Estudo do Ipea propõe crédito a juro zero às PMEs para PIB crescer de novo
Instituto publicou, nesta terça-feira, íntegra das 33 propostas para a retomada econômica apresentadas ao ministro Paulo Guedes no último final de semana
Carolina Ingizza
Publicado em 22 de julho de 2020 às 18h25.
Última atualização em 22 de julho de 2020 às 18h57.
As micro, pequenas e médias empresas foram duramente afetadas pela crise causada pela pandemia do novo coronavírus no Brasil. Sem estrutura de caixa para aguentar muitos dias sem receita e presentes em setores duramente impactados pelo isolamento social, como bares, restaurantes e comércio varejista, um quarto dessas empresas corre o risco de fechar de vez, segundo o Sebrae.Por esse motivo, discutir a retomada econômica do país é, também, discutir o apoio a esses negócios.
As microempresas e as empresas de pequeno porte são vitais para a economia. Juntas, elas representam 96,6% dos negócios e contribuem para cerca de 30% do produto interno bruto (PIB) brasileiro. Além disso, elas são responsáveis pela maioria (52%) dos empregos formais. Em 2019, enquanto as médias e grandes empresas fecharam 88.000 postos de trabalho, as micro e pequenas empresas abriram 731.000 vagas, de acordo com uma análise do Sebrae feita com base em dados do Ministério da Economia.
“A retomada seguramente depende do forte apoio a micro e pequenas empresas”, afirma André Rauen, diretor do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada ( Ipea ). Nesta terça-feira, 22, o instituto tornou público seu plano de retomada econômica para o Brasil pós covid-19. Ao todo, 33 propostas foram apresentadas ao ministro Paulo Guedes no último final de semana. Entre elas, estão sugestões de programas para apoiar a atividade produtiva de pequenas empresas e startups .
Crédito sem juros
O relatório do Ipea defende que o Brasil ofereça crédito subsidiado para as micro e pequenas empresas (MPEs). A proposta do instituto é que seja criada uma linha com juros iguais a zero e carência de um ano, com o crédito condicionado à manutenção dos empregos por um período de até seis meses após fim do isolamento social.
“Os bancos ficam temerosos em dar crédito sem garantias. Nossos técnicos propõem resolver isso vinculando o crédito ao faturamento ou renda futura da empresa”, diz Rauen. A ideia é que a empresa comece a pagar o empréstimo um ano depois, com uma parcela de até 5% do faturamento da companhia. Ao associar o pagamento ao imposto de renda, o instituto espera uma inadimplência menor. Para evitar que o empresário feche a empresa para se esquivar das parcelas, o crédito ficaria vinculado também ao CPF do proprietário.
Bancos, fintechs, cooperativas e agências de desenvolvimento seriam remunerados com 1,5% do valor concedido. Para funcionar, o Ipea defende uma análise de risco simplificada, com o Tesouro Nacional garantindo a inadimplência. O programa poderia ser financiado por meio da emissão de títulos públicos, que seriam resgatados nas datas das amortizações dos empréstimos.
A proposta é que as empresas de setores mais afetados pela crise, como artesanato, beleza e construção civil consigam empréstimos maiores no mercado que aquelas empresas de segmentos menos afetados. Estima-se que o Tesouro teria de desembolsar de 274,4 bilhões a 685,8 bilhões de reais para o programa, com parte do dinheiro recuperado após a amortização dos créditos.
Compras públicas de PMEs e startups
O Ipea incentiva também que os governos criem mecanismos para favorecer micro e pequenas empresas nas compras públicas. Hoje, somente 14% do valor empenhado nas compras públicas federais está vinculado a MPEs.
A proposta do instituto é que haja maior subdivisão de itens de compra, de modo a haver mais itens que possam ser atendidos por essas empresas, bem como a criação de itens exclusivos para MPEs. Além disso, a proposta defende uma simplificação da documentação exigida e um apoio técnico do Sebrae para auxiliar essas empresas a fornecer serviços e produtos ao governo.
Em outra frente, o Ipea propõe que o governo crie um marketplace para credenciar os fornecedores. Assim, as unidades compradoras nos níveis federais, estaduais e municipais poderão fazer cotações com as diferentes empresas cadastradas. Países como Chile, Itália, Ucrânia e Dinamarca adotaram soluções similares a essa nos últimos anos.
Especificamente no setor da Saúde, o instituto propõe um investimento direcionado nas startups que desenvolvem tecnologias que possam ser aproveitadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS). “Há diferentes formas de fazer isso. Uma delas é por meio de desafios em que se premia a startup com a melhor capacidade tecnológica”, diz Rauen. Além disso, as empresas com protótipos em fase avançadas poderiam se tornar fornecedoras do SUS.
Para o pesquisador, essa é uma forma eficiente de não depender de tecnologia importada e promover o investimento em pesquisas com risco tecnológico. De acordo com ele, garantir uma capacidade tecnológica nacional é essencial para o futuro do país, principalmente considerando a possibilidade de novas pandemias. “O SUS tem muito poder de compra, podemos usar esse poder para alavancar as startups de saúde”, afirma o diretor do Ipea.