O McDonald's já investiu em pizza, frango assado e burrito. Agora, abre cafeteria 'sideral' nos EUA
Na virada dos anos 2000, a cadeia global de fast food apostou em novos negócios. Anos depois, saiu de tudo para focar na marca principal. Será que agora a diversificação vai dar certo?
Repórter de Negócios
Publicado em 9 de dezembro de 2023 às 12h00.
Na semana em que anunciou o plano de abrir 10.000 lojas até 2027, a cadeia global de lanchonetes McDonald's revelou, também, um novo formato de restaurantes dentro da rede.
É uma novidade relevante numa empresa presente em 120 países e com 68 milhões de consumidores todos os dias — tudo isso sob a mesma marca e com um cardápio com outras alterações regionais.
O novo negócio é o CosMc's, uma cafeteria com temática sideral que homenageia o alienígena CosMc, um personagem utilizado pela rede em comerciais ao longo das décadas de 80 e 90.
A cafeteria sideral está em teste numa unidade no estado de Illinois, nos Estados Unidos, próximo à sede global da companhia, em Chicago. De acordo com a companhia, o formato deve ganhar 10 unidades em 2024, todas nos Estados Unidos.
Em que o McDonald's já investiu
A aposta do McDonald's retoma o investimento da companhia em outras marcas para além da lanchonete dos arcos dourados avaliada em 104 bilhões de dólares.
Na virada dos anos 2000, o McDonald's global buscou a diversificação dos negócios com a aquisição de participações em três outros negócios de comida rápida: Donatos Pizza; Boston Market, dona da marca Boston Chicken; e na então pequena rede de comida mexicana Chipotle.
O período coincidiu com uma fase difícil da rede, acumulando críticas ao serviços, quedas nas vendas e margens espremidas devido à concorrência com marcas como Burger King e Wendy's.Os três investimentos não pararam de pé por muito tempo — e por motivos diferentes.
No caso da Donatos, uma rede de pizzarias fundada em Columbus, Ohio, um plano de expansão acelerado demais trouxe franqueados sem expertise para tocar o negócio de pizza. A má escolha de pontos comerciais causou um vaivém no número de unidades.
Quando o McDonald's comprou a Donatos, em 1999, eram 143. Em poucos meses, a rede chegou a 220 unidades. Com o desempenho ruim, o McDonald's vendeu o controle novamente ao fundador em 2002. Então, a rede já havia sido enxugada para 180 unidades. Hoje, são 154.
A situação da Boston Market, uma rede de restaurantes de casual dining especializada em carnes típicas de rotisserias, como o frango assado, representou um descompasso de expectativas ainda mais amplo.
Na época do anúncio do investimento do McDonald's na companhia, em 1998, analistas colocaram dúvidas sobre as sinergias entre uma rede de fast food e uma de restaurantes com serviço de mesa, como era o caso da Boston Market.
Houve até a especulação de que a rede de Chicago só estava interessada nos pontos comerciais do Boston Market. O fato é que a operação das duas companhias seguiu separada por sete anos. Em 2007, o McDonald's anunciou a venda do Boston Market a um fundo de private equity.
O investimento na Chipotle veio em 1998. A chegada do McDonald's colaborou para a rede de comida mexicana sair de 14 unidades para 500 em sete anos. Em 2005, a rede de hambúrgueres tinha 90% do capital da Chipotle.
No ano seguinte, o McDonald's colocou toda a sua participação à venda. Em 2015, numa conversa com investidores, o então CEO do McDonald's foi criticado ao dizer que a entrada do McDonald's numa rede de comida mexicana era uma "distração" para uma rede de hambúrgueres. Hoje, a Chipotle tem mais de 1.400 lojas e é famosa pela variedade de burritos.
"Toda vez que você traz negócios que têm suas particularidades, que são específicos, mas que você os coloca numa estrutura muito grande, a máquina atrapalha", afirma Cristina Souza, CEO da consultoria Gouvea Foodservice. "O negócio principal rouba tanta energia de todo mundo que no final as outras marcas se sentem preteridas."
Ao contrário das empreitadas anteriores, nesta o Mc tá começando o CosMc do zero e pode aproveitar mais possibilidades de sinergias.
"Eu acho que tem, pelo menos, duas vantagens do ponto de vista operacional. Uma é que, pelo fato de ter 40 mil lojas no mundo, a rede tem sinergias logísticas, com as cadeias de abastecimentos já resolvidas. Isso permite ser eficiente, ter pouco problema de abastacecimento e no mix de produtos. E o segundo é poder transitar os produtos entre as duas marcas", afirma Sérgio Molinari, professor de food service da ESPM.
Por que apostar em café agora?
Dado o zelo do McDonald's em manter o foco no negócio principal, por que voltar a dedicar tempo e energia num novo mercado?
Para a partida em que o McDonald’s quer jogar, competindo com a grande estrela do setor, a rede Starbucks, o lançamento de uma marca virou a opção mais viável.
A chegada da nova marca tenta capitalizar em cima de algumas tendências. A primeira é o ritual em torno do café, um setor em transformação nos últimos anos e com a promessa de expansão acelerada.
Globalmente, o tamanho do mercado global de cafés para foodservice deve encerrar o ano movimentando mais de 478,85 bilhões de dólares, segundo dados da Fortune Business Insights.
Em 2030, a projeção é de que o valor supere 729 dólares, mais de 50% em relação ao valor atual. Nos Estados Unidos, mais de 60% do país bebe, pelo menos, uma xícara de café por dia.
O segundo ponto é o apelo à geração de experiências e com o discurso de personalização de bebidas.No anúncio, a rede afirma que os consumidores poderão adicionar xaropes diversos e doses energéticas ou de vitamina C, além de desfrutar dos itens em cores vibrantes e coloridas.
Em bom português, um estilo “instagramável”, dialogando com as novas gerações. O cardápio ainda conta com uma espécie de donut espanhol, Churro Frappe, sanduíches, chás gelados e opções diversas de limonadas. A proposta é ter lojas menores, incentivar a compra digital e pelo drive-thru.
"A opção de uma nova marca é fazer a rede crescer do ponto de vista de uma especialidade adicional, de um formato diferente e também mordendo um público que o McDonald's deveria realmente cuidar para que ele não desgarre, não perca o interesse pela marca McDonald's", afirma Molinari.
De acordo com o especialista, o McCafé, lançado há cerca de 30 anos, poderia ter sido o ativo a puxar esse movimento, mas ficou espremido, não conseguiu evoluir para além das lojas do McDonalds e criar uma musculatura própria. "Acabou muito mais virando um filhote, quase um pedaço da própria loja do McDonald's", diz Molinari.
Quem já conseguiu diversificar os negócios
No mundo das redes de fast food, outros grupos já percorreram o caminho da diversificação. Nos anos 1970, a Pepsico entrou no mercado de restaurantes e adquiriu a Pizza Hut, seguido por Taco Bell, e o KFC, na década seguinte.
Em 1997, a companhia fez um spin-off da operação, criando a Yum Brands, controladora do negócio que atualmente movimenta quase 7 bilhões de dólares por ano.
A holding conseguiu levar as redes logo no início para mais territórios, como o chinês, usando de um apelo pop e mostrando os valores da cultura ocidental.
Nos últimos anos, tem implementado estratégias como entregas rápidas para Pizza Hut (marca tida antes como mais tradicional) e modelos de quiosques para Taco Bell, mudanças que ajudaram a impulsionar os negócios.
Outro caso é da RBI (Restaurant Brands International), resultado da fusão em 2014 do Burger King com a Tim Hortons, rede canadense de cafés. A rede de restaurantes de frango frito Popeyes entrou para o grupo em 2017.
A empresa funciona como uma gestora de marcas e tem investido na expansão internacional das subsidiárias, além de apostar em novas ocasiões com a oferta de produtos para o consumo à tarde e à noite, lançamento de bebidas geladas e ampliação dos recursos em ações de marketing.