Cristiano Nunes e Igor Macedo, proprietários do Garagem Pompeia Bar: dos MEIs formalizados, 45% têm sua residência como local de trabalho (Ricardo Yoithi Matsukawa/ME/Jornal de Negócios do Sebrae/SP)
Mariana Fonseca
Publicado em 30 de agosto de 2018 às 06h00.
Última atualização em 30 de agosto de 2018 às 06h00.
As histórias de quem abre um negócio na garagem costumam ser parecidas: é o desempregado que começou a empreender em casa para evitar o custo alto de um aluguel; é quem já alugava o local e, ao receber o espaço de volta, viu uma oportunidade para começar o seu; ou quem enxergou na vizinhança uma demanda reprimida. Seja qual for a motivação, o fato é que muita gente tem optado por iniciar uma empresa dentro de casa.
Dos mais de sete milhões de Microempreendedores Individuais formalizados no Brasil, 45% têm sua residência como local de trabalho. A casa foi o ponto de partida para o negócio dos empresários Igor Macedo e Cristiano Zimmer quando decidiram abrir um hostel, em 2013, numa rua do bairro da Pompeia, na capital paulista. Mas foi na garagem que enxergaram a grande oportunidade que hoje é a principal atividade do professor de inglês Zimmer e do engenheiro Macedo.
O bar que funcionava dentro do hostel começou a ficar conhecido, sendo elogiado pelos hóspedes e logo se tornou maior que o hostel. Assim nasceu o Garagem da Pompeia Bar, que ocupa toda a garagem do imóvel e, no futuro, deve ser ampliado para dentro da casa. “Não imaginava que seria assim, mas o bar deu muito certo e decidimos investir nele, que virou nosso negócio principal. Já nos mudamos da casa e o próximo passo é ampliar o bar, ocupando também outros espaços da residência”, afirma Macedo.
Para ele, a principal vantagem de manter um negócio na garagem é a economia com o custo do aluguel, que costuma pesar muito no orçamento de uma empresa. “Além disso, podemos ter o privilégio de ter os vizinhos como os primeiros clientes e também nos dedicar mais ao negócio por estarmos próximos a ele o tempo todo”, acrescenta o empreendedor.
A tendência desse modelo permitiu a interação com negócios correlatos, isto é, aqueles que fornecem para empresas de garagem. É o caso do segmento em que atua Eduardo Zanardo, um dos sócios da FC Gôndolas. A empresa produz prateleiras, gôndolas e estruturas pré-moldadas para montagem de mercados, padarias, lanchonetes, entre outros estabelecimentos.
Ele percebeu a grande procura por estruturas menores para negócios de garagem e decidiu apostar no nicho. “Tivemos de adaptar nossa produção com estruturas menores e mais leves para garagens, que são 40% mais baratas que as tradicionais. Já começamos montando, em média, 40 lojas por mês e a grande maioria delas é de pequeno porte e dentro de casa, como mercadinhos, loja de doces e farmácias. Estávamos acostumados com estruturas que custam na faixa de R$ 20 mil, agora já fornecemos os kits de montagem de pequenas lojas começando com R$ 3 mil”, afirma o empresário.
As maiores demandas da FC Gôndolas, que fica em Itaquaquecetuba, mas atende todo o estado de São Paulo, são de empreendedores que montam lojas de doce, pet shops, mercadinhos, lojas de R$ 1,99, lanchonetes e até pequenas farmácias de bairro.
“Esse público de pequenas empresas já representa 60% da nossa receita atual. São negócios geralmente instalados em espaços de quatro metros quadrados e eles crescem a cada dia”, completa Zanardo.
Ao definir o negócio que irá montar, é importante que o empreendedor ofereça uma proposta de valor clara e alinhada ao que esperam os consumidores, diz o gerente do Escritório Regional Centro, do Sebrae-SP, Alexandre Robazza. “A proposta de valor nada mais é do que o diferencial da empresa em relação aos concorrentes, o que vai permitir ao empresário operar com melhores margens”, afirma.
Robazza também ressalta a importância de o empreendedor entender e conseguir dar atenção especial à gestão da oferta, capaz de fazer toda a diferença na vida da empresa. “Isso envolve cuidar das compras, do estoque e dos preços. O primeiro passo para o fracasso das empresas, especialmente de varejo, é comprar errado, seja no tipo de produtos ou a quantidade errada, não controlar o estoque e não saber aplicar o preço correto de venda, porque esses aspectos afetam diretamente e rapidamente o caixa da empresa e, portanto, comprometem sua saúde financeira”, completa Robazza.
Para quem deseja seguir os passos da dupla do Garagem da Pompeia, o empresário Macedo dá um conselho. “Abrir um negócio em casa é vantajoso, mas também tem os percalços que podem confundir com sua vida financeira, pessoal e profissional. Você precisa ter horários estabelecidos e separar o local de trabalho de onde você descansa. Montar o bar foi a melhor coisa que fiz na vida, foi o meu primeiro negócio e a experiência tem muito mais pontos positivos do que negativos”, destaca.
Se houver uma oportunidade de negócio e identificada a existência de clientes para consumir aquele produto, vale a pena aproveitar. Verifique os produtos e serviços que as pessoas estão preferindo comprar, estude a possibilidade de comércio eletrônico, que cresce a cada dia, mas sempre com planejamento. É o profissionalismo que vai determinar o bom andamento do empreendimento.
Atitude empreendedora e planejamento: abrir um empreendimento na garagem, além dos cuidados comuns que qualquer empresa exige, necessita uma dose extra de disciplina para fazer funcionar. Primeiro, separe a vida da casa da do trabalho. Isso requer um espaço reservado para o trabalho e todo o cuidado para não se distrair com as coisas domésticas. Quanto mais organização, melhor. O ambiente tem de ser arrumado como local de trabalho, sem objetos ou móveis estranhos à atividade. Caso receba clientes ou fornecedores, o ideal é ter uma entrada independente.
Disciplina: faz muita diferença quando se monta o negócio onde mora. É preciso ter uma rotina com início, tempo para almoço e fim de jornada. O horário comercial deve ser obedecido, pois é nesse período que as relações profissionais se desenvolvem. O empresário deve vestir-se de acordo; bermuda e chinelo durante o expediente não combinam. Tem de entrar no clima da cabeça aos pés literalmente. E importante: não é porque residência e empresa estão fisicamente no mesmo lugar que o dinheiro de ambas se mistura. Separar as finanças é primordial para a saúde do negócio e da vida pessoal.
Setores mais indicados para atuar: alimentação e artesanato são bem frequentes porque geralmente as ferramentas utilizadas são fáceis de ter em casa. Outros negócios, como e-commerce, intermediação de negócios (corretor, representação comercial), que precisam apenas de um telefone e computador, também são frequentes. Evite negócios que exijam linha de produção, que façam barulho, cheiro, que usem produtos químicos, que tenham muita movimentação de gente, porque isso vai interferir na vida dos moradores da casa e dos vizinhos.
Legislação: antes de dar o pontapé inicial, verifique se o zoneamento permite exercer a atividade naquele local, se há outras restrições legais ou condicionantes.
O que não pode faltar: passada essa etapa de permissões, vem a instalação. O espaço da empresa não pode ser invadido pela movimentação dos moradores, nem interferir nos hábitos deles. Privacidade é a chave. Nada de trabalhar com as crianças brincando em volta, outros familiares cuidando de afazeres domésticos e rádio ou TV ligados. Pega mal atender o telefone (que deve ser só da empresa) com uma trilha sonora de falatório, risadas, choro de bebê, cachorro latindo, tão comuns ao dia a dia de uma residência. Disciplina, planejamento, entendimento do papel na família e na empresa são regras básicas desse negócio.
Vantagens
- Redução de custos com aluguel, transporte e alimentação na
rua.
- Possibilidade de escolher os horários de trabalho.
- Estar mais próximo à família para almoçar e jantar, com ganhos
para a qualidade de vida.
Desvantagens
- Risco de misturar vida doméstica e trabalho, principalmente em
relação às contas.
- Falta de disciplina com horários e compromissos.
- Espaço inadequado para receber clientes e fornecedores, assim
como para armazenar produtos.
- Pode ser solitário para quem gosta de interagir com colegas.