Tango: em Buenos Aires, milongas mantêm viva a chama do autêntico baile argentino, mas não são bom negócio (Carsten Koall/Getty Images)
Da Redação
Publicado em 30 de julho de 2012 às 18h56.
Buenos Aires - A cada dia em Buenos Aires, na Argentina, cerca de dez milongas mantêm viva a chama do autêntico baile de tango, mas o fenômeno, que se expande para bairros pouco tradicionais, está longe de ser um bom negócio para os organizadores.
Os altos custos, a instabilidade e a queda no interesse de turistas por causa da crise global estão entre os fatores que complicam a vida dos organizadores dos bailes, que, mesmo assim, se apegam ao costume nascido no início do século XX por puro amor ao tango.
"Antes, as milongas aconteciam sempre no mesmo lugar, preferencialmente no centro. Mas, por necessidade, devido aos altos custos, agora a moda é ir para diferentes clubes ou bares de bairro", disse à Agência Efe Silvia Dopacio, organizadora da Milonga De La Mondonguito, em um salão do bairro de Balvanera.
Silvia, integrante da Associação de Organizadores de Milongas de Buenos Aires, explicou que o preço médio da entrada de uma festa do gênero é de 30 pesos (R$ 13), enquanto o aluguel diário de um espaço para o baile custa cerca de 3.000 pesos (cerca de R$ 1.320), mas com presença de apenas cerca de cem pessoas.
"Neste momento as milongas passam por certa inércia. Não há muitos turistas, e a alta dos preços e a falta de segurança também complicam", Explica Clely Rugnone, organizadora da milonga Febril y Amante, em um clube do bairro de Liniers.
Clely confirmou que os preços obrigaram os organizadores a migrar do centro da cidade para os bairros periféricos, embora tenha esclarecido que ao chegar lá não se formam novos adeptos do tango entre os moradores do local.
As festas parecem ter um público fiel que as seguem aonde vão.
"Hoje, produzir uma milonga não é um negócio. O produtor é uma espécie de herói urbano portenho, narcisista e maravilhoso, que na prática sustenta o que para o mundo é a identidade de Buenos Aires: o tango", afirmou Silvia.
Os preços módicos, explicam no ambiente, se devem a que os "milongueiros" frequentes - aqueles que saem para dançar pelo menos uma vez por semana e somam cerca de 1.500 - não poderiam manter de outra maneira suas saídas cotidianas.
Além disso, o lucro da venda de bebidas nos bailes vão para os bolsos dos donos dos espaços, não para os produtores das milongas.
Para piorar a situação, entre amigos e dançarinos experientes que são convidados para atrair outros, quase um terço do público não paga entrada, completa Silvia, conhecida no mundo do tango como "la Mondonguito".
Nas trincheiras do tango, os organizadores históricos disparam ainda contra os forasteiros, a quem culpam de roubar-lhes frequentadores inaugurando milongas em bares e restaurantes.
"Hoje qualquer um abre uma milonga", queixam-se, diante da proliferação de bailes que, contam, pela má qualidade, começam e terminam na noite de estreia.
Segundo Víctor Hugo Patrício, organizador da milonga Lunes de Tango, em um clube do bairro de San Cristóbal, pode-se viver dos bailes, mas "é preciso se matar de trabalhar".
"No ambiente há muita concorrência e muita inveja. Tentam derrubar os bem-sucedidos", afirma.
Patrício, que está na atividade há 27 anos, diz que o segredo está em cuidar da reputação da milonga e garantir os melhores dançarinos no salão.
Os milongueiros formam um mundo muito particular, "surrealista", define a produtora Silvia.
Os homens mais velhos, que são os que dançam melhor, são rejeitados pelas mulheres na rua, mas na pista de dança elas se entregam a eles por causa de suas virtudes na dança.
Uma mulher eleva seu "status" nas milongas se um desses dançarinos de renome a tira para dançar.
"Esses homens, que não têm um tostão, porque dançam de segunda a segunda, têm muita presença nos bailes, onde se tornam personagens famosos. E todo organizador quer tê-los em sua milonga", conta "a Mondonguito".