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O que o Santander quer no setor de cartões

Banco tem três boas razões para criar sua própria empresa para concorrer com Redecard e Cielo (ex-Visanet)

EXAME.com (EXAME.com)
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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 04h11.

Ao anunciar que negocia uma parceria com a empresa de cartões gaúcha GetNet, o Santander sinalizou pela primeira vez que vai mesmo concorrer com a Redecard e a Cielo (ex-Visanet) no setor de credenciamento. O mercado sempre cogitou essa possibilidade porque o banco espanhol há muito tempo possui uma licença para credenciar lojas a aceitar cartões Mastercard. O banco, no entanto, nunca havia se posicionado oficialmente sobre o assunto.

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1 - O momento nunca foi tão favorável para um novo competidor. O banco sempre teve dinheiro para bancar a investida. Apenas os recursos levantados pelo Santander Brasil com a oferta inicial de ações realizada no mês passado - 14,1 bilhões de reais - seriam suficientes para montar dezenas de redes para transações com cartões. Se já tivesse entrado nesse segmento, entretanto, o banco não começaria a operação em posição de igualdade com as gigantes do setor. Redecard e Cielo têm cerca de 80% do mercado, economias de escala e conhecimento do negócio.


Ao mesmo tempo, fechar um acordo com o Santander seria bastante interessante também para a GetNet. Para deter a licença da Mastercard e da Visa e se tornar um adquirente, é necessário ser uma instituição financeira - o que impede a GetNet de entrar nesse mercado sozinha. O acordo com o Santander justificaria o investimento de 160 milhões de reais feito pela empresa em sua preparação para a abertura do setor de cartões no Brasil. Outros processadores de transações eletrônicas, como a gigante americana TSYS e a brasileira CSU Cardsystem, também têm se preparado para aproveitar esse cenário com um maior número de competidores - e ganhará quem prestar serviço às maiores empresas.

2 - Se for necessário, deixar a Cielo pode ser vantajoso para o Santander. O banco tem uma participação pequena na empresa de cartões: 7,2% das ações. O Santander caiu de para-quedas no capital da Cielo em 2007, quando comprou o Banco Real e levou também a participação dele na empresa de cartões. Apesar de o acordo de acionistas garantir ao Santander o acesso ao bloco de controle, a Cielo sempre moldou seu modelo de negócios aos interesses de seus dois maiores acionistas, o Bradesco e o Banco do Brasil. Juntos os dois bancos detêm 50,09% dos papéis da Cielo.

A própria história da empresa demonstra o poder de BB e Bradesco. A Cielo foi criada em 1995, quando a Mastercard ainda era a maior bandeira de cartões do Brasil. Os dois bancos sempre privilegiaram a capilaridade nacional em seus planos de expansão e definiram que a Cielo credenciaria lojistas fora dos grandes centros - de olho no domicílio bancário desses estabelecimentos. Essa estratégia foi suficiente para que a Visa superasse a Mastercard como maior bandeira do Brasil ao mesmo tempo em que Bradesco e BB se tornavam bancos com presença nacional. Hoje a Cielo possui 1,6 milhões de estabelecimentos credenciados enquanto a Redecard está presente em 1,2 milhão.

Por outro lado, a Cielo até hoje tem um rentabilidade menor que a da Redecard, que se concentrou nos grandes centros, em lojas com maior faturamento. Essa estratégia serviu perfeitamente aos planos de seu controlador, o Itaú Unibanco, que também tem suas operações mais focadas nos estados mais ricos do país.

Criar uma nova empresa de cartões poderia ser a maneira de o Santander estar presente no setor de cartões por meio de uma empresa moldada para atender seus próprios interesses. Se julgar necessário, o banco poderia até mesmo vender sua participação na Cielo para financiar a expansão da nova unidade. Pela cotação atual, as ações da empresa em poder do Santander valem cerca de 1,6 bilhão de reais. Se o Bradesco e o BB não quiserem ficar com a participação porque já detêm o controle, os papéis poderiam ser vendidos a outro sócio estratégico ou até mesmo no mercado, por meio de uma oferta pública - o Citigroup fez isso para se desfazer de suas ações da Redecard. Caso o Santander abra mão também da participação na Cielo, uma mudança no estatuto para tirá-lo do bloco de controle poderia selar a paz entre os sócios. (Continua)


3 - Ter uma empresa de cartões seria uma forma de o Santander viabilizar a expansão do próprio banco, segundo a equipe de analistas do britânico Barclays. O Santander poderia usar o credenciamento dos lojistas como uma arma para conquistar também a conta corrente desses estabelecimentos. O Barclays explica que o banco já detém as contas correntes de 10% dos lojistas credenciados pela Visanet e de 5% dos credenciados pela Redecard.

Controlar o domicílio bancário de mais estabelecimentos permitiria ao Santander conhecer informações importantes sobre essas lojas que poderiam viabilizar a venda de outros produtos financeiros, como a antecipação dos recebíveis. Como no Brasil existe o parcelado sem juros e as lojas demoram até 40 dias para receber os pagamentos à vista feitos com cartão de crédito, o banco poderia antecipar o depósito desses recursos na conta dos estabelecimentos mediante a cobrança de uma taxa. Sabendo qual o volume de pagamentos a receber de uma loja, o banco prestaria esse serviço praticamente sem risco.

"Nós acreditamos que a entrada do Santander [em cartões] é menos orientada em manter uma alta rentabilidade no setor de credenciamento e mais direcionada em ganhar o domicílio bancário dos lojistas para então oferecer diversos outros produtos bancários lucrativos", afirmou o Barclays em relatório. Os analistas lembram que já não restam muitos alvos para que os bancos cresçam via aquisições no Brasil. Logo, terão uma expansão mais vigorosa as instituições financeiras capazes de tirar clientes do concorrente. Após realizar o maior IPO da história do Brasil e levantar o capital necessário para expandir a carteira de crédito, isso é tudo que o Santander quer.

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