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Startup com lance verde tem mais chances de investimento

Francisco Perez, gestor do Inseed investimentos — fundo que investe em negócios emergentes —, diz que a forma como lidamos com o lixo e outros problemas urbanos chegou ao limite

Olho humano com circuitos de tecnologia (SXC.Hu)

Olho humano com circuitos de tecnologia (SXC.Hu)

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Da Redação

Publicado em 29 de dezembro de 2013 às 16h24.

São Paulo - O matemático e engenheiro eletricista Francisco Perez, de 51 anos, tem uma tarefa árdua para cumprir. No Inseed Investimentos, fundo que dirige, há 400 projetos de startups em análise. Os que apresentarem algum tipo de tecnologia que possa ser aplicado ao meio ambiente terão chance de passar à etapa seguinte.

" O objetivo é aportar capital em 15 a 20 empresas até 2016", diz Perez. Ele e sua equipe vão verificar, entre outros aspectos, se a tecnologia pode ser protegida por patentes e se o modelo de negócios permite expansão rápida. 

Criado no começo deste ano, o fundo do Inseed já captou 165 milhões de reais. Entre os participantes estão o BNDES, fundos de pensão e pessoas físicas. O Inseed busca negócios de alto impacto tecnológico capazes de enfrentar desafios trazidos pelo adensamento nas cidades, como poluição do ar, alto nível de ruído e congestionamento. 

"Os problemas gerados pelas metrópoles representam um oceano de oportunidades para os empreendedores", diz Perez. A seguir, ele explica por quê.

EXAME PME -  Os problemas urbanos de uma cidade grande como São Paulo ou Rio de Janeiro existem há décadas. Por que só agora se tornaram oportunidades?

Francisco Perez - Um motivo é que a ciência avançou muito nos últimos 20 anos. Avançou tanto que possibilitou soluções a custos comercialmente acessíveis. Veja o caso dos resíduos. Até poucos anos atrás, praticamente não se falava em biotecnologia. Hoje, é uma solução para tratar efluentes.  Outro motivo é que a forma como lidamos com o lixo e demais descartes chegou ao limite. 

EXAME PME - Por quê? 

Francisco Perez - Em várias grandes cidades brasileiras, não há áreas para mais aterros, cuja tecnologia é da Idade Média. Belo Horizonte é um caso. A prefeitura está tentando encontrar cidades vizinhas que recebam o lixo. Só que elas cobram por isso. Há outros custos, como o transporte.

Mas não fica só nisso. Mais cedo ou mais tarde, será preciso procurar outra cidade, que cobrará mais do que a primeira. Alguém vai pagar essa conta — o cidadão, que pagará mais impostos. 


EXAME PME -  Quais são as principais oportunidades ligadas à sustentabilidade urbana?

Francisco Perez - Tratamento de resíduos é a principal. A indústria é um mercado enorme. O tratamento de efuentes da indústria alimentícia, por exemplo, tem de ser isolado. Os resíduos hospitalares são um desafio tecnológico diferente — em hipótese alguma um material contaminante pode ir para o aterro ou ser reciclado. 

Conforme a medicina avança, há cada vez mais resíduos. Os problemas de trânsito, como congestionamento e qualidade do transporte público, também são oportunidades para quem quer empreender. Por fim, há os novos materiais, como plásticos degradáveis, que podem ser utilizados na engenharia. 

EXAME PME -  Dá para resolver tanta coisa?

Francisco Perez - Sim, desde que se desenvolvam novas tecnologias. E, ao contrário do que muita gente pensa, são as pequenas empresas que trarão essas soluções. 

EXAME PME -  Por que as pequenas? 

Francisco Perez - Há uma porção de tecnologias interessantes sendo desenvolvidas no ambiente universitário. Algumas delas podem se transformar em negócios de muito futuro, caso recebam capital e gestão adequada. É aí que entra um fundo como o Inseed. 

EXAME PME -  A Ecosynth, de São Paulo, desenvolveu um componente para tratar efluentes. Por que o Inseed investiu nela?

Francisco Perez - Porque, no fim do processo, o que resta é um lixo orgânico de volume bem menor do que o produzido pelos tratamentos convencionais — o que reduz o custo de seu descarte para os clientes, como fabricantes de bebidas e de cosméticos.

EXAME PME -  Que desafio uma empresa com um produto tão inovador como esse enfrenta?

Francisco Perez - Um deles é conquistar grandes clientes. É difícil convencê-los de que devem trocar fornecedores com os quais estão acostumados por uma empresa pequena. É preciso bancar testes piloto e fazer relatórios que demonstrem a superioridade da inovação oferecida. Outra dificuldade é fixar preços com base na economia gerada para o cliente. 


EXAME PME -  O que você achou da TC Urbes, que faz projetos de ciclovias e bicicletários? 

Francisco Perez - É interessante, pois a ideia é integrá-los aos sistemas de transporte público. Mas depender de vendas apenas para o setor público pode espremer as margens da empresa. Seria necessário ampliar a base de clientes, investindo em concessões privadas — inclusive no exterior.  Outra dificuldade é ganhar escala, pois cada projeto é diferente do outro. 

EXAME PME -  Quais os pontos positivos da Ecotelhado?

Ela ajuda, sim, a reduzir o problema das enchentes, pois de fato aumenta a área permeável da superfície urbana. O efeito, claro, é restrito, já que ainda não é um produto usado em larga escala. O telhado também tem efeito na redução da variação térmica, uma vez que atua como armazenador de umidade. Trata-se de um tipo de sistema relativamente comum em países nórdicos. 

EXAME PME -  O que essa empresa poderia fazer para crescer mais rapidamente?

Francisco Perez - Uma ideia a ser estudada é modularizar o sistema. Podemos imaginar um cenário em que o próprio cliente final encomende os módulos numa grande rede de construção, os receba em casa, e uma empresa terceirizada certifcada pela Ecotelhados faça a instalação. Isso aumentaria a capilaridade do negócio, que passaria a se concentrar na fabricação. 

EXAME PME -  Falou-se muito em custo até agora. Mas até que ponto a solução dos problemas urbanos depende da pressão social?

Francisco Perez - É difícil dizer até aonde vai o esgotamento dos atuais modelos de sustentabilidade urbana e onde começa o inconformismo da sociedade. Eu e você já jogamos muito papel na rua. Era normal. Agora ficamos chocados quando vemos alguém amassar um maço de cigarros e atirá-lo pela janela.

A nova geração não aceita esse tipo de coisa. Os jovens, que nasceram ouvindo falar em reciclagem e na importância de preservar o meio ambiente, não acham normal uma pessoa jogar lixo na calçada.

Hoje achamos normal que as pessoas não possam fumar nas empresas. Mas até poucos anos atrás era permitido fumar em voos internacionais. Os passageiros chegavam ao destino atordoados, depois de passar 10 horas respirando aquele ar fumacento e insalubre.

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