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Arte ao alcance de todos

Como aumentar a integração entre os funcionários por meio de programas que despertam o gosto por leitura, música e cinema

Rafael Biasotto, da Uatt?: leitura para todos os funcionários (Michel Téo Sin / EXAME PME)

Rafael Biasotto, da Uatt?: leitura para todos os funcionários (Michel Téo Sin / EXAME PME)

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Da Redação

Publicado em 9 de abril de 2015 às 05h56.

São Paulo - Nas pequenas e médias empresas, oferecer gratuitamente programas culturais, como oficinas de música, sessões de cinema, aulas de artes plásticas e debates sobre literatura, tem servido como ferramenta para a retenção de talentos e a aproximação dos funcionários.

“Cada vez mais os negócios emergentes têm investido nesse tipo de programação e obtido bons resultados”, diz Bernardo Entschev, da consultoria Bernt Entschev. “Iniciativas como essas costumam ser muito valorizadas pelos empregados porque o acesso à cultura é bastante caro no Brasil.”

Cinema

O primeiro filme que a assistente social Erenilda Alves de Souza, de 49 anos, assistiu no cinema não foi nenhum sucesso de bilheteria dos anos 70 ou 80, como E.T. ou A Lagoa Azul. Aos 12 anos, quando pisou pela primeira vez em uma sala de projeção, ela viu a produção italiana Dio, come Ti Amo, de 1966, uma história de amor em preto e branco.

“A cidade só tinha uma sala de cinema, que passava títulos antigos”, diz Erenilda. “Mesmo assim, gostei muito da experiência.” Macapá não é diferente de vários municípios brasileiros no que diz respeito ao cinema — a maioria das cidades do país não tem salas de projeção.

No Norte, onde morava Erenilda, a situação é ainda pior — há salas de cinema em apenas 6% das cidades. “Muita gente aprecia programas culturais, mas não tem a oportunidade de usufruí-los.”

Desde que começou a trabalhar no Hospital São Cristóvão, em 2011, o cinema passou a fazer parte da vida de Erenilda, que há nove anos mora em São Paulo. Uma vez por mês, o hospital oferece uma sessão de cinema, gratuitamente, em seu auditório, com 96 lugares. Os filmes podem ser vistos por funcionários da empresa, pacientes e moradores da região.

O programa foi criado em 2007 — a motivação inicial era contribuir para que pacientes de doenças graves, como câncer, pudessem participar, dentro do próprio hospital, de uma atividade capaz de elevar o bom humor e a esperança. “Logo percebemos que muitos empregados tinham interesse em ver os filmes e abrimos as sessões a todos”, diz Valdir Pereira Ventura, de 67 anos, presidente do Hospital São Cristóvão. “Ajudou muito na integração dos vários departamentos.”

Uma equipe de psicólogos é encarregada de escolher os títulos. “A intenção é que o conteúdo possa mobilizar discussões sobre temas de aspecto emocional”, afirma Ventura. Já foram projetadas no telão do auditório produções como O Lado Bom da Vida, sobre pessoas com transtornos psiquiátricos, e Longe Dela, que mostra a vida de uma paciente de Alzheimer.

No fim de cada sessão, duas psicólogas conversam sobre o filme com os espectadores. Nos encontros, são discutidos o comportamento dos personagens e o desfecho do enredo. “As reflexões são interessantes, ajudam a aliviar o estresse e a aproximar os funcionários”, diz Erenilda.

Música

Desde criança a paulista Mônica Teixeira é fã da banda de rock Metallica. Seu pai, o motorista de caminhão Paulo Teixeira, de 46 anos, ouvia os discos do grupo sempre que estava em casa. “Eu gostava de ficar com ele, ouvia Metallica e prestava muita atenção no som do baterista, Lars Ulrich”, diz Mônica. Ela começou a estudar bateria há dois anos, logo depois de ter sido contratada para o cargo de assistente de suporte ao cliente na Apdata, empresa de softwares de São Paulo.

A paulista Luiza Nisoli, de 52 anos, sócia da Apdata, também cresceu ouvindo música, assim como Mônica. Quase todos os nove irmãos de Luiza tocam um instrumento ou cantam. “Eu me tornei empreendedora e acabei não me dedicando à música”, diz Luiza. “Mas sei que é uma atividade cultural capaz de aumentar o bem-estar das pessoas.”

Em 2012, ela montou um estúdio de música dentro da empresa, que custou cerca de 200 000 reais. Uma pesquisa conduzida pelo departamento de recursos humanos da Apdata levantou quais eram os empregados com conhecimento musical. Eles concordaram em dar aulas aos interessados. Os encontros são realizados antes e depois do expediente e na hora do almoço. “Boa parte dos funcionários aceita sair mais tarde da empresa porque são jovens e solteiros”, diz Luiza.

Cerca de 40 empregados — 10% do total de profissionais da empresa — já tiveram aulas no estúdio. Alguns montaram bandas. “Iniciativas como a da Apdata são importantes não só por levar a cultura às pessoas mas também por motivar os empregados”, diz Bernardo Entschev, da consultoria Bernt Entschev.

Nos últimos três anos, a taxa de rotatividade da Apdata, que oferece benefícios como atendimento psicológico, passou de cerca de 3% ao ano para menos de 1%. “Falta mão de obra qualificada no setor de TI”, afirma Luiza. “Oferecer atividades culturais é uma boa maneira de conservar os empregados.”

Livros

Ocatarinense Rafael Biasotto, de 38 anos, sócio da Uatt?, rede de lojas de objetos de decoração de São José, em Santa Catarina, costuma ler mais de 20 livros por ano. Em geral, são obras de ficção como A Revolta de Atlas — a narrativa é sobre um mundo fictício em que ciência e arte desaparecem.

“A leitura organiza o pensamento, estimula a criatividade e ajuda na elaboração de decisões estratégicas”, diz Biasotto. “É uma pena que poucos brasileiros tenham condições de comprar livros.” Em geral, as obras literárias no Brasil custam mais caro do que em vários países europeus, como Itália e Alemanha.

Para incentivar a leitura entre os cerca de 130 funcionários da Uatt?, que faturou 110 milhões de reais em 2014, 10% mais do que em 2013, Biasotto criou uma biblioteca interna há quatro anos. Os primeiros livros foram doados pelo empreendedor.

Logo os funcionários também começaram a fazer doações. Hoje, a biblioteca tem 250 títulos, com clássicos da literatura nacional e estrangeira. São promovidas discussões semanais sobre os livros mais procurados. “Assim, aprofundamos o conhecimento”, diz Vanderlei Vitor de Souza, de 32 anos, atendente da loja online, que costuma conduzir os debates. “Adoro ler”, diz Souza. “Por isso, me candidatei para comandar as reuniões sobre os livros.”

Para manter uma biblioteca que seja de fato utilizada, é necessário pesquisar de que tipo de livro os funcionários mais gostam e incentivar a leitura. “Mandar avisos por e-mail sobre novas aquisições e criar grupos de leitura são boas iniciativas”, diz William Nacked, presidente do Instituto Brasil Leitor, que ajuda empresas a estruturar bibliotecas.

Artes plásticas

Oficinas de artes, de desenho, pintura, trabalhos manuais e de cerâmica também podem ser úteis para estimular a criatividade e juntar as pessoas que compartilham os mesmos interesses. “Promover a integração dos funcionários por meio da arte em geral favorece a troca de ideias”, diz Fernando Dias, da consultoria Career Center. “Empregados de diferentes áreas passam a ter mais contato porque gostam de coisas parecidas.”

É possível desenvolver parcerias com escolas de artes para criar aulas que atendam aos interesses dos funcionários e sejam oferecidas no local de trabalho, segundo Dias. Os preços podem ser negociados porque há garantia de um número mínimo de alunos.

“Só é preciso tomar cuidado para se certificar de que o programa vai agradar à maioria”, afirma Dias. “No caso de empresas de estrutura enxuta, um café informal com os funcionários pode servir para descobrir as preferências do grupo.”

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