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O novo velho sócio da Tenda

Letícia Toledo O investidor americano Gary Garrabrant está longe de ser um neófito no mercado imobiliário brasileiro. De 2006 a 2011 ele presidiu o conselho da incorporadora Gafisa. Representava o fundo Equity Internacional, fundado pelo bilionário Sam Zell, um dos investidores mais conhecidos do planeta e tido por muitos como o Warren Buffett dos imóveis. […]

GARY GARRABRANT: “o mercado imobiliário do Brasil vive um momento difícil. Mas o segmento de baixa renda não é afetado por essa crise” / Michael Nagle/Bloomberg via Getty Images

GARY GARRABRANT: “o mercado imobiliário do Brasil vive um momento difícil. Mas o segmento de baixa renda não é afetado por essa crise” / Michael Nagle/Bloomberg via Getty Images

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Letícia Toledo

Publicado em 20 de dezembro de 2016 às 16h28.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h47.

Letícia Toledo

O investidor americano Gary Garrabrant está longe de ser um neófito no mercado imobiliário brasileiro. De 2006 a 2011 ele presidiu o conselho da incorporadora Gafisa. Representava o fundo Equity Internacional, fundado pelo bilionário Sam Zell, um dos investidores mais conhecidos do planeta e tido por muitos como o Warren Buffett dos imóveis.

Em 2013, Garrabrant abriu seu próprio escritório em São Paulo para mapear oportunidades no mercado brasileiro. Demorou, mas agora ele parece disposto a recuperar o prejuízo. Em agosto deste ano, comprou 11,3% da companhia de shoppings Alliansce – uma fatia que hoje vale cerca de 300 milhões de reais. Sua cartada mais ousada veio no dia 14 de dezembro, quando chegou a um acordo com a construtora Gafisa para comprar até 30% da sua controlada de imóveis de baixa renda Tenda por 231,7 milhões de reais.

O acordo aconteceu após a Gafisa cancelar a abertura de capital da Tenda por não conseguir investidores suficientes dispostos a pagar o valor mínimo de 12,50 reais por ação. Garrabrant, com isso, conseguiu uma bela pechincha: fechar o negócio por 8,13 reais por ação.

O anúncio da compra simboliza o retorno de Garrabrant a um mercado que ele conhece muito bem, mas numa situação inédita – fora da aba de Zell. “A nossa história com o país é antiga. Esse é o nosso segundo capítulo com o Brasil e estamos muito otimistas com o potencial do país”, diz Garrabrant.

Sua nova gestora, a Jaguar Real Estate Partners – fundada juntamente com Thomas McDonald, também ex-executivo da Equity International, tem o mesmo foco da antiga empresa: o mercado imobiliário de países emergentes. Para financiar sua nova empreitada, a Jaguar está fechando o seu primeiro fundo, com cerca de 350 milhões de dólares. “A economia do país chegou em seu ponto mais baixo e talvez permaneça lá por algum tempo. Mas acreditamos que a longo prazo o Brasil vai ser um dos mercados mais atrativos do mundo”, afirma Garrabrant.

Zell e Garrabrant foram pioneiros na criação de fundos especializados em investir em imóveis. Zell, hoje com 75 anos, começou cedo. No início da década de 1960, enquanto estudava direito na Universidade de Michigan, começou a gerenciar o aluguel de apartamentos estudantis. Dois anos depois de se formar criou a empresa de investimentos Equity Group Investments. O grupo deu origem a três das maiores empresas imobiliárias dos Estados Unidos: a Equity Residential, de apartamentos; a Equity Office Properties Trust, de escritórios; e a Equity Lifestyle, de casas fabricadas e resorts.

O contato com Garrabrant, hoje com 59 anos, começou em 1996. Na época, o executivo trocou o Chemical Bank pela vice-presidência do Equity Group. Três anos depois, ele e Zell fundaram a Equity International.

A companhia desembarcou no mercado brasileiro em 2005. Na época, a Equity comprou um terço da Gafisa por 55 milhões de dólares. Um ano depois, os sócios se juntaram ao fundo de private equity GP Investimentos e compraram a administradora de shoppings Ecisa – criando assim a BRMalls. Com uma série de aquisições, a companhia tornou-se líder num setor até então dominado por grupos familiares e, no auge, chegou a valer 13,7 bilhões de reais.

Nos primeiros cinco anos, a companhia investiu quase 500 milhões de dólares em empresas brasileiras. Enquanto Sam Zell cuidava das grandes decisões da empresa. Garrabrant e McDonald participavam do dia a dia das companhias em que a Equity investia. Garrabrant participou da abertura de capital da Gafisa, em 2006, e esteve no conselho durante um período em que o mercado imobiliário brasileiro viveu uma verdadeira euforia com muitos lançamentos de imóveis e o IPO de construtoras.

Em 2010, a Equity começou a se desfazer das ações da Gafisa. Na época, Garrabrant e outros executivos repetiram que não havia nada de errado com a incorporadora: a venda fazia parte do ciclo natural de investimentos.

É difícil saber o motivo que realmente os levou a deixar o negócio, mas a verdade é que eles saíram na hora certa. Em 2010, a empresa tinha um valor de mercado 5,1 bilhões de reais (no IPO em 2006 ela foi avaliada 1,54 bilhão). Pouco depois, começou a sofrer com problemas ligados principalmente à empresa de imóveis populares Tenda, que havia comprado em 2009.

Na Tenda, a Gafisa encontrou muito mais problemas operacionais do que esperava, perdeu dinheiro a rodo e estudou se livrar do negócio – que passou a ser conhecido como “Tenda dos Horrores”. Com todos os pepinos da Tenda e mais a crise do mercado brasileiro, a própria Gafisa vale pouco mais de 700 milhões de reais na bolsa, segundo dados da consultoria Economática.

Enquanto se desfazia das ações de seus primeiros investimentos – na Gafisa e também na BRMalls – Zell e Garrabrant falavam em investir em projetos de infraestrutura no país – de olho principalmente na Copa do Mundo de 2014 e na Olimpíada do Rio de Janeiro.

Os investimentos nunca aconteceram. Em meados de 2012, Garrabrant surpreendeu o mercado ao deixar a presidência da Equity International. Thomas McDonald, então diretor de estratégia do fundo e conselheiro da Gafisa e da BR Malls, também deixou o fundo. Segundo o Wall Street Journal, a saída se deu após um desentendimento com Zell sobre remunerações e questões estratégicas.

Garrabrant e McDonald então fundaram a Jaguar. A partir daí Garrabrant e Zell começaram uma batalha para convencer investidores sobre quem foi “o mais responsável” pelo sucesso da Equity International, que tinha uma taxa média de retorno anual de 20%. Zell investiu 400 milhões de reais na rede de estacionamentos Estapar e é controlador também da companhia de galpões Guarde Aqui.

Enquanto não compete diretamente com seu antigo sócio, Garrabrant deve enfrentar competição primeiramente dos próprios acionistas da Gafisa para comprar a Tenda. Isso porque, no acordo fechado, os acionistas da Gafisa receberão metade das ações da Tenda e terão direito de preferência na subscrição dos outros 50% — a data ainda não está definida, mas novidades podem surgir no dia de investidores da Gafisa, marcado para esta quarta-feira 21.

Só depois disso é que a Jaguar poderá adquirir o restante da companhia. Se sobrar entre 20% e 30% da companhia, a Jaguar é obrigada a entrar no negócio. Mas se a fatia restante ficar abaixo dos 20%, a Jaguar pode escolher ficar de fora.

O problema é que a base acionária da Gafisa é bastante pulverizada, o que dificulta a avaliação se a Jaguar entrará de fato na companhia. Segundo um executivo próximo, os principais acionistas da Gafisa – os fundos Polo Capital e Pátria Investimentos – que juntos detém 23,8% — estão interessados nas ações das Tenda. “Pelo preço de pouco mais de 8 reais por ação, a Tenda é um belo negócio”, diz.

Com foco no mercado de baixa renda, a Tenda é hoje uma das poucas construtoras que consegue ter resultados positivos – sobretudo por conta do Minha Casa Minha Vida. “Nós entendemos que o mercado imobiliário do Brasil vive um momento difícil. Mas o segmento de baixa renda não é afetado por essa crise. Há demanda e crédito”, diz Garrabrant.

Nos primeiros nove meses do ano, a Gafisa faturou 1,4 bilhão de reais, e perdeu 164,2 milhões. A Tenda faturou 766 milhões, e lucrou 36 milhões de reais. A até pouco tempo combalida Tenda, como se vê, virou a grande esperança da Gafisa. Garrabrant, claro, sabe disso. O problema, para ele, é que muito mais gente também se deu conta. Encontrar pechinchas está cada dia mais difícil.

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