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Investidores põem dinheiro e muito mais em pequenas empresas

Cinco empreendedores contam como, além de recursos, atraíram talentos, clientes e novas oportunidades

Ricardo Rinkevicius, dono da Brasvending (Daniela Toviansky)
DR

Da Redação

Publicado em 17 de março de 2011 às 08h00.

O negócio do empreendedor Ricardo Rinkevicius, de 46 anos, é servir cafezinhos, sanduíches e refrigerantes aos funcionários de grandes companhias, como o banco Santander, a cervejaria Ambev e a Telefônica. Rinkevicius é dono da Brasvending, que mantém mais de 15 000 máquinas de venda automática de bebidas e guloseimas espalhadas pelo país.

Há pouco mais de um ano, o empresário deparou-se com uma questão importante para o futuro da Brasvending: onde buscar recursos para comprar um concorrente? “No meu negócio, as margens são muito baixas”, diz ele. “É preciso ter escala.”

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Uma das opções era tomar um empréstimo bancário usando linhas de crédito de longo prazo. Outra era vender uma participação na empresa para o fundo de investimento DGF, com o qual Rinkevicius já vinha negociando, e usar o dinheiro para levar adiante a aquisição que ele planejava fazer. Centavo por centavo, qual a melhor alternativa?

Rinkevicius escolheu a segunda e passou a ter um fundo como sócio. Pesou em sua decisão o apoio que os gestores do DGF se comprometeram a dar a ele na negociação com o concorrente, a paulista DAB.

Não era a primeira vez que Rinkevicius comprava outra empresa, mas, até então, ele ainda não tinha se metido com ninguém de seu tamanho — as receitas da DAB estavam na faixa dos 60 milhões de reais ao ano, o mesmo patamar de faturamento da Brasvending.

“Era a primeira vez que eu fazia um negócio desse porte, e a operação financeira estava ficando muito complexa”, diz ele. “Escolhi a fonte de recursos que, além do dinheiro, trouxe o conhecimento de que eu precisava para fechar o negócio.”

O caso da Brasvending é um exemplo de uma situação que muitas pequenas e médias empresas com grande potencial de crescimento começam a viver no Brasil. Para empreendedores como Rinkevicius, trazer recursos de fora do negócio já não é apenas uma questão que envolve aspectos financeiros, como os juros da operação, o valor da empresa ou as garantias que o empreendedor precisa oferecer — o dinheiro mais valioso é aquele que traz algo a mais para aumentar a velocidade de expansão.

“Mais do que colocar capital no negócio, os investidores podem ajudar os empreendedores a enfrentar os desafios do crescimento”, diz Luis Arjona, sócio da consultoria Bain&Company. “Mas, para cada estágio de desenvolvimento de uma pequena ou média empresa, há uma fonte de recursos mais adequada às necessidades.”


Um cenário como esse só é possível hoje em dia porque poucas vezes houve tantos recursos disponíveis para financiar o crescimento de pequenas e médias empresas brasileiras. As chamadas PMEs tornaram-se estrelas, sobretudo por seu potencial de crescimento futuro. Vamos aos números.

• Os fundos de capital de risco têm um total de 36 bilhões de dólares para investir em empresas brasileiras — montante que cresceu 43% ao ano entre 2005 e 2009, de acordo com um estudo recente da Fundação Getulio Vargas.
Dos 6,1 bilhões de dólares investidos em 2009, 46% foram aplicados por fundos de venture capital — que preferencialmente investem em pequenos e médios negócios com potencial de crescimento — ou de capital semente, que põem dinheiro em empresas que estão em seus estágios iniciais.
• As agências de fomento vêm lançando mais linhas de crédito e de recursos a fundo perdido para pequenos negócios. Só o Prime, da Finep, fundação ligada ao Ministério da Ciência e Tecnologia, deve conceder até 430 milhões de reais em financiamentos não reembolsáveis para empresas nascentes nos próximos anos. Parte desse dinheiro deve ser liberada pela Finep ainda em 2010.
• Há cada vez mais empresas comprando participações em outros negócios. Mercados inteiros vêm se consolidando. De acordo com um levantamento feito pela consultoria PricewaterhouseCoopers, o número de fusões e  aquisições no Brasil aumentou 22% em 2010 — e a tendência é que o volume de negócios continue aumentando.
“A procura por as­sessoria em fusões e aquisições subiu muito nos últimos meses”, diz Rogério Villa, da consultoria Ernst&Young Terco. “Quase metade dos casos que chegam a nós envolve pequenas e médias empresas.”
• Existe novamente a expectativa de que o mercado de capitais se abra para empresas emergentes. A BM&F Bovespa espera que, até o fim do ano, pelo menos seis companhias levantem dinheiro abrindo o capital no Bovespa Mais, no que pode ser uma espécie de reinauguração do pedaço da bolsa de valores voltado para emissões de até 100 milhões de reais em ações .
Na Brasvending, junto com o dinheiro veio a experiência dos gestores do fundo de investimento, que ajudaram Rinkevicius a planejar como a empresa poderia comprar um concorrente sem que a operação pudesse pôr o negócio em risco ou ser prejudicial a ele — evitando, por exemplo, problemas no fluxo de caixa que a Brasvending poderia apresentar após a negociação.
Rinkevicius foi aconselhado pelo pessoal do fundo a dar uma entrada de 20% do valor total do negócio, dividindo o restante em parcelas que poderiam ser quitadas com a geração de caixa da própria empresa adquirida.
“Sem a ajuda dos gestores, o negócio poderia ficar muito complicado”, diz ele. “Uma empresa pode até quebrar por causa de uma aquisição mal planejada.” Com a compra da DAB, há cerca de um ano, a Brasvending — que Rinkevicius fundou há 15 anos, após conhecer as máquinas de venda automática durante uma temporada de estudos nos Estados Unidos — dobrou de tamanho.
“Sozinhos, levaríamos até cinco anos para chegar ao tamanho das duas empresas juntas”, afirma Rinkevicius.

Muitas vezes, a chegada de sócios e investidores traz para o negócio uma visão mais clara de qual é realmente seu potencial de crescimento — algo que nem todo empreendedor sabe ao certo.
É bastante comum encontrar negócios que por anos enfrentam graves entraves ao crescimento sem que os donos saibam o que fazer para aproveitar oportunidades que passam despercebidas. “Às vezes, o dono da empresa não consegue tomar sozinho a decisão de mudar o foco dos negócios ou alterar o jeito de trabalhar para dar um novo impulso à expansão”, afirma Luis Arjona, da Bain.
Isso acontece bastante com empreendedores de perfil muito técnico, que sabem tudo sobre suas áreas de atuação, mas não tanto sobre como funcionam seus mercados.
Em alguns casos, faltam aos pequenos e médios empresários bons contatos na agenda, daqueles capazes de abrir portas para levar o negócio a novos mercados. Não faz muito tempo, esse era um dos obstáculos para o crescimento da APS, de Porto Alegre. Até o ano passado, a empresa tinha dificuldade para sair das fronteiras do sul do Brasil, onde se concentrava a maior parte de sua clientela.
O negócio da APS é descobrir onde é possível economizar energia para seus clientes, modificando projetos de iluminação, alterando a instalação do ar-condicionado ou trocando peças e equipamentos que consomem muita eletricidade. Em 2010, a empresa faturou 15 milhões de reais atendendo grandes indústrias no Rio Grande do Sul, como a siderúrgica Gerdau.
“É muito difícil cruzar as divisas de nosso território”, diz o engenheiro Aldemir Spohr, de 47 anos, fundador da APS. “Conheço muita gente da área técnica das grandes empresas, mas bem poucos executivos, que têm autoridade para fechar negócios.”
Isso começou a mudar em junho do ano passado, quando Spohr vendeu 20% da APS para o DGF. Com a ajuda do fundo, Spohr conseguiu contato com executivos da Light, a concessionária de energia carioca. O encontro resultou num dos principais contratos da empresa assinados recentemente. Para atender a Light, a APS inaugurou uma unidade no Rio de Janeiro — o que deve ajudar a prospectar clientes na cidade.
Os contatos do fundo também estão ajudando a APS a conquistar clientes entre os shopping centers, mercado que era praticamente ignorado pela empresa. “Estamos prestes a fechar contrato com uma grande administradora de shoppings”, diz Spohr.
Trata-se de um setor estratégico para os planos de expansão da APS — até 2014, mais de 2 bilhões de reais devem ser investidos na construção de novos shoppings, e seus administradores procuram desesperadamente por empresas que os ajudem a diminuir a conta de energia, que chega a representar 45% de seus custos.

Não quer dizer que compartilhar o comando da empresa com um sócio ou investidor seja sempre uma experiência agradável. Empreendedores precisam ter muita clareza sobre o tipo de situação que podem ter de enfrentar ao decidir seguir por esse caminho. Em quase toda sociedade, existe o desafio constante do equilíbrio de forças.
É preciso paciência para administrar os conflitos, que inevitavelmente vão surgir. É fundamental manter a disciplina para prestar contas periodicamente. E, principalmente, é necessário ter disposição para dividir o poder — algo nem sempre fácil de fazer para quem se acostumou,  ao longo dos anos, a ser o único dono do pedaço.
A contrapartida de tudo isso é trazer para a empresa, junto com o capital dos investidores, ingredientes importantes para permitir que os negócios cresçam a uma velocidade muito maior do que se o seu empreendedor continuasse sozinho.
“Há muitas vantagens em associar o próprio negócio a investidores ou a empresas mais consolidadas”, diz Yves Jadoul, da V2Finance, consultoria especializada em finanças e avaliação de empresas. “Quem tem um bom sócio acaba sendo mais valorizado pelo mercado.”
A fabricante de ferramentas Famastil, de Gramado, no Rio Grande do Sul, encontrou num sócio o apoio de que precisava para voltar a crescer. Até alguns anos atrás, a empresa tinha dificuldade para negociar diretamente com varejistas — 70% de suas receitas vinham das vendas para atacadistas, que a cada negociação a pressionavam para obter menores preços, corroendo a rentabilidade do negócio.
Faltavam à Famastil uma linha de produtos mais completa — exigência que cada vez mais varejistas faziam — e um canal que lhe permitisse chegar diretamente ao varejo. “Nossa linha de produtos era pequena”, diz o gaúcho Giuliano Tissot, de 36 anos, sócio da Famastil. “Ocorre que não tínhamos recursos suficientes para investir na produção de novas ferramentas, e a baixa rentabilidade das vendas no atacado só piorava a situação.”
Tissot faz parte da terceira geração da família que fundou a Famastil na Serra Gaúcha no começo dos anos 50. Em 2004, os Tissot decidiram aceitar uma proposta para vender 35% do negócio. O comprador foi a gaúcha Taurus, mais conhecida pela fabricação de armas, que estava à procura de um sócio capaz de administrar sua unidade de ferramentas.
“Era tudo o que precisávamos para voltar a crescer”, afirma Giuliano. Além do dinheiro com a venda de um pedaço do negócio, a associação com a Taurus permitiu à Famastil complementar rapidamente sua linha de produtos — e, com isso, construir uma carteira de clientes formada em maior parte pelos varejistas para os quais a empresa queria vender.

Desde que fechou negócio com a Taurus, a Famastil dobrou suas receitas, que chegaram a 118,2 milhões de reais no ano passado. A Famastil Taurus, hoje, mantém seus produtos em 10 000 pontos de venda, cinco vezes mais do que antes da aquisição. Agora, o varejo responde por 80% de suas vendas.
Abrir novas oportunidades e conquistar mais clientes são alguns dos benefícios mais evidentes que costumam vir junto com o dinheiro que os investidores aplicam numa pequena ou média empresa. Mas talvez poucos aspectos de um negócio tenham tanto a ganhar quanto a capacidade de atrair profissionais talentosos — principalmente num mercado em que mão de obra de boa qualidade fica cada vez mais rara e cara.
A necessidade de encontrar bons profissionais para crescer no mercado paulista foi um dos motivos que levaram o mineiro Romeu Scarioli Jr., de 37 anos, a buscar um novo sócio. Ele é dono da Tecnoloc, de Belo Horizonte, que faturou 15 milhões de reais no ano passado com aluguel e manutenção de equipamentos como máquinas de solda, geradores elétricos, compressores e torres de iluminação.
“Para fazer negócios em São Pau­lo, teríamos de contratar e treinar técnicos”, diz Scarioli. “Seria preciso deslocar funcionários de Belo Horizonte para selecionar e treinar o pessoal da filial paulista, o que tomaria tempo e custaria caro.”
No final do ano passado, Scarioli procurou os donos de uma pequena empresa paulistana, a Soldep, e propôs a eles uma fusão — que também é uma forma de obter recursos para crescer, embora nem sempre envolva dinheiro na negociação. “Eu disse a eles que, juntos, cresceríamos em três anos o que eles levariam até 15 anos para conseguir sozinhos”, afirma Scarioli.
Os empreendedores Ricardo Reyes, de 33 anos, e Edison Cortês, de 44, que haviam fundado a Soldep em 2009 depois de trabalhar numa multinacional do setor de energia, aceitaram a proposta. Na negociação, Scarioli ficou com 70% do negócio. O restante é de Reyes e Cortês.
Desde então, a nova empresa já conquistou grandes clientes, como a siderúrgica Bardella e a multinacional Thyssen Krupp. Neste ano, a Soldep Tecnoloc deve faturar 6 milhões de reais.

Nas empresas que ainda estão em seus estágios iniciais, o dinheiro traz consigo um ingrediente fundamental para o crescimento — a segurança de que o empreendedor precisa para não se desviar do foco.
Muitas vezes, os donos de pequenos negócios precisam deixar de lado projetos promissores, mas que ainda não estão prontos para ser levados ao mercado e trazer receitas, para se dedicar a algum tipo de atividade secundária capaz de gerar um resultado mais imediato.
Até recentemente, essa era a situação do paulista Fernando Pereira Cândido, de 41 anos. Ele é fundador da Retail Gas Station, empresa que produz sistemas de controle de abastecimento de veículos e que promete pôr fim a uma dor de cabeça típica de quem precisa administrar grandes frotas de veículos: as fraudes que muitas vezes acontecem na hora de o motorista encher o tanque em postos de combustíveis.
“Enquanto o sistema era desenvolvido, tive de arranjar alguma fonte de receitas para sustentar a empresa”, diz Cândido. Ele começou, então, a vender softwares para postos de combustíveis.
Com os 120 000 reais que recebeu da Finep — dinheiro que não precisará ser reembolsado —, Cândido pôde voltar ao plano de negócios original. O dinheiro foi usado para bancar o pró-labore dele e do sócio, o paulista José Reginato, de 61 anos, o salário de um diretor financeiro e o contrato com uma consultoria de marketing e estratégia.
No início deste ano, Cândido fechou os primeiros negócios com seu sistema antifraude com duas transportadoras. “Mostrar que recebemos dinheiro numa seleção de planos de negócios pela Finep, e não num banco qualquer, ajudou a chamar a atenção desses clientes”, diz Cândido. Com os novos contratos, as receitas da Retail Gas Station devem chegar a 4 milhões de reais em 2011.
A chancela da Finep também chamou a atenção de um investidor, a empresa paulistana de participações ECG, que, no final no ano passado, comprou 20% da Retail Gas Station. “Os novos recursos ajudaram a acelerar ainda mais nossa entrada no mercado”, diz Cândido.
Agora, com um investidor, começa um novo ciclo na Retail Gas Station, com mais investimentos no negócio — e tudo mais que o dinheiro pode trazer de bom para uma pequena ou média empresa.
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