Mais uma cópia? Facebook lança novo app parecido com o Pinterest
Entre os casos de "inspiração" mais famosos da empresa de Mark Zuckerberg está o Stories do Instagram, lançado em 2016 com recurso similar aos do Snapchat
Carolina Riveira
Publicado em 14 de fevereiro de 2020 às 11h21.
Última atualização em 21 de fevereiro de 2020 às 23h56.
Há dois anos, o Facebook virava assunto ao lançar a ferramenta Stories, para publicação de imagens divertidas que ficavam no ar somente 24 horas e seriam exibidas separadamente ao feed tradicional do Instagram . O caso, com razão, revoltou o Snap , companhia cujo principal app, o Snapchat, era 100% baseado em uma ferramenta bastante parecida e que começava a ganhar popularidade mundial na época.
Nesta semana, um caso parecido voltou a acontecer, mas desta vez o alvo é um produto da rede de imagens Pinterest . O Facebook liberou na iOS Store, loja de aplicativos da Apple, um aplicativo batizado de Hobbi. Inspirado na palavra hobby, ou atividades que alguém considera interessantes e faz com frequência, o app instiga o usuário a compartilhar imagens de seus hobbies e projetos pessoais na rede e organizá-los em coleções. Um dos motes usados na divulgação do produto é "o app para seus projetos pessoais".
O primeiro veículo a notar o lançamento do app e a semelhança com o Pinterest foi o site americano The Information, especializado em tecnologia. Por enquanto, a ferramenta está disponível somente para celulares iPhone. As primeiras resenhas na ferramenta na página da iOS Store, da Apple, datam desta quinta-feira, 13, o que sugere que a empresa tenha liberado o aplicativo por volta desta data, embora o Facebook não tenha ainda se pronunciado sobre a questão.
O Hobbi foi desenhado pela equipe de New Product Experimentation (experimentação de novos produtos, em inglês) do Facebook, time que a empresa introduziu na metade do ano passado para pensar em novos produtos e funcionalidades para os apps da empresa. O Facebook, além da rede social homônima, é dono do Instagram, do WhatsApp e do Facebook Messenger, que juntos somam mais de 4 bilhões de usuários.
Pinterest, a rede social dos criativos
Criado em 2011 por Ben Silbermann, o Pinterest tem 335 milhões de usuários ativos e é uma rede de compartilhamento de imagens, mas um pouco diferente de nomes como o Instagram.Seus usuários, chamados de pinners, salvam imagens e criam painéis temáticos, no geral relacionados a criatividade, como ideias de decoração e ilustrações. Segundo o jornal The New York Times, os usuários da rede já pinnaram 175 bilhões de itens em 3 bilhões de quadros virtuais.
Em dado citado pelo próprio Pinterest, a empresa de inteligência comScore afirma que, em dezembro de 2019, quase metade de todos os usuários de internet nos Estados Unidos usam a ferramenta. Metade dos jovens americanos entre 18 e 24 anos também estão na rede social.
O Pinterest abriu seu capital na bolsa de Nova York em abril de 2019, na época com valor de mercado de 12,7 bilhões de dólares, ou 19 dólares por ação. O Pinterest foi uma das diversas empresas de tecnologia que estrearam na bolsa dos Estados Unidos no ano passado, assim como as companhias de transporte por aplicativo Uber e Lyft, a ferramenta de mensagens corporativas Slack e a fabricante de carne vegetal Beyond Meat.
Cada uma em suas especificidades, elas chegaram à bolsa depois de conseguirem um alto valor de mercado com investimentos privados, mas todas ainda têm prejuízo em seus balanços e tentam encontrar uma forma de se provar rentáveis. O argumento das empresas é que elas possuem produtos de tecnologia escaláveis e que os gastos de hoje serão pagos no futuro após um crescimento exponencial de sua participação de mercado.
De todos os prejuízos, o Pinterest é um dos que tem o caso menos complicado. No balanço referente ao quarto trimestre divulgado no último dia 6 de fevereiro, a empresa informou que teve no ano de 2019 faturamento de 1,1 bilhão de dólares, alta de 51% em relação a 2018. O prejuízo também disparou, para 1,4 bilhão de dólares, mais de 2.000% a mais do que em 2018.
A empresa, assim como todas as que fizeram IPO em 2019, precisou gastar muito ao longo do ano com encargos financeiros relacionados à chegada à bolsa, como compensações pagas a executivos e bancos de investimento que fizeram o IPO. Se excluídos esses encargos, a empresa lucrou 17,9 milhões de dólares, revertendo prejuízo que havia tido em 2018.
Cerca de 90% da receita do Pinterest vem dos usuários nos Estados Unidos, ainda que o país responda por somente 26% dos usuários ativos. Dos 335 milhões de usuários ativos mensais em 2019, 247 milhões fora dos Estados Unidos e 88 milhões no país. O número de usuários cresceu 26% no ano, com a maior alta vinda do exterior, onde o número de clientes aumentou 35%.
A ação do Pinterest segue basicamente valendo o mesmo que valia no IPO há quase um ano, com ligeira queda de 3% desde então. No cenário de desconfiança em relação às empresas de tecnologia, não é um mal negócio: as ações da Lyft, por exemplo, caíram mais de 40% desde o IPO, ainda que os resultados financeiros da companhia estejam melhorando.
Quem é páreo para o Facebook?
Contudo, enquanto Lyft e a rival Uber lutam com prejuízos muito maiores e potenciais problemas com regulações de governos mundo afora, o Pinterest terá de lidar com um problema tão grande quanto: competir com uma cópia criada pela empresa de Mark Zuckerberg.
O Snap que o diga. A ferramenta, que fez IPO em 2017, chegou a ver suas ações caírem 80% em relação ao valor de estreia na bolsa depois que o Facebook lançou o Stories para o Instagram. Hoje, a ação do Snap se recuperou, mas a empresa nunca mais conseguiu ser a mesma. Na época do lançamento do Stories, o Snap estava em um caminho para ser uma estrela global, e começava a engrenar mesmo em países emergentes onde até então tinha uma pequena base de usuários, como o Brasil. Com a chegada do Instagram, mais consolidado, a tarefa ficou mais difícil.
Entre o público brasileiro, o Stories fez tanto sucesso que derrubou a audiência do Snapchat. Reportagem de EXAME em 2017 mostra que o tempo gasto pelos brasileiros no aplicativo do Snap tinha subido 31% entre outubro de 2015 e julho de 2016, perto do lançamento do Stories, mas caiu mais de 80% do lançamento da ferramenta do Instagram até outubro de 2017. O levantamento foi feito pela empresa de inteligência comScore no relatório Mobile Metrix, que levou em conta usuários com mais de 18 anos. Enquanto isso, o tempo gasto no aplicativo do Instagram subiu mais de 40% no mesmo período.
Atualmente, boa parte do público do Snap está somente em Europa e Estados Unidos, onde a empresa tem um público mais fiel, sobretudo entre a chamada geração Z, com usuários abaixo de 24 anos.
O Snap ficou tão irritado com a cópia do Instagram que chegou, na época, a fazer internamente um projeto chamado "dossiê Voldermot", em que os executivos do Snap documentaram por anos as ações do Facebook que consideraram ser direcionadas a fazer o Snapchat quebrar. O vilão da saga "Harry Potter" foi escolhido para nomear o que a Snap via como tentativas de Mark Zuckerberg de minar a concorrência.
Como quase todas as redes sociais, o Pinterest é gratuito, mas ganha dinheiro sobretudo com publicidade, e afirma a investidores que, como os usuários buscam a rede para encontrar inspiração, é uma das melhores plataformas para se anunciar -- de móveis e decoração a qualquer tipo de produto. No Facebook, a publicidade representa 98% das receitas. O único de seus aplicativos principais (Facebook, Facebook Messenger, Instagram e WhatsApp) que não tem anúncios por ora é o WhatsApp, de mensagens. Assim, lançar um app similar ao Pinterest e fazer usuários passarem um bom tempo nele criando coleções e vendo belas fotos de inspiração não parece uma má ideia para alavancar a receita.
Na manga, Zuckerberg também tem a possibilidade de fazer o app interagir com os bilhões de usuários em suas outras redes sociais. Foi o que pesou para muitos que preferem o Stories ao Snapchat: a interação com o Instagram, que tem sozinho 1 bilhão de usuários. O Facebook ainda não declarou que planos tem para o Hobbi, que, ao que tudo indica, está ainda em fase de testes. A ver se o Pinterest conseguirá resistir.