O que empreendedores aprendem com a proposta do Burger King?
A polêmica proposta de lanche a dois com o McDonald's leva à reflexão: que mensagem uma empresa deve passar aos seus clientes?
Da Redação
Publicado em 2 de setembro de 2015 às 15h00.
O Dia da Paz acabou travando um embate entre Burger King e McDonald’s. Há quem defenda um ou outro, mas o que nós, empreendedores, aprendemos com isso?
Nesses últimos dias, presenciamos nas redes sociais um fato bastante inusitado e curioso, e que começa a ser tornar cada vez mais frequente no universo das marcas. A rede de fast food Burger King , que recentemente também andou discutindo com a rede de frango KFC, se envolveu em outro embate discursivo. A proposta, em formato de um vídeo, partiu do Burger King em criar um sanduiche híbrido: juntar o Big Mac e Whopper em um só e criar o McWhopper.
A nobre intenção era fazer um dia especial e sem rivalidades, por conta do Peace One Day, que será no 21 de setembro – data deteminada pela ONU para promover o Dia Internacional da Paz. Além do vídeo, o Burger King endereçou uma carta ao McDonald’s e fizeram um site especial.
Infelizmente, o McDonald’s não aceitou a proposta do McWhopper e publicou um texto de recusa, orginalmente em inglês, mas que logo foi compartilhado pela marca no Brasil.
Vamos aos fatos:
No texto, o McDonald’s tentou propor uma ação mais ampla em conjunto, falando que a paz por uma guerra de hambúrgueres não seria equivalente à proposta de paz vinda da ONU. E para agravar ainda mais, o McDonald’s provocou a concorrência nas entrelinhas dizendo que um simples telefonema seria o bastante para essa questão ser debatida, dando a entender que não aprovou a exposição protagonizada pelo Burger King.
Por fim, a página da marca genuinamente brasileira Giraffas percebeu uma deixa em todo esse caso e publicou que aceitaria a proposta do Burger King. Ainda por cima, sugeriu dois nomes para o sanduíche: BK Brutus e GiraWhopper.
O assunto meio que parou por aí, mas as repercussões explodiram nas redes sociais. Esse tipo de discussão digital entre marcas não é grande novidade. Vimos algo similar tempos atrás quando marcas de banco como Itaú, Bradesco e Santander disputaram a atenção de um consumidor no Facebook por meio de uma espécie de um jogo de palavras e rimas.
E se…?
O Burger King tem adotado com certa frequência posturas como essa, de provocar outras marcas pela via do humor, mas isso não nos leva a crer que tenha agido de má fé nesse episódio. Muito pelo contrário. O BK quis testar novos formatos discursivos da marca e quis apenas provocar e cutucar um pouco o McDonald’s, mas certamente já imaginando que eles não fossem entrar no jogo, que foi exatamente o que aconteceu.
Entrar em um jogo de provocações como esse pode ferir o comportamento padrão de uma marca, vis-à-vis outras várias pressões, críticas e provocações.
O silêncio ou a resposta discreta, como foi o caso, pode fazer parte de uma estratégia da marca.
O que poderia acontecer se McDonald’s tivesse aceitado é muito difícil imaginar, pois isso iria “remixar” a proposta de valor do Big Mac, o principal hambúrguer da rede. E atenção aqui, ele é mais que um mero sanduiche: é símbolo de uma cultura norte-americana, é um lanche que simboliza índices econômicos pelo mundo. Preferiram deixar a marca Big Mac devidamente blindada.
Uma conversa entre gigantes
Podemos analisar toda essa situação sob diversos prismas. Primeiro que, ao mesmo tempo que vemos uma tendência clara de pessoas se tornarem marcas hoje em dia, vemos também marcas se comportando da mesma forma que pessoas. E por meio de astutas estratégias discursivas, evidenciamos hoje essa clara tendência de marcas se humanizando, agindo como se ela fosse realmente uma pessoa.
A própria Coca-Cola protagoniza ainda hoje uma ação muito bem feita, onde coloca nomes de pessoas nas suas latinhas. Outros negócios lucrativos, como Magazine Luiza, Bombril ou Sadia, se corporificam na figura de uma mascote para aproximar a marca ainda mais das pessoas.
Burger King, McDonald’s e Giraffas, em todo esse debate, podiam ser vistas como verdadeiras pessoas em discussão, e não grandes corporações multinacionais, movidas a resultados, o que elas são, de fato.
Outro ponto de análise bastante pertinente que nos cabe refletir nesse momento é: esse tipo de estratégia de humanização, que Burger King e tantas outras utilizam, constrói relevância de marca? O quanto que uma postura arrojada dessa, ainda que muito inovadora, está alinhada com o posicionamento e demais pontos de contato da marca? Protagonizar cases bem humorados e polêmicos que viralizam constroem marca, e ajudam a reforçar um posicionamento? São questões candentes e que nos exigem reflexões.
Seja qual for o tamanho da empresa, fazer um trabalho de branding é construir um posicionamento de marca relevante na vida das pessoas.
E não se trata de uma tarefa simples. Tudo isso deve ser feito de forma muito cuidadosa, responsável e, sobretudo, muito consistente e alinhando sempre todos os pontos de contato.
Moral da história
Sob a ótica de inovação, pensar coisas novas e ter coragem para executar novas formas discursivas de conectar marcas às pessoas, Burger King e McDonald’s merecem nota dez. Mas sob a ótica de construção consistente de relevância de marca na vida das pessoas, tenho minhas dúvidas.
Vivemos num mundo de excesso de marcas, saturação de mensagens publicitárias, nossas fraquezas cada vez mais expostas e um desafio cada vez maior de se chegar a diferenciais competitivos. Se não tivermos muita consistência em todos os pontos de contato, corremos o risco de não construir um posicionamento efetivo.
Se adotarmos uma postura de marca no balcão da loja, outra postura na propaganda, outra junto a fornecedores, uma outra linguagem no Facebook, outro tom de marca no 0800 da empresa, corremos sério risco de sermos inconsistentes e pouco percebidos na vida dos consumidores. E infelizmente é isso que vemos na realidade de muitas dessas marcas hoje em dia.
Construção de relevância de marca é um desafio atípico, exige preparo e capacitação. Construir marca, hoje, é tocar a vida das pessoas – de forma criativa, com excelência na execução e harmonizando o nosso propósito em todos os pontos de contato. As pessoas virando marcas e as marcas virando pessoas. É complexo, é estranho, mas é o que evidenciamos hoje.
Ser relevante e dar uma razão para os consumidores nos desejarem é a melhor saída para ser diferente e construir marca de forma sólida, memorável e consistente. O Burger King tentou, o McDonald’s fincou os pés no chão e o Giraffas pegou carona. Os próximos capítulos dessa história, nós acompanhamos até dia 21 de setembro.
Marcos Hller é sócio da Hiller Training & Consulting
O Dia da Paz acabou travando um embate entre Burger King e McDonald’s. Há quem defenda um ou outro, mas o que nós, empreendedores, aprendemos com isso?
Nesses últimos dias, presenciamos nas redes sociais um fato bastante inusitado e curioso, e que começa a ser tornar cada vez mais frequente no universo das marcas. A rede de fast food Burger King , que recentemente também andou discutindo com a rede de frango KFC, se envolveu em outro embate discursivo. A proposta, em formato de um vídeo, partiu do Burger King em criar um sanduiche híbrido: juntar o Big Mac e Whopper em um só e criar o McWhopper.
A nobre intenção era fazer um dia especial e sem rivalidades, por conta do Peace One Day, que será no 21 de setembro – data deteminada pela ONU para promover o Dia Internacional da Paz. Além do vídeo, o Burger King endereçou uma carta ao McDonald’s e fizeram um site especial.
Infelizmente, o McDonald’s não aceitou a proposta do McWhopper e publicou um texto de recusa, orginalmente em inglês, mas que logo foi compartilhado pela marca no Brasil.
Vamos aos fatos:
No texto, o McDonald’s tentou propor uma ação mais ampla em conjunto, falando que a paz por uma guerra de hambúrgueres não seria equivalente à proposta de paz vinda da ONU. E para agravar ainda mais, o McDonald’s provocou a concorrência nas entrelinhas dizendo que um simples telefonema seria o bastante para essa questão ser debatida, dando a entender que não aprovou a exposição protagonizada pelo Burger King.
Por fim, a página da marca genuinamente brasileira Giraffas percebeu uma deixa em todo esse caso e publicou que aceitaria a proposta do Burger King. Ainda por cima, sugeriu dois nomes para o sanduíche: BK Brutus e GiraWhopper.
O assunto meio que parou por aí, mas as repercussões explodiram nas redes sociais. Esse tipo de discussão digital entre marcas não é grande novidade. Vimos algo similar tempos atrás quando marcas de banco como Itaú, Bradesco e Santander disputaram a atenção de um consumidor no Facebook por meio de uma espécie de um jogo de palavras e rimas.
E se…?
O Burger King tem adotado com certa frequência posturas como essa, de provocar outras marcas pela via do humor, mas isso não nos leva a crer que tenha agido de má fé nesse episódio. Muito pelo contrário. O BK quis testar novos formatos discursivos da marca e quis apenas provocar e cutucar um pouco o McDonald’s, mas certamente já imaginando que eles não fossem entrar no jogo, que foi exatamente o que aconteceu.
Entrar em um jogo de provocações como esse pode ferir o comportamento padrão de uma marca, vis-à-vis outras várias pressões, críticas e provocações.
O silêncio ou a resposta discreta, como foi o caso, pode fazer parte de uma estratégia da marca.
O que poderia acontecer se McDonald’s tivesse aceitado é muito difícil imaginar, pois isso iria “remixar” a proposta de valor do Big Mac, o principal hambúrguer da rede. E atenção aqui, ele é mais que um mero sanduiche: é símbolo de uma cultura norte-americana, é um lanche que simboliza índices econômicos pelo mundo. Preferiram deixar a marca Big Mac devidamente blindada.
Uma conversa entre gigantes
Podemos analisar toda essa situação sob diversos prismas. Primeiro que, ao mesmo tempo que vemos uma tendência clara de pessoas se tornarem marcas hoje em dia, vemos também marcas se comportando da mesma forma que pessoas. E por meio de astutas estratégias discursivas, evidenciamos hoje essa clara tendência de marcas se humanizando, agindo como se ela fosse realmente uma pessoa.
A própria Coca-Cola protagoniza ainda hoje uma ação muito bem feita, onde coloca nomes de pessoas nas suas latinhas. Outros negócios lucrativos, como Magazine Luiza, Bombril ou Sadia, se corporificam na figura de uma mascote para aproximar a marca ainda mais das pessoas.
Burger King, McDonald’s e Giraffas, em todo esse debate, podiam ser vistas como verdadeiras pessoas em discussão, e não grandes corporações multinacionais, movidas a resultados, o que elas são, de fato.
Outro ponto de análise bastante pertinente que nos cabe refletir nesse momento é: esse tipo de estratégia de humanização, que Burger King e tantas outras utilizam, constrói relevância de marca? O quanto que uma postura arrojada dessa, ainda que muito inovadora, está alinhada com o posicionamento e demais pontos de contato da marca? Protagonizar cases bem humorados e polêmicos que viralizam constroem marca, e ajudam a reforçar um posicionamento? São questões candentes e que nos exigem reflexões.
Seja qual for o tamanho da empresa, fazer um trabalho de branding é construir um posicionamento de marca relevante na vida das pessoas.
E não se trata de uma tarefa simples. Tudo isso deve ser feito de forma muito cuidadosa, responsável e, sobretudo, muito consistente e alinhando sempre todos os pontos de contato.
Moral da história
Sob a ótica de inovação, pensar coisas novas e ter coragem para executar novas formas discursivas de conectar marcas às pessoas, Burger King e McDonald’s merecem nota dez. Mas sob a ótica de construção consistente de relevância de marca na vida das pessoas, tenho minhas dúvidas.
Vivemos num mundo de excesso de marcas, saturação de mensagens publicitárias, nossas fraquezas cada vez mais expostas e um desafio cada vez maior de se chegar a diferenciais competitivos. Se não tivermos muita consistência em todos os pontos de contato, corremos o risco de não construir um posicionamento efetivo.
Se adotarmos uma postura de marca no balcão da loja, outra postura na propaganda, outra junto a fornecedores, uma outra linguagem no Facebook, outro tom de marca no 0800 da empresa, corremos sério risco de sermos inconsistentes e pouco percebidos na vida dos consumidores. E infelizmente é isso que vemos na realidade de muitas dessas marcas hoje em dia.
Construção de relevância de marca é um desafio atípico, exige preparo e capacitação. Construir marca, hoje, é tocar a vida das pessoas – de forma criativa, com excelência na execução e harmonizando o nosso propósito em todos os pontos de contato. As pessoas virando marcas e as marcas virando pessoas. É complexo, é estranho, mas é o que evidenciamos hoje.
Ser relevante e dar uma razão para os consumidores nos desejarem é a melhor saída para ser diferente e construir marca de forma sólida, memorável e consistente. O Burger King tentou, o McDonald’s fincou os pés no chão e o Giraffas pegou carona. Os próximos capítulos dessa história, nós acompanhamos até dia 21 de setembro.
Marcos Hller é sócio da Hiller Training & Consulting