O velho pintor que não pintou, mas bordou. E como!
Não é por ser especialista em vendas que estou imune a vendedores mal-intencionados. Entrei numa roubada, mas a culpa foi minha
Da Redação
Publicado em 7 de maio de 2014 às 14h20.
São Paulo - Era um senhor de cabelos brancos muito bem penteados, roupa e unhas limpíssimas. Minha mulher o adorou. Ele fora indicado pelo empreiteiro da construção de nossa casa, no interior paulista, para pintar as paredes.
Parecia extremamente profissional. Quando fomos escolher as tintas, chamou-nos a atenção o capricho com as amostras. “Você reparou que ele não derramou nem uma gota de tinta e limpou os pincéis a cada troca de cor?”, disse minha mulher. Fechamos negócio.
Semana sim, semana não, visitávamos a obra. Apesar de a pintura estar programada para dali a dois meses, o pintor estava sempre lá. Brincava com as crianças e dava boas opiniões. Apareceu um consertinho aqui e ali, que ofereci a ele. Fiquei feliz por ter ajudado aquele homem tão bom a conseguir um dinheirinho extra. Os serviços ficaram impecáveis.
Dias antes de começar a pintura, ele me procurou. Disse que precisava de dinheiro e pediu para adiantar metade do pagamento. O pintor lembrava meu pai, minha infância e todas as dificuldades que minha família atravessou. Fiquei muito emocionado e assinei o cheque.
Foi aí que as coisas mudaram completamente.
O pintor não aparecia e, quando vinha, fazia nada ou pouca coisa. Depois de muitas mancadas e semanas de atraso, fizemos uma reunião. Pela segunda vez, caí na conversa daquele senhor. Ele disse que estava doente e devendo no banco. Fiquei comovido de novo. Acreditem — paguei mais metade do restante.
Novamente, o pintor desapareceu. Num dia estava doente, noutro era a mulher. Só dava o ar da graça depois de eu telefonar, nervoso, para passar aquela bronca. Numa dessas vezes ele disse ter feito um mau negócio e que, em vez de receber o resto só no fim, era melhor eu pagar por semana.
Até que um dia ele pediu um reajuste. Fiquei furioso e, pela primeira vez, expulsei alguém da minha propriedade.
Há décadas ensino vendedores a vender mais. Mas há gente, como esse homem, que usa a cartilha para passar a perna nos outros.
Como você constatou, não é por ser especialista que estou imune a esse tipo de malandragem. Tomei um baita prejuízo, e resolvi escrever esta coluna.
O que me faltou foi ter malícia — o que é bem diferente de ser malicioso. Quem tem malícia procura identificar o mal para evitá-lo. Os maliciosos anteveem o mal para exercê-lo. Cuidado: tenha malícia para não cair no ardil de quem é malicioso.
São Paulo - Era um senhor de cabelos brancos muito bem penteados, roupa e unhas limpíssimas. Minha mulher o adorou. Ele fora indicado pelo empreiteiro da construção de nossa casa, no interior paulista, para pintar as paredes.
Parecia extremamente profissional. Quando fomos escolher as tintas, chamou-nos a atenção o capricho com as amostras. “Você reparou que ele não derramou nem uma gota de tinta e limpou os pincéis a cada troca de cor?”, disse minha mulher. Fechamos negócio.
Semana sim, semana não, visitávamos a obra. Apesar de a pintura estar programada para dali a dois meses, o pintor estava sempre lá. Brincava com as crianças e dava boas opiniões. Apareceu um consertinho aqui e ali, que ofereci a ele. Fiquei feliz por ter ajudado aquele homem tão bom a conseguir um dinheirinho extra. Os serviços ficaram impecáveis.
Dias antes de começar a pintura, ele me procurou. Disse que precisava de dinheiro e pediu para adiantar metade do pagamento. O pintor lembrava meu pai, minha infância e todas as dificuldades que minha família atravessou. Fiquei muito emocionado e assinei o cheque.
Foi aí que as coisas mudaram completamente.
O pintor não aparecia e, quando vinha, fazia nada ou pouca coisa. Depois de muitas mancadas e semanas de atraso, fizemos uma reunião. Pela segunda vez, caí na conversa daquele senhor. Ele disse que estava doente e devendo no banco. Fiquei comovido de novo. Acreditem — paguei mais metade do restante.
Novamente, o pintor desapareceu. Num dia estava doente, noutro era a mulher. Só dava o ar da graça depois de eu telefonar, nervoso, para passar aquela bronca. Numa dessas vezes ele disse ter feito um mau negócio e que, em vez de receber o resto só no fim, era melhor eu pagar por semana.
Até que um dia ele pediu um reajuste. Fiquei furioso e, pela primeira vez, expulsei alguém da minha propriedade.
Há décadas ensino vendedores a vender mais. Mas há gente, como esse homem, que usa a cartilha para passar a perna nos outros.
Como você constatou, não é por ser especialista que estou imune a esse tipo de malandragem. Tomei um baita prejuízo, e resolvi escrever esta coluna.
O que me faltou foi ter malícia — o que é bem diferente de ser malicioso. Quem tem malícia procura identificar o mal para evitá-lo. Os maliciosos anteveem o mal para exercê-lo. Cuidado: tenha malícia para não cair no ardil de quem é malicioso.