Na batalha pela periferia, Skol deixa a Heineken para trás
Cerveja mais popular do Brasil ainda é a preferida em bares populares, segundo estudo do banco Credit Suisse feito na cidade de São Paulo
Da Redação
Publicado em 24 de janeiro de 2019 às 07h37.
Última atualização em 24 de janeiro de 2019 às 10h10.
A Skol , marca de cerveja mais popular do país, já viu dias melhores? A premissa de grande parte dos executivos do setor e de analistas que acompanham o mercado cervejeiro brasileiro pode não refletir a realidade. Um relatório divulgado no início da semana pelo banco Credit Suisse mostra que a Skol, e que sua fabricante, a Ambev, seguem dominando o mercado de bares na periferia de São Paulo, maior mercado consumidor de cerveja do Brasil.
O Credit Suisse visitou 80 bares paulistanos com a preocupação de replicar a distribuição geográfica da cidade – com resultados que, segundo o banco, chegam a 11% de margem de erro. Setenta e um por cento da amostra era de bares afastados do centro de São Paulo e com foco num público de baixa renda. Resultado: a Skol é a marca mais vendida segundo os donos de bares em nove das 11 regiões pesquisadas. A Original, também fabricada pela Ambev, e a holandesa Heineken , dona da Schin no Brasil, levaram primeiro lugar nas duas regiões mais ricas da cidade. Na região de Itaim e Vila Olímpia, 38% dos bares sequer vendem Skol.
A dominância da Ambev se explica, em partes, por sua reconhecida capacidade de distribuição. Todos os bares de baixa renda pesquisados vendiam cervejas da marca, e 77% deles as recebiam diretamente da fabricante. A Heineken, por sua vez, estava presente em apenas 47% dos pontos de venda voltados para consumidores de alta renda, e estava em apenas 41% dos voltados à baixa renda. A distribuição, segundo o Credit Suisse pode levar a Ambev a ganhar participação de mercado. “70% dos bares visitados reportaram problemas de distribuição com a marca Heineken, mencionando algum tipo de falta de produto”, diz o relatório.
Outra vantagem competitiva da Ambev, segundo o banco, é sua segmentação de marcas. A marca Heineken, sozinha, tenta competir em três segmentos de preços diferentes — de 14 a 27 reais o litro, segundo o Credit. Concorre, dependendo da embalagem e da ocasião, com Corona, Stella Artois, Budweiser, Original e Serra Malte, todas da Ambev, além de Amstel e Eisenbahn, da Heineken. Um problema para a Heineken pode ser um acordo de distribuição com a Coca-Cola, que está em fase de renegociação. “Acreditamos que os envasadores da Coca podem estar priorizando o crescimento de volume para a Heineken (já que eles a distribuem), em vez de cuidadosamente desenvolver a marca na sua segmentação de preço”, diz o relatório.
Segundo um executivo que acompanha de perto o mercado cervejeiro, a falta de produtos da Heineken nos pontos de venda pode ser um golpe para as pretensões da companhia de ganhar terreno no mercado brasileiro. “Se o consumidor busca a marca A e não encontra, o risco é ele provar a marca B, gostar, e depois não voltar a procurar a outra”, diz. “Por outro lado, a dominância da Skol em regiões mais populares se explica pelo preço. Dois reais, para este público, fazem muita diferença, o que pode não ser verdade em áreas mais ricas”.
Os planos da Heineken
Apesar de atuar no Brasil há décadas, a holandesa Heineken começou uma nova fase de expansão no país no início de 2017, quando comprou a Brasil Kirin, subsidiária brasileira da cervejaria japonesa Kirin que havia comprado, em 2011, o controle da cervejaria Schin. A compra deu à Heineken uma capilaridade que lhe faltava e permitiu aos holandeses chegarem à segunda posição no mercado nacional – ainda que muito longe da Ambev.
Segundo a agência Reuters afirmou à época, a nova empresa nascia com quase 19% de participação e um portfólio de marcas que ia de cervejas mais premium, como a Eisenbahn, às mais populares, como a Bavária e a Glacial. Desde então, a empresa concentrou seu marketing na Heineken, replicando no Brasil uma disputa global entre a marca holandesa e o enorme portfólio da ABInBev.
Em junho do ano passado o banco Bradesco BBI divulgou relatório estimando que a Heineken, com todas as suas marcas, poderia ganhar até 5 pontos percentuais de mercado até 2023. Para isso, a empresa está encerrando um contrato de distribuição com a Coca-Cola e vai distribuir por conta própria em até um milhão de pontos de venda até 2021, estima o Bradesco BBI (até 2018 a cervejaria chegava a 600.000 endereços).
Como resposta ao avanço da concorrência, a Ambev tem centrado esforços em marcas como a Budweiser e também na Skol, que nos últimos meses ganhou versões sem cereais não malteados, como a Skol Hops e a Skol Puro Malte. O relatório do Credit Suisse mostra que, para além da qualidade do produto e do potencial de marketing para conquistar novos consumidores, a Heineken tem desafios em outras frentes.
Procurado por EXAME, o grupo Heineken afirmou, via assessoria de imprensa, que “vem registrando crescimento sustentável de volume e participação de mercado em todo seu portfólio, atualmente composto por 13 marcas distribuídas estrategicamente para atender aos diferentes perfis de consumidores e ocasiões de consumo do brasileiro”. Disse ainda que o acordo de distribuição com a Coca-Cola está em um tribunal arbitral e que “em nada impacta o abastecimento dos pontos de venda”.
Se a garrafa verdinha da concorrência não chegar ao ponto de venda, como mostra o relatório do Credit Suisse sobre o mercado paulistano, a Ambev só tem a agradecer.