Como a espionagem custou à Boeing um contrato bilionário
Revelações de Snowden acabaram enfurecendo Dilma e mudando completamente os planos de adquirir os caças F-18 Super Hornet
Da Redação
Publicado em 20 de dezembro de 2013 às 17h49.
São Paulo - Dilma Rousseff estava completamente encantada. O Brasil se empenhava havia anos para decidir que empresa escolher para fechar um contrato de mais de 4 bilhões de dólares para a compra de jatos de combate, um dos negócios mais cobiçados da setor de defesa, e que iria definir as alianças estratégicas do país nas próximas décadas.
Mas Dilma, conhecida por ser às vezes áspera e arisca com líderes estrangeiros, ficou entusiasmada depois de um encontro de 90 minutos em Brasília em 31 de maio com o vice-presidente dos Estados Unidos, Joe Biden.
Depois de Biden dar garantias de que os Estados Unidos não iriam bloquear transferências cruciais de know-how tecnológico para o Brasil se comprasse os jatos, ela estava mais perto que nunca de escolher a Boeing , com sede em Chicago, para que fornecesse o seu modelo de combate F-18 Super Hornet.
"Ela está pronta para assinar na linha pontilhada", disse na época à Reuters um dos principais assessores de Dilma. "Isso deve ocorrer em breve." E então surgiu Edward Snowden.
Documentos vazados pelo ex-prestador de serviços da Agência de Segurança Nacional (NSA), liberados nas semanas depois da visita de Biden ao Brasil, acabaram enfurecendo Dilma e mudando completamente os planos dela, disseram à Reuters várias autoridades em Brasília.
Na quarta-feira, ela surpreendeu o mundo diplomático e da defesa ao apontar a sueca Saab como fornecedora dos jatos, uma resolução que, segundo assessores, em parte foi tomada para deliberadamente esnobar os Estados Unidos.
A decisão foi uma das maiores e mais caras consequências das revelações sobre a NSA, as quais abalaram as relações de Washington com países de várias partes do mundo.
A revolta com a espionagem não foi o único motivo para a decisão de Dilma. O jato Gripen NG, da Saab, oferecia a melhor combinação de preço, transferência de tecnologia para empresas brasileiras e baixo custo de manutenção em comparação com os outros dois finalistas, a Boeing e a francesa Dassault Aviation, que oferecia o caça Rafale, disse na quarta-feira aos repórteres o ministro da Defesa, Celso Amorim.
Ainda assim, as revelações sobre a NSA foram claramente o fator determinante para Dilma, disseram autoridades brasileiras à Reuters, por razões políticas e também profundamente pessoais.
Ex-guerrilheira que nos anos 1960 combateu uma ditadura militar apoiada pelos Estados Unidos, Dilma passou os dois primeiros anos de sua Presidência se aproximando de Washington, se afastando da pressão de membros esquerdistas do Partido dos Trabalhadores e agendando uma rara visita a Washington para o final de outubro.
Os documentos de Snowden, boa parte dos quais foi publicada pelo jornalista norte-americano Glen Greenwald, residente no Brasil, revelaram que os EUA tinham espionado as comunicações pessoais de Dilma, as da estatal petrolífera Petrobras e de inumeráveis cidadãos brasileiros.
Dilma não podia entender por que Washington queria espionar um aliado com nenhuma história de terrorismo internacional, disseram assessores. Ela reagiu cancelando a visita à Casa Branca, apesar das tentativas do presidente dos EUA, Barack Obama, de atenuar suas preocupações, incluindo um encontro exclusivo à margem da cúpula do G20 na Rússia.
Esta semana ela tomou uma decisão que acreditou que iria atingir os Estados Unidos onde lhes dói mais: seu bolso.
Analistas da área da defesa tiveram dificuldades para se lembrar de algum grande contrato decidido nessa base.
"A ironia é que nós esperávamos que a política tivesse um grande papel, mas sempre em termos de promoção de investimentos, não pelo lado negativo", disse Richard Aboulafia, analista do setor aeroespacial no Teal Group. "Então, as coisas ficaram horríveis com a história da NSA."
Saga de Uma Década
A decisão final sobre os jatos não era esperada para este ano, por isso as empresas que tomaram parte da licitação ficaram surpresas quando o resultado foi anunciado. Chefes militares brasileiros disseram publicamente que Dilma os informou esta semana sobre sua decisão.
Num momento em que os Estados Unidos e países europeus estão contraindo seus orçamentos de defesa, o contrato era considerado um prêmio especialmente lucrativo.
Para diplomatas franceses, suecos e norte-americanos em Brasília, a conquista desse negócio esteve no topo de sua agenda por mais de uma década.
Com 2013 se aproximando do fim, estava acabando o tempo para que Dilma tomasse uma decisão antes do fim do ano. Esperar até 2014, ano eleitoral no Brasil, iria aumentar o escrutínio político de qualquer negócio.
Então, ela decidiu escolher o vencedor esta semana.
A Boeing estava descartada, e o Rafale era de longe o mais caro dos três jatos, disseram assessores. Isso levou ao Gripen NG, que o tempo todo fora o preferido de alguns integrantes da Força Aérea do Brasil. Muitos analistas de defesa dizem que, independentemente da política, foi uma opção sólida.
"A Suécia é um Estado não-alinhado, preenche todos os requisitos e oferece um bom pacote industrial", disse Douglas Barrie, membro sênior na área militar aeroespacial do Instituto Internacional para Estudos Estratégicos, em Londres.
São Paulo - Dilma Rousseff estava completamente encantada. O Brasil se empenhava havia anos para decidir que empresa escolher para fechar um contrato de mais de 4 bilhões de dólares para a compra de jatos de combate, um dos negócios mais cobiçados da setor de defesa, e que iria definir as alianças estratégicas do país nas próximas décadas.
Mas Dilma, conhecida por ser às vezes áspera e arisca com líderes estrangeiros, ficou entusiasmada depois de um encontro de 90 minutos em Brasília em 31 de maio com o vice-presidente dos Estados Unidos, Joe Biden.
Depois de Biden dar garantias de que os Estados Unidos não iriam bloquear transferências cruciais de know-how tecnológico para o Brasil se comprasse os jatos, ela estava mais perto que nunca de escolher a Boeing , com sede em Chicago, para que fornecesse o seu modelo de combate F-18 Super Hornet.
"Ela está pronta para assinar na linha pontilhada", disse na época à Reuters um dos principais assessores de Dilma. "Isso deve ocorrer em breve." E então surgiu Edward Snowden.
Documentos vazados pelo ex-prestador de serviços da Agência de Segurança Nacional (NSA), liberados nas semanas depois da visita de Biden ao Brasil, acabaram enfurecendo Dilma e mudando completamente os planos dela, disseram à Reuters várias autoridades em Brasília.
Na quarta-feira, ela surpreendeu o mundo diplomático e da defesa ao apontar a sueca Saab como fornecedora dos jatos, uma resolução que, segundo assessores, em parte foi tomada para deliberadamente esnobar os Estados Unidos.
A decisão foi uma das maiores e mais caras consequências das revelações sobre a NSA, as quais abalaram as relações de Washington com países de várias partes do mundo.
A revolta com a espionagem não foi o único motivo para a decisão de Dilma. O jato Gripen NG, da Saab, oferecia a melhor combinação de preço, transferência de tecnologia para empresas brasileiras e baixo custo de manutenção em comparação com os outros dois finalistas, a Boeing e a francesa Dassault Aviation, que oferecia o caça Rafale, disse na quarta-feira aos repórteres o ministro da Defesa, Celso Amorim.
Ainda assim, as revelações sobre a NSA foram claramente o fator determinante para Dilma, disseram autoridades brasileiras à Reuters, por razões políticas e também profundamente pessoais.
Ex-guerrilheira que nos anos 1960 combateu uma ditadura militar apoiada pelos Estados Unidos, Dilma passou os dois primeiros anos de sua Presidência se aproximando de Washington, se afastando da pressão de membros esquerdistas do Partido dos Trabalhadores e agendando uma rara visita a Washington para o final de outubro.
Os documentos de Snowden, boa parte dos quais foi publicada pelo jornalista norte-americano Glen Greenwald, residente no Brasil, revelaram que os EUA tinham espionado as comunicações pessoais de Dilma, as da estatal petrolífera Petrobras e de inumeráveis cidadãos brasileiros.
Dilma não podia entender por que Washington queria espionar um aliado com nenhuma história de terrorismo internacional, disseram assessores. Ela reagiu cancelando a visita à Casa Branca, apesar das tentativas do presidente dos EUA, Barack Obama, de atenuar suas preocupações, incluindo um encontro exclusivo à margem da cúpula do G20 na Rússia.
Esta semana ela tomou uma decisão que acreditou que iria atingir os Estados Unidos onde lhes dói mais: seu bolso.
Analistas da área da defesa tiveram dificuldades para se lembrar de algum grande contrato decidido nessa base.
"A ironia é que nós esperávamos que a política tivesse um grande papel, mas sempre em termos de promoção de investimentos, não pelo lado negativo", disse Richard Aboulafia, analista do setor aeroespacial no Teal Group. "Então, as coisas ficaram horríveis com a história da NSA."
Saga de Uma Década
A decisão final sobre os jatos não era esperada para este ano, por isso as empresas que tomaram parte da licitação ficaram surpresas quando o resultado foi anunciado. Chefes militares brasileiros disseram publicamente que Dilma os informou esta semana sobre sua decisão.
Num momento em que os Estados Unidos e países europeus estão contraindo seus orçamentos de defesa, o contrato era considerado um prêmio especialmente lucrativo.
Para diplomatas franceses, suecos e norte-americanos em Brasília, a conquista desse negócio esteve no topo de sua agenda por mais de uma década.
Com 2013 se aproximando do fim, estava acabando o tempo para que Dilma tomasse uma decisão antes do fim do ano. Esperar até 2014, ano eleitoral no Brasil, iria aumentar o escrutínio político de qualquer negócio.
Então, ela decidiu escolher o vencedor esta semana.
A Boeing estava descartada, e o Rafale era de longe o mais caro dos três jatos, disseram assessores. Isso levou ao Gripen NG, que o tempo todo fora o preferido de alguns integrantes da Força Aérea do Brasil. Muitos analistas de defesa dizem que, independentemente da política, foi uma opção sólida.
"A Suécia é um Estado não-alinhado, preenche todos os requisitos e oferece um bom pacote industrial", disse Douglas Barrie, membro sênior na área militar aeroespacial do Instituto Internacional para Estudos Estratégicos, em Londres.