Letícia Canesin, proprietária da loja de calçados Malulê: na loja, as lives de vendas entraram na rotina semanal (Clip Comunicação & Marketing/Sebrae/SP)
Carolina Ingizza
Publicado em 6 de fevereiro de 2021 às 08h00.
Transmissões online de shows, entrevistas, debates e eventos. O ano de 2020 ficou marcado pela quantidade de lives estimuladas pelo distanciamento social decorrente da pandemia de covid-19. E uma prática que já era comum em outros países, como a China, começou a se popularizar por aqui também: a live de vendas.
Com o crescimento das transações online e das transmissões pela internet, as empresas uniram os dois modelos para buscar uma aproximação com o consumidor e não deixar o faturamento cair. O consultor do Sebrae-SP Edgard Neto destaca que a live de vendas já é uma realidade do varejo mundial e deve ser ainda mais explorada e fortalecida no processo de vendas de qualquer tipo de negócio do varejo.
Basicamente, o modelo de vendas é simples: fazer uma transmissão ao vivo nas redes sociais, com destaque para o Instagram, para mostrar produtos e coleções, anunciar ofertas e fechar vendas em tempo real. Essa tendência segue o número cada vez maior de empresas que passaram a vender pela internet em 2020.
De acordo com a pesquisa do Sebrae sobre o impacto da pandemia do coronavírus nos pequenos negócios, a proporção de empresas que comercializam produtos e serviços online subiu de 54% para 70% entre junho e novembro. O Instagram aparece como a segunda plataforma mais usada, com 54%, atrás apenas do WhatsApp, com 84%. O Facebook é usado por 51% dos empresários.
A empresária Leticia Verri Canesin aderiu ao modelo das lives em julho para fazer a tradicional liquidação da sua loja, Malulê Calçados, de Sertãozinho. “Tivemos quase 4 mil visualizações e um grande volume de vendas. Fazíamos live todas as quartas-feiras e, em todas, obtivemos como resultado aproximação: de nossas clientes e, claro, vendas”, relata.
Desde então, a Malulê não parou mais e planeja seguir com as transmissões para apresentação de produtos e coleções. “Muita gente se acostumou com o formato e por que não aproveitar para ser mais um canal de contato com nossas clientes? Se não gera venda, gera relacionamento. Tudo é válido”, destaca Leticia.
A Malulê existe desde 1983, quando a mãe de Leticia, Mercedes, deixou a carreira de professora de biologia para fixar residência em Sertãozinho e criar os filhos. Com a loja fechada no início da pandemia, as vendas pelo WhatsApp cresceram e motivaram o investimento do site. Uma vez que todos os produtos foram cadastrados na página, o atendimento online ficou mais fácil, porque a equipe não precisava mais tirar fotos de tudo, toda hora. Bastava fazer um filtro no site e enviar ao cliente.
Atualmente, as vendas pelas redes sociais são responsáveis por 80% do faturamento da Malulê. “A ideia das lives surgiu da necessidade de se aproximar do cliente, uma vez que a loja estava fechada, e não víamos nossas clientes. E também precisávamos de alguma forma vender mesmo fechados”, conta a empreendedora.
Antes de começar a transmissão, a empresa segue um planejamento: separação dos produtos, definição de preços, verificação do estoque, definição de canais de comunicação, formas de pagamento aceitas e seleção de brindes para sorteio como forma de prender a atenção na live. “Também determinamos um roteiro para que seja uma live divertida, pois as pessoas precisam, acima de tudo, de entretenimento”, afirma Leticia.
A empresária Patricia Tittoto, da Loja Parrô, de Jaboticabal, é outra adepta do modelo e reforça a importância do planejamento para conseguir boas vendas. “A live nos ajudou a fazer essa ponte com o pessoal que estava em casa e fortaleceu a humanização da nossa marca. As vendas nas lives são ótimas, porém, é um trabalho árduo, dinâmico. É preciso se dedicar”, afirma.
A loja de roupas e acessórios funciona desde 2008 e sempre teve uma forte presença digital, intensificada na pandemia. “Pesquiso muito vários perfis no Instagram, o que as lojas de outras cidades estão fazendo. O Instagram é uma ferramenta valiosa, feliz daquele que usa. E eu fuço demais, tenho capacidade ‘fuçativa’”, brinca Patricia, que tem o irmão Rodrigo como sócio.
Nas primeiras lives, a empreendedora conta que a equipe foi “aprendendo fazendo”, sempre respeitando o cliente. Na parte de planejamento, cada pessoa da equipe tem uma função: imprimir os pedidos, deixar tudo arquivado, quem vai separar, quem enviar os produtos. “A internet oscila muito e sempre procuramos explicar para o cliente sobre os procedimentos, quem pediu primeiro”, pontua.
Patricia também chama a atenção para a escolha da apresentadora da live. “Nossa live começa às 19h e segue até meia-noite. Não pode ser aquela coisa mecânica, precisa ser dinâmico. A internet tem de passar que nós somos reais”, destaca Patricia, que pretende seguir com o modelo em 2021, principalmente com as lives promocionais, que dão mais resultado.
Mesmo com as experiências positivas das empreendedoras, o consultor Edgard Neto lembra que é preciso ter cautela e fazer um bom planejamento antes de dar início a essa prática. Entre os pontos de atenção, ele destaca que a live deve ser desenvolvida como um canal efetivo de vendas, ter uma equipe direcionada, definição de produtos comercializados, como será feita a divulgação, preços, quem vai participar da transmissão, quem vai anotar os pedidos e qual será o canal de envio, por exemplo. “A live é uma excelente estratégia de canal de vendas, que bem elaborada pode trazer muito resultado tanto para a venda online quanto para loja física”, afirma.
O faturamento mensal da empresária Fabi Guimarães com o seu negócio, o Clube Memê, era de R$ 4 mil com a venda de acessórios e roupas infantis no Instagram. Mas ela se surpreendeu ao vender R$ 7 mil durante uma live de vendas, realizada em agosto. A experiência de Fabi com a venda online foi compartilhada na palestra “Como faturar quatro dígitos em quatro horas” na Feira do Empreendedor, que teve a edição 2020 100% digital.
A empreendedora contou que demorou mais de 40 dias para elaborar sua live diante da falta de informações sobre o tema. “Fazer stories e postar no feed não estava sendo suficiente e precisava inovar. Quando fiz a live e faturei mais de R$ 7 mil pensei: isso é uma nova era das vendas online, uma nova forma de vender”, contou a empreendedora, que vendeu todo o estoque e garantiu encomendas para mais 40 dias de trabalho.
De acordo com Fabi, a live de vendas pode ser uma oportunidade para o empreendedor passar a ver o negócio com um outro olhar: descobrir, por exemplo, que talvez o produto que ele acreditava ser o carro-chefe não tem tanto potencial.
Fabi destacou que a live desperta dois gatilhos mentais, de escassez e urgência, para incentivar a compra. “Nas redes sociais, precisamos humanizar, aparecer nos stories, mostrar os bastidores. E a live tem o poder de conexão. A live mudou a história do meu negócio”, afirmou.