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Prisão de herdeira ofusca ano de ouro da chinesa Huawei

Gigante passou a Apple na venda de celulares e caminha para faturar 100 bilhões de dólares. Mas Donald Trump não está gostando da ambição

Meng Wanzhou, da Huawei: prisão de herdeira reacende disputa entre China e Estados Unidos (Alexander Bibik/Reuters)

Mariana Fonseca

Publicado em 7 de dezembro de 2018 às 06h00.

Última atualização em 7 de dezembro de 2018 às 06h00.

A sexta-feira começa com a expectativa sobre a extradição para os Estados Unidos da diretora financeira e herdeira da empresa chinesa de tecnologia Huawei , Meng Wanzhou, presa no Canadá no dia 1º de dezembro.

Segundo alega o governo americano, a empresa teria violado sanções comerciais ao Irã e à Coreia do Norte ao vender produtos a esses países. Depois de confirmar a data e local da prisão de Wanzhou, o Ministério da Justiça do Canadá disse que os Estados Unidos pediram a extradição e a audiência para fiança foi marcada para hoje.

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Não está ainda claro a motivação por trás da prisão da executiva, mas é certo que a notícia voltou a esquentar o clima de tensão entre China e Estados Unidos . No dia 2 de dezembro, um dia após a prisão de Wanzhou, que é filha do fundador Huawei, Donald Trump, presidente americano e Xi Jinping, líder chinês, acordaram uma trégua de 90 dias na guerra comercial.

Em agosto, o presidente americano assinou uma lei que proíbe agências do governo de usar produtos e serviços da Huawei e de sua concorrente chinesa ZTE, alegando preocupações com segurança nacional. E incentivou que outros países fizessem o mesmo.

Austrália e Nova Zelândia também já proibiram a empresa chinesa de fornecer a infraestrutura para a internet móvel 5G. A British Telecom (BT), que domina a rede de telecomunicações do Reino Unido, declarou nesta semana que não usará os equipamentos da companhia na implantação do 5G.

Na tensão EUA-China, as empresas de tecnologia para telecomunicações são os principais alvos porque a China quer acelerar o desenvolvimento de seu mercado de semicondutores para diminuir a dependência de tecnologia importada dos Estados Unidos. A Huawei, em especial, incomoda pelo gigantismo e o poder de inovação.

Um pé nos chips

Ao que tudo indicava, 2018 seria o ano mais memorável da história da Huawei, maior fabricante de equipamentos de telecomunicações e a segunda maior fabricante de smartphones do mundo. Foi o ano em que a marca ultrapassou a Apple e se tornou a segunda maior fabricante de celulares, perdendo apenas para a sul-coreana Samsung.

Também em 2018 lançou, em seu mega evento anual que aconteceu em outubro em Shanghai, um chip voltado a aplicações de inteligência artificial, um produto estratégico porque marca a entrada da empresa neste segmengo. Será ainda o ano em que baterá, pela primeira vez, a marca de 100 bilhões de dólares em faturamento, consolidando sua posição entre os maiores grupos chineses. Se não fosse um Trump no meio do caminho.

O evento anual da companhia, que aconteceu em outubro em Shanghai foi o maior de sua história, com milhares de participantes. Só de jornalistas, quase 200 fizeram a cobertura para dezenas de países. EXAME também esteve lá, a convite da empresa.

Nas palestras, conferências com a imprensa e na feira, a Huawei deixou bem claro que sua intenção é ser líder mundial em tecnologia de inteligência artificial. E está fazendo investimentos pesados para isso. Só em 2017 investiu 13 bilhões de dólares em pesquisa e desenvolvimento. O número de patentes registradas ultrapassa 74 000. Lançou recentemente uma plataforma online que ensina como desenvolver inteligência artificial, projeto de 140 milhões de dólares.

A intenção é formar em até 3 anos 1 milhão de desenvolvedores. “A estratégia da Huawei em inteligência artificial é investir em pesquisa básica e desenvolvimento de talentos para construir um portfólio de produtos completo e promover um ecossistema global aberto”, diz, o então presidente do Conselho, Eric Xu, disse durante o Huawei Connect.

Fundada em 1987 pelo ex-militar Ren Zhengfei, a Huawei começou vendendo switches PABX para telefones de uma fabreicante de Hong Kong. Em 1990 lançou o seu próprio produto e passou a comercializar a pequenos comércios. Nos anos seguintes aumentou o portfólio e em 1999 abriu uma primeira filial fora da China, na índia. Rapidamente ganhou o mundo.

Hoje está entre os maiores grupos chineses e é a 68º marca mais valiosa no mundo, valendo quase 8 bilhões de dólares, segundo estudo Best Global Brand 2018, da consultora Interbrand. Já implementou soluções em mais de 170 países e conta com 170 000 funcionários.

Este ano deve bater 100 bilhões de dólares de faturamento. Em 2017, as receitas somaram 92,5 bilhões de dólares, crescimento de 16%, e lucrou 7,3 bilhões de dólares. As Américas, incluindo Estados Unidos, representa apenas 6,5% do faturamento da Huawei.

O próprio mercado chinês continua sendo o maior, respondendo por 50% das receitas e é o que mais cresce – em 2017 o ritmo foi de 39%. Europa, Oriente Médio e África tem 27% do bolo e Ásia e Pacífico, 12%. Com cinco filiais no país (SP, Rio, Brasília, Recife e Curitiba) e 1 200 funcionários, vendeu nos últimos três anos quase 500 milhões de dólares a mais de 400 clientes.

Apesar de estar há 20 anos no Brasil, não dá para dizer que é uma empresa muito conhecida. No passado, a Huawei chegou a vender alguns modelos de celulares com baixa tecnologia e baratos, focando no público menos endinheirado. Agora, está voltando a vender aparelhos, em parceria com a Positivo, mas com a estratégia oposta: produtos com alta tecnologia e para público de média e alta renda.

Na China, lidera o mercado com 22% de participação, seguida pela Oppo (18%), Vivo (16%) e Xiaomi (14%) e Apple, 12%. Em julho ultrapassou a Apple em vendas no mundo e se tornou a segunda maior fabricante de celulares, atrás apenas da Samsung.

Mas é no mercado corporativo onde estão as maiores oportunidades. Ela produz e vende hardware e software para empresa de telecomunicação. Em 20 anos, participou da instalação da primeira rede 4,5G do Brasil, deu suporte a grandes eventos esportivos, implementou cabos submarinos intercontinentais e incentivou a aceleração da adoção de projetos na nuvem. Oferece quatro principais linhas de produtos e serviços: redes de telecomunicação, TI, dispositivos inteligentes e serviços de nuvem. Já implementou 400 000 quilômetros de redes ópticas.

Já começou, porém, a testar serviços de cidades inteligentes por aqui também, uma de suas principais apostas para o futuro. Em parceria com a prefeitura de Campinas, no interior de São Paulo, e com o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPqD), está instalando câmaras inteligentes e uma central de análise de dados para monitorar as ruas. Além de combater crimes, a intenção na cidade é monitorar também riscos ambientais, como deslizamentos de terra, alagamentos e prevenir desastres.

É ainda minúsculo perto do que tem em outros países – na própria cidade-sede da companhia, Shenzhen, por exemplo, já usa desde 2006 um sistema inteligente de monitoramento urbano, que conta hoje com mais de 1,3 milhão de câmaras de vigilância conectadas em tempo real a centrais de análise de dados. No mundo, colocou em 2017 para rodar soluções voltadas para cidades inteligentes em 120 lugares em 40 países.

Firmou também uma parceria com a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) para ampliar as atividades do Smart City Innovation Center, um hub de pesquisa e desenvolvimento de soluções relacionadas a cidades inteligentes e Internet das Coisas (IoT).

A grande pergunta é se a animosidade do governo americano será um impeditivo para os planos grandiosos da empresa. A maior dúvida é a definição de para onde, afinal, vai Meng Wanzhou. E o esclarecimento de, numa escala de zero a 100, qual o peso da geopolítica em sua prisão.

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