FELIPE AMARAL, ALEXANDRE MONTEIRO E STÉFANO ASSIS, DA MELHOR CÂMBIO: 5 milhões de reais movimentados por dia / Divulgação
Da Redação
Publicado em 23 de fevereiro de 2017 às 13h03.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h36.
Betina Neves
A instabilidade do câmbio nos últimos anos deu força para uma nova leva de startups focadas em facilitar e baratear a compra e a venda de moeda estrangeira. Os atrativos são evidentes: as diferentes cotações operadas no mercado podem variar em até 15%. Além disso, o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) é de 6,38% para as compras com cartões, mas de apenas 1,1% no papel-moeda. O problema: há um crescente debate sobre até que ponto essas novatas agem dentro da legalidade.
A maior parte das empresas consiste em “comparadores de câmbio”, que monitoram, entre casas de câmbio e bancos associados a eles, as cotações que estão sendo praticadas por cada um, mostrando um ranking que vai da mais barata à mais cara, com atualizações constantes.
A maior delas é a Melhor Câmbio, lançada em setembro de 2015. Hoje são 500.000 usuários únicos por mês e cerca de 5 milhões de reais diários movimentados em operações de câmbio, com 550 corretores e correspondentes cadastrados em 135 cidades brasileiras. A startup também comprou os dois principais concorrentes (e pioneiros no negócio): a Jooin, no começo de 2016 e, em janeiro deste ano, a Exchange Money.
O faturamento vem da comissão que ganham em cima da ferramenta de leilão, através da qual o usuário indica a moeda, a cidade de compra, a quantia (80% das operações são para valores entre 1.000 e 1.500 dólares em São Paulo, Rio e Belo Horizonte) e faz uma oferta em reais, com um limite de cotação mínima imposto pelo próprio sistema.
Após deixar telefone e e-mail de contato, ele é procurado pela casa de câmbio interessada em aceitar a oferta. “Isso torna o site mais interessante para as corretoras, porque nada impede que uma que costuma ficar em último no ranking num determinado leilão queira baixar o preço para fechar negócio”, diz o engenheiro Stéfano Assis, presidente da Melhor Câmbio.
O desafio, assim como o de outras plataformas de marketplace, é fazer o cliente fechar o negócio pelo site (no caso deles, por meio da ferramenta de leilão) e não usá-lo somente para consulta. Por isso, eles a Melhor Câmbio também tem investido na realização de parcerias com outras empresas de turismo para dar benefícios extras, como 20% de desconto em seguro de viagem com a Ita Travel Card e 15% na Protect Bag, de proteção para malas.
Ao longo do ano passado, várias plataformas surgiram seguindo a mesma ideia da Melhor Câmbio, mas ainda trabalham numa escala bem menor. O aplicativo Exchange Now, com 53 corretoras cadastradas, encontra os pontos de venda por geolocalização e permite filtrar os resultados da busca por preço, distância e avaliação de outros usuários. Também funciona como um guia no exterior, com uma base de dados que mostra casas de câmbio locais (mas sem as cotações operadas) em 47 países – até agora tem 15.000 usuários cadastrados, numa crescente de 800 novos por semana.
O empreendedor paulistano Kenzo Tominaga fundou a Bidollar, que recebeu investimentos da aceleradora gaúcha Wow. Com atuais 30.000 usuários mensais e 10 milhões de reais movimentados desde o lançamento (em fevereiro de 2016), pretende crescer 5 vezes esse ano. A Neo Câmbio, lançada em novembro, já operou 500.000 dólares em transações e conta com 12.000 usuários cadastrados. O site permite que o cliente selecione se quer retirar o dinheiro na casa de câmbio ou se prefere receber em casa, e com qual prazo. “Também pretendemos expandir para importação e exportação com pequenas e médias empresas”, diz o sócio-fundador Jung Park. Diferente da Melhor Câmbio, essas empresas não têm ferramenta de leilão, e ganham comissões em cima dos valores negociados.
Elaborado pela Stallos, empresa de tecnologia que desenvolve software para corretoras de câmbio desde 1989, a Boa Taxa foi lançada em dezembro com investimento de 600.000. Ela inclui o sistema de cadastro do cliente, a ferramenta de leilão e também um alerta de tarifa, no qual o cliente inscreve seu email e recebe um lembrete quando a moeda chegar à cotação desejada.
Apps polêmicos
A profusão de statups novas, porém, deixa em dúvida a transparência do serviço pelo atrelamento que algumas têm diretamente com corretoras de câmbio. Os sócios do Neo Câmbio por exemplo, também são donos da Transfercâmbio, uma correspondente cambial com loja física em São Paulo (que figura nos rankings do site). O Super Câmbio, de Porto Alegre, tem o mesmo CNPJ da Sol Corretora de Câmbio. É possível que algumas corretoras estejam criando sites que elencam seus próprios correspondentes e não estão de fato fazendo uma pesquisa no mercado em busca da menor cotação.
Outro segmento dessas startups são ferramentas que permitem que usuários troquem moeda estrangeira com uma cotação mais amigável do que a oferecida por casas de câmbio e sem a cobrança de IOF. A ideia é facilitar o encontro entre pessoas interessadas na compra e na venda de moeda: em aplicativos como o Go Money e o Moneapp, você delimita um raio de busca, diz a moeda e a quantidade que quer comprar ou vender e encontra um “match” com outro usuário interessado. Aí, deve-se combinar um local para fazer a trocar através do chat interno – um manual do app recomenda que seja um lugar público e ensina a identificar notas falsas. Os clientes ganham avaliações para aumentar a confiabilidade.
“Não tivemos nenhum relato de problemas até agora”, diz Felipe Barbosa, fundador do Moneapp. “ Nossa intenção não é transformar as pessoas em cambistas, mas sim quebrar o monopólio dos bancos e corretoras de câmbio”. O app foi lançado em agosto de 2016 (só para Android, já que não conseguiu liberação na Apple) e conta com 12.000 pessoas cadastradas, mas por enquanto é totalmente gratuito e não envolve nenhum tipo de comissão.
Como fizeram os taxistas com o Uber e corretores imobiliários com o Airbnb, os bancos e as casas de câmbio devem reclamar junto às autoridades. A Associação Brasileira de Corretoras de Câmbio (Abracam) pretende entregar no Banco Central um relatório para indicar empresas que, segundo eles, “colocam em risco o sistema financeiro facilitando atividades como lavagem de dinheiro, evasão de divisas e sonegação fiscal”.
No mais, a legislação determina que todas as operações de câmbio entre pessoas físicas e jurídicas sejam feitas através de agentes cadastrados no Banco Central. “É preciso refletir se a atividade desempenhada pelos aplicativos como intermediadores pode ser considerada uma operação de câmbio sem autorização. E preocupa também o não pagamento do IOF, já que o contribuinte deveria ser justamente o comprador ou vendedor de moeda estrangeira (ou seja, o consumidor do aplicativo)”, diz o advogado Fabio Rodarte, especialista em direito financeiro.