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O anti-Parker

O produtor italiano Biondi Santi faz vinhos de 3 500 reais -- que são considerados abaixo da crítica pelo mais conceituado especialista do mundo

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Da Redação

Publicado em 12 de outubro de 2010 às 18h16.

Seja pelo terno mostarda e pela gravata laranja, seja pelo ar jovial que pode ser observado na foto ao lado, dificilmente a primeira impressão que Jacopo Biondi Santi transmite é a de um feroz defensor das tradições -- seria mais fácil tachá-lo de extravagante bon vivant. Basta meia hora de conversa, porém, para essa imagem se desfazer. Herdeiro de Il Greppo, a lendária propriedade na Toscana onde nasceu o Brunello di Montalcino, vinho ícone da Itália, Jacopo leva a sério a tarefa de preservar o estilo da bebida que sua família produz desde o século 19. As origens do Brunello remontam a Ferruccio Biondi Santi, que em 1867 inscreveu o vinho de uvas do tipo sangiovese em um concurso em Londres. Na época, os especialistas torciam o nariz para o vinho italiano, considerado de segunda linha. Naquele ano, porém, a ousadia do antepassado de Jacopo Biondi Santi foi recompensada. O Brunello venceu o concurso e se estabeleceu como o equivalente italiano aos grandes châteaux franceses. (Hoje, uma garrafa do melhor vinho de Biondi Santi não sai por menos de 3 500 reais.) Desde aquele concurso, centenas de produtores da Toscana passaram a fazer versões do Brunello com diferentes níveis de qualidade -- mas a fama de inventor ainda confere aos vinhos de Santi uma aura mitológica. "Estamos no mercado há muitos, muitos anos", diz Biondi Santi. "Nosso Brunello é pura tradição."

Biondi Santi
Nome
Jacopo Biondi Santi
Quem
É Herdeiro da tradicional vinícola Il Greppo, onde nasceu o Brunello di Montalcino, e proprietário da vinícola Castello di Montepò, ambas na Toscana
Opiniões
É considerado um tradicionalista, fiel a conceitos de produção de vinho que sua família segue há gerações. Sua posição o coloca em conflito com críticos como o americano Robert Parker
Principais vinhos
Sassoaloro, Montepaone, Schidione e os Brunello di Montalcino

O sorriso aberto de Santi só é maculado à menção do homem que arranhou a reputação centenária de seu castelo: ninguém menos que o americano Robert Parker, o mais influente crítico de vinhos do planeta. Os dois protagonizam uma rixa que se tornou famosa entre os especialistas. O motivo é uma abissal diferença entre o que Parker e Santi consideram o vinho perfeito. O americano gosta de vinhos intensos e concentrados -- aqueles em que os aromas praticamente pulam da taça. Santi defende um estilo mais sutil. Para os críticos, a preferência de Parker e seu poder de influenciar os consumidores causaram uma espécie de homogeneização no estilo de vinhos produzido no mundo inteiro. Na Toscana, muitos produtores conceituados seguiram os padrões ditados por ele (são os Brunello tidos como "modernos"). Santi enfrentou Parker, ateve-se à tradição e manteve inalterado o velho jeitão de seu principal vinho. "Não podemos mudar nosso estilo, jogar fora séculos de tradição, apenas para ganhar uma nota alta de Parker", diz Santi. O resultado foi o esperado: Parker dá, seguidamente, notas baixíssimas aos vinhos de Santi. Um deles, o Brunello da safra 1985, apanhou especialmente pesado. Levou 78 pontos de um máximo de 100 -- pontuação que o colocou na lista dos vinhos considerados abaixo da crítica pelo americano. "Esse vinho nunca dará muito prazer", escreveu Parker sobre o exemplar da safra 1990. Isso mesmo. Uma garrafa que custa 3 500 reais levou nota menor que um chileno como o Casillero del Diablo, que pode ser encontrado por cerca de 25 reais e ganhou 85 pontos de Parker. O curioso é que, ao mesmo tempo, um grupo de enófilos ingleses considera o mesmo vinho odiado por Parker o melhor da Itália. "Nossos estilos são muito diferentes", diz Santi. "É como colocar lado a lado uma Ferrari e um Mercedes. São dois carros que proporcionam coisas diferentes, e compará-los não faz muito sentido, porque eles não foram projetados com os mesmos objetivos."

Longevidade

Seria ingênuo afirmar, contudo, que a vinícola de Biondi Santi fecha os olhos à modernidade. Enquanto o Brunello não mudou nada em 130 anos, outros de seus vinhos respondem aos anseios do consumidor influenciado por Robert Parker. Nos anos 90, Santi criou uma linha de vinhos concentrados, seguindo a tendência dos "supertoscanos", os vinhões feitos na Itália com jeito e uvas francesas. Mas o italiano tem dificuldade de ocultar que seu coração bate mais forte pelo Brunello, o filho favorito da casa. "O vinho tem de ser uma fotocópia do território em que é produzido, do local onde as uvas são plantadas", diz ele. "Mas estamos cientes de que há diferentes gostos e diversificamos os estilos." Por mais que invista em novidades, o forte da vinícola de Santi são seus vinhos mais antigos, que provaram ter incrível capacidade de envelhecimento. Essa característica foi posta à prova em setembro de 1994, quando sua família convidou 16 jornalistas especializados para uma degustação que reuniu 15 grandes safras de Brunello Riserva Biondi Santi. Na ocasião, o crítico inglês Nicolas Belfrage, que detém o título de Master of Wine -- distinção máxima para um sommelier --, conferiu nota 10 em 10 para a safra 1891. Após 103 anos, a bebida estava impecável.

Qual o segredo dessa longevidade? Santi acredita que boa parte da resposta está no chão em que pisa desde criança. O italiano é um devoto do terroir, termo que se refere à combinação entre clima e solo de uma área específica. Para ele, é isso que explica a magia de seus vinhos e sua capacidade de envelhecer. "O terroir faz com que as uvas se expressem de forma diferente do que fariam em qualquer outro lugar. Talvez se algum dia Parker vier nos visitar na Itália ele possa entender o que fazemos."

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