pode ser uma caricatura, mas, em boa parte dos casos, a realidade não era muito mais bonita do que isso. "Quem morava sozinho costumava referir-se a si mesmo como acampado", diz Michel Alcoforado, da Consumoteca, que fez, junto com Exame PME, uma pesquisa que revelou os principais hábitos de consumo dos brasileiros que vivem sozinhos. "Em geral, morar sem ninguém era uma condição temporária."

Hoje, morar só não é mais sinônimo de abandono. A designer mineira Vanessa Lima, de 38 anos, radicada em São Paulo desde 1999, é um exemplo perfeito. Ela escolheu o bairro de Perdizes, na zona oeste de São Paulo, para se estabelecer. Seu apartamento, de dois quartos e uma sala dispostos em 54 metros quadrados, está sempre bem organizado e com pequenos vasos de flores enfeitando os cômodos.


No prédio, além dos obrigatórios salão de festas e churrasqueira, há academia de ginástica e salão de jogos. Falta de mobilidade urbana é um problema que Vanessa não tem. Seu endereço é perto de uma estação de metrô e servido por três dos principais corredores de ônibus de São Paulo.

"Consigo chegar facilmente a qualquer lugar da cidade”, diz Vanessa. “E faço questão de não ter carro, pois polui o planeta." Somados aluguel e condomínio, Vanessa separa 30% da renda mensal para viver desse jeito. Por que uma mulher bonita, culta e alegre está sem ninguém em casa? "Porque quero", afirma ela. 'E me sinto mais tranquila assim.” Então, tá.

Brasileiros como Vanessa têm feito bem à incorporadora paulistana MaxCasa. No ano passado, a empresa faturou 225 milhões de reais, 22% mais do que em 2012, ao vender apartamentos em prédios com piscina, academia e lavanderia coletiva em cidades populosas, como São Paulo e Campinas.

Batizados de MaxHaus, os apartamentos são padronizados — 70 metros quadrados e nenhuma parede. O futuro proprietário defIne a distribuição do espaço escolhendo entre mais de 200 combinações. Cozinha pequena, sala grande e quarto médio? Sala pequena, quarto grande e cozinha média? Ou quarto pequeno, sala média e cozinha grande? O contrário disso tudo ao mesmo tempo?

"De todos que compraram nossos apartamentos até hoje, 40% vivem sós", diz o engenheiro José Paim, de 60 anos, fundador da empresa. "E quem mora só não precisa pedir a opinião dos outros."

Hoje em dia, é comum que brasileiros sozinhos trabalhem em casa, em sistema de home office. O engenheiro paulista Alexandre Borin,
de 36 anos, identificou nas necessidades desse público a oportunidade de criar a Prestus, que presta serviços remotos para pessoas que trabalham em casa.

O principal produto da Prestus é um sistema batizado de Número Mágico. Trata-se de um direcionador de chamadas telefônicas. Quando alguém liga para um assinante do Número Mágico, quem atende é uma secretária, funcionária da Prestus. Ela pode tomar pedidos de orçamento, anotar recados e direcionar ligações urgentes para o celular do cliente.

"Enviamos um informe a cada ligação atendida, e o cliente define quando quer retornar", diz Borin. "Isso atribui certo profssionalismo ao atendimento e ajuda o assinante a organizar sua rotina de trabalho em casa." O público formado por quem mora e trabalha sozinho em casa tem sido o motor de expansão da empresa.

"O número de assinantes sozinhos aumentou 7% no ano passado e já é um terço do total de nossos clientes", afirma Borin.  "Muitos são autônomos ou abriram empresas há pouco tempo." Em 2013, a Prestus faturou 1,5 milhão de reais, quase o dobro de 2012.


A lista de compras de quem mora sozinho é diferente daquela do cliente que abastece um grupo familiar. Os sozinhos vão ao supermercado com menor frequência e, quando vão, gastam 18% menos do que a média. "Eles compram pouca comida porque quase não cozinham", diz Jeferson Silva, gerente da Nielsen. "E gastam no mínimo 20% mais com produtos prontos."

O empreendedor paulistano Felipe Fioravante, de 30 anos, é sócio do iFood, que mantém um site e um aplicativo de celular para pedir comida. Os clientes são bares, restaurantes e lanchonetes, que pagam comissões de aproximadamente 12% do valor do pedido. Em 2013, os pedidos aumentaram quase cinco vezes e fizeram o iFood obter receitas estimadas em 7 milhões de reais.

Dos usuários, os que vivem sozinhos são 25%, mas valem mais do que pesam. Quem mora só pede comida até três vezes por semana. Os outros usam o serviço cinco vezes, em média, durante o ano inteiro.

O que saber

Os principais hábitos das pessoas que moram sozinhas e como aproveitar seu potencial de consumo

Mito

Quem mora sozinho compra tudo pronto para consumo e não faz trabalho doméstico nem sob tortura. Afinal, a residência é algo temporário mesmo. Comer fora, por exemplo, é a regra, que é para não ter de lavar a louça, limpar o fogão e varrer a cozinha.

As únicas empresas que conseguem se aproximar desse consumidor são as que fazem eletrodomésticos em tamanho reduzido, como frigobar e lavadoras, as que produzem comida em embalagens pequenas e porções individuais e "mini-isso-e-aquilo" em geral.

Realidade

Morar sozinho tem se tornado uma escolha de vida para um número cada vez maior de brasileiros — e esse grupo está disposto a dar uma cara de lar à sua casa.

Geralmente, quem decide morar sozinho aceita pagar relativamente caro para ficar em apartamentos pequenos em condomínios que, em contrapartida, oferecem uma infraestrutura com facilidades como lavanderia coletiva, academia de ginástica, piscina, sauna, churrasqueira, parquinho para as crianças e área de convivência.

Oportunidade

O crédito imobiliário atingiu algo em torno de 8% do PIB em 2013 — praticamente o dobro do que representava em 2010. Com mais gente comprando a casa própria, aumentam as chances de darem certo negócios como escritórios de arquitetura e decoração.

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São Paulo - Nos últimos 20 anos, o número de domicílios ocupados por um único morador triplicou no país e hoje o montante chega a quase 8,5 milhões. É um crescimento grande, principalmente quando se considera que, no mesmo período, o número de casas e apartamentos não chegou a dobrar.

Essa foi a transformação quantitativa no grupo demográfico formado por quem vive sem companhia. Agora a mudança é qualitativa. Não muito tempo atrás, quem aceitasse o convite para subir ao apartamento de alguém que morasse sozinho deveria estar preparado para não encontrar um ambiente muito agradável.

O clichê é aquele que quase todo mundo já viu num flme ou seriado — caixas de pizza vazias de uma semana atrás empilhadas numa mesinha, meias espalhadas pelos cantos, almofadas no chão no lugar de um sofá decente. Na cozinha, desabastecimento pior, só na Segunda Guerra.

Pode ser uma caricatura, mas, em boa parte dos casos, a realidade não era muito mais bonita do que isso. "Quem morava sozinho costumava referir-se a si mesmo como acampado", diz Michel Alcoforado, da Consumoteca, que fez, junto com Exame PME, uma pesquisa que revelou os principais hábitos de consumo dos brasileiros que vivem sozinhos. "Em geral, morar sem ninguém era uma condição temporária."

Hoje, morar só não é mais sinônimo de abandono. A designer mineira Vanessa Lima, de 38 anos, radicada em São Paulo desde 1999, é um exemplo perfeito. Ela escolheu o bairro de Perdizes, na zona oeste de São Paulo, para se estabelecer. Seu apartamento, de dois quartos e uma sala dispostos em 54 metros quadrados, está sempre bem organizado e com pequenos vasos de flores enfeitando os cômodos.


No prédio, além dos obrigatórios salão de festas e churrasqueira, há academia de ginástica e salão de jogos. Falta de mobilidade urbana é um problema que Vanessa não tem. Seu endereço é perto de uma estação de metrô e servido por três dos principais corredores de ônibus de São Paulo.

"Consigo chegar facilmente a qualquer lugar da cidade”, diz Vanessa. “E faço questão de não ter carro, pois polui o planeta." Somados aluguel e condomínio, Vanessa separa 30% da renda mensal para viver desse jeito. Por que uma mulher bonita, culta e alegre está sem ninguém em casa? "Porque quero", afirma ela. 'E me sinto mais tranquila assim.” Então, tá.

Brasileiros como Vanessa têm feito bem à incorporadora paulistana MaxCasa. No ano passado, a empresa faturou 225 milhões de reais, 22% mais do que em 2012, ao vender apartamentos em prédios com piscina, academia e lavanderia coletiva em cidades populosas, como São Paulo e Campinas.

Batizados de MaxHaus, os apartamentos são padronizados — 70 metros quadrados e nenhuma parede. O futuro proprietário defIne a distribuição do espaço escolhendo entre mais de 200 combinações. Cozinha pequena, sala grande e quarto médio? Sala pequena, quarto grande e cozinha média? Ou quarto pequeno, sala média e cozinha grande? O contrário disso tudo ao mesmo tempo?

"De todos que compraram nossos apartamentos até hoje, 40% vivem sós", diz o engenheiro José Paim, de 60 anos, fundador da empresa. "E quem mora só não precisa pedir a opinião dos outros."

Hoje em dia, é comum que brasileiros sozinhos trabalhem em casa, em sistema de home office. O engenheiro paulista Alexandre Borin,
de 36 anos, identificou nas necessidades desse público a oportunidade de criar a Prestus, que presta serviços remotos para pessoas que trabalham em casa.

O principal produto da Prestus é um sistema batizado de Número Mágico. Trata-se de um direcionador de chamadas telefônicas. Quando alguém liga para um assinante do Número Mágico, quem atende é uma secretária, funcionária da Prestus. Ela pode tomar pedidos de orçamento, anotar recados e direcionar ligações urgentes para o celular do cliente.

"Enviamos um informe a cada ligação atendida, e o cliente define quando quer retornar", diz Borin. "Isso atribui certo profssionalismo ao atendimento e ajuda o assinante a organizar sua rotina de trabalho em casa." O público formado por quem mora e trabalha sozinho em casa tem sido o motor de expansão da empresa.

"O número de assinantes sozinhos aumentou 7% no ano passado e já é um terço do total de nossos clientes", afirma Borin.  "Muitos são autônomos ou abriram empresas há pouco tempo." Em 2013, a Prestus faturou 1,5 milhão de reais, quase o dobro de 2012.


A lista de compras de quem mora sozinho é diferente daquela do cliente que abastece um grupo familiar. Os sozinhos vão ao supermercado com menor frequência e, quando vão, gastam 18% menos do que a média. "Eles compram pouca comida porque quase não cozinham", diz Jeferson Silva, gerente da Nielsen. "E gastam no mínimo 20% mais com produtos prontos."

O empreendedor paulistano Felipe Fioravante, de 30 anos, é sócio do iFood, que mantém um site e um aplicativo de celular para pedir comida. Os clientes são bares, restaurantes e lanchonetes, que pagam comissões de aproximadamente 12% do valor do pedido. Em 2013, os pedidos aumentaram quase cinco vezes e fizeram o iFood obter receitas estimadas em 7 milhões de reais.

Dos usuários, os que vivem sozinhos são 25%, mas valem mais do que pesam. Quem mora só pede comida até três vezes por semana. Os outros usam o serviço cinco vezes, em média, durante o ano inteiro.

O que saber

Os principais hábitos das pessoas que moram sozinhas e como aproveitar seu potencial de consumo

Mito

Quem mora sozinho compra tudo pronto para consumo e não faz trabalho doméstico nem sob tortura. Afinal, a residência é algo temporário mesmo. Comer fora, por exemplo, é a regra, que é para não ter de lavar a louça, limpar o fogão e varrer a cozinha.

As únicas empresas que conseguem se aproximar desse consumidor são as que fazem eletrodomésticos em tamanho reduzido, como frigobar e lavadoras, as que produzem comida em embalagens pequenas e porções individuais e "mini-isso-e-aquilo" em geral.

Realidade

Morar sozinho tem se tornado uma escolha de vida para um número cada vez maior de brasileiros — e esse grupo está disposto a dar uma cara de lar à sua casa.

Geralmente, quem decide morar sozinho aceita pagar relativamente caro para ficar em apartamentos pequenos em condomínios que, em contrapartida, oferecem uma infraestrutura com facilidades como lavanderia coletiva, academia de ginástica, piscina, sauna, churrasqueira, parquinho para as crianças e área de convivência.

Oportunidade

O crédito imobiliário atingiu algo em torno de 8% do PIB em 2013 — praticamente o dobro do que representava em 2010. Com mais gente comprando a casa própria, aumentam as chances de darem certo negócios como escritórios de arquitetura e decoração.

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