Galinha Pintadinha em fase de crescimento
Como Juliano Prado e Marcos Luporini fizeram da Galinha Pintadinha - um personagem adorado pela criançada - a base de um negócio em expansão
Da Redação
Publicado em 18 de outubro de 2012 às 06h00.
São Paulo - Faz sol e são quase 5 da tarde de um sábado em Brasília. A atmosfera do ginásio Nilson Nelson é típica dos grandes eventos. Em frente aos portões, cambistas oferecem ingressos. Camelôs vendem canecas, galinhas de pelúcia e adesivos com os dizeres:"Show da Galinha Pintadinha — eu fui!"
Para entrar na arena que já recebeu celebridades como Rihanna e Roberto Carlos, crianças e seus pais formam longas filas. O público estimado pelos organizadores é de 15.000 pessoas. Com algum atraso, o show começa, e ela, a grande estrela, finalmente surge no palco — a cerúlea Galinha Pintadinha. Flashes fotográficos espocam freneticamente. A galinha é ovacionada. Não se sabe quem grita mais — crianças ou adultos. Como bem disse um funcionário do evento: "Ê galinhazinha para juntar gente, hein?"
A Galinha Pintadinha e Sua Turma é um grupo de personagens infantis criado pelos empreendedores Marcos Luporini, de 42 anos, e Juliano Prado, de 41, com base em músicas populares conhecidas por várias gerações. Nos shows, artistas se fantasiam para interpretar a galinha e seu marido, o Galo Carijó.
Eles comandam um monte de pintinhos e seus amigos, como o Sapo e a Dona Baratinha. A turma atrai uma multidão de pessoas pequenininhas com enorme poder de consumo. Desde o primeiro lançamento, em 2008, foi vendido mais de 1 milhão de DVDs com músicas do cancioneiro brasileiro, acompanhadas de animações coloridas.
Os vídeos com uma parte dos números postados no canal oficial do personagem no YouTube tiveram mais de 520 milhões de acessos. "As crianças gostam de assistir várias vezes à mesma coisa", diz Prado, fundador da Bromélia, da cidade paulista de Campinas, empresa dona da marca Galinha Pintadinha.
A Bromélia também fatura com shows, publicidade digital, aplicativos para celular e licenciamento de 200 produtos, como piscininhas de plástico, escovas e pastas de dentes e galinhas de pelúcia. Embora a Bromélia não divulgue suas receitas, estimativas do mercado apontam para mais de 6 milhões de reais em 2012.
São números que fazem da Galinha Pintadinha uma marca forte no mercado da primeira infância, que abrange desde bebês que nem sequer sabem cantar as músicas até crianças da pré-escola. “É a melhor coisa que já inventaram”, diz Nayara Jardim, de 25 anos. Seu filho Victor tem 9 meses. “Ele vive fazendo ‘da-dá’ para pedir o vídeo da galinha. São 40 minutos de paz”, diz Nayara.
Embora a Galinha Pintadinha tenha dado origem a vários produtos, a criação original é bem singela. Consiste num DVD com músicas infantis de domínio público, como Marcha Soldado e Atirei o Pau no Gato, gravadas com novos arranjos, e animações com pintinhos, borboletas, pombos e a protagonista, a galinha azul.
Não há um enredo como num desenho animado. É uma espécie de clipe, em que a letra das músicas em muitos momentos conduz a ação. Há números bem nonsense, como uma banda de baratinhas intitulada As Naftalinas. "Não esperava todo esse sucesso", diz Luporini.
Para Cecília Russo, da consultoria Troiano, especializada em marcas, foi a simplicidade e a ingenuidade da ideia que permitiram essa grande aceitação. "Uma marca infantil precisa conquistar dois públicos: as crianças e seus pais", diz Cecília. "As músicas antigas despertam nostalgia nos adultos, e os bonecos são uma representação de família de fácil entendimento para crianças pequenas."
Luporini é músico formado em música popular pela Unicamp. Ele toca violão, piano, baixo e guitarra. “Sempre gostei de criar novos arranjos para músicas infantis”, diz ele. Com algumas músicas em mãos, procurou Prado, seu colega numa banda amadora. "Ele conhecia produção multimídia e poderia criar animações divertidas", diz Luporini.
“Queríamos fazer algo legal. Talvez um CD-ROM.” Os dois escreveram um roteiro e contrataram um animador e uma cantora. “Eles participaram porque acharam a ideia do projeto boa, pois só podíamos pagar cachês baixíssimos”, diz Prado.
Quando o primeiro clipe ficou pronto, em 2006, os dois tentaram vendê-lo como protótipo de um programa infantil para a TV. Receberam vários nãos. Certa vez, não puderam comparecer a uma reunião e publicaram um clipe no YouTube para que pudesse ser assistido a distância. Ouviram outra recusa e se esqueceram de retirar o vídeo da internet.
Seis meses depois, surpreenderam-se com a quantidade de acessos: 500.000. Decidiram então criar animações para outras músicas infantis, juntá-las num DVD e produzi-lo por conta própria. Dois anos depois, Prado e Luporini fabricaram um lote de 800 DVDs para vender pela internet. As cópias esgotaram-se em três meses. Outros lotes foram editados. Depois, eles lançaram um aplicativo para celular que permitia comprar os clipes individualmente.
Em 2009, a distribuição do primeiro DVD passou a ser feita pela Europa Filmes. Os seguintes receberam o selo da Som Livre. Com o terceiro, lançado em julho, a Galinha Pintadinha entrou na lista dos títulos mais vendidos da gravadora. O sucesso também ajudou a impulsionar as vendas dos discos anteriores. Hoje, a Galinha Pintadinha ultrapassou a marca de 1 milhão de exemplares. "É um número alto, pois enfrentamos a concorrência dos piratas", diz Prado.
Um desafio é combater a pirataria, presente em todas as fontes de receita. "A quantidade de falsificações é, muitas vezes, o principal indício da fama de uma marca", diz Cecília. Surgiram trupes que se autointitulam A Galinha Pintadinha e Sua Turma."Elas se apresentavam pelo Brasil antes que tivéssemos tido tempo de organizar nossa própria turnê", diz Prado.
Em outubro do ano passado, a Bromélia produziu um espetáculo itinerante, que pode ser contratado por produtores que querem organizar o evento em sua cidade. O grupo, composto de oito artistas, já passou por 17 estados. Nos eventos da Galinha Pintadinha e no material de divulgação, a palavra oficial é repetida à exaustão.
A Bromélia contratou dois escritórios de advocacia que monitoram o mercado e interpelam empresas que se apropriam do selo. "Até achamos bacana quando fazem doces caseiros com os personagens ou costureiras fazem chapéus e gorros da galinha", diz Prado. "Mas não podemos perder o controle da marca no grande mercado."
A pirataria precisa ser controlada para não minar o licenciamento de produtos, iniciado em janeiro de 2011. Trata-se de um caminho de expansão já trilhado, com êxito, por grandes empresas de entretenimento. Já foram licenciados cerca de 200 produtos, como enfeites de festa e jogos. "A maior parte da receita nos próximos anos deve vir daí", diz Prado. Se der certo, serão mais ovos de ouro postos pela simpática galinha.