Fábrica da BRF: plano prevê resgate dos princípios básicos de produção (Germano Lüders/Exame)
Denyse Godoy
Publicado em 5 de maio de 2019 às 08h00.
Última atualização em 5 de maio de 2019 às 10h34.
Quando o estande da BRF na Apas Show – a feira anual da Associação Paulista de Supermercados – abrir para os visitantes, amanhã às 14h, Manoel Martins, diretor comercial de autosserviço da empresa no Brasil, estará à porta recebendo pessoalmente os visitantes. Quando fechar, às 23h, o executivo será o último a sair. E deve repetir o ritual até quarta-feira, véspera do encerramento da mais importante exposição do setor no país. Depois de mais de um ano de turbulências administrativas e financeiras, a BRF, dona das marcas Sadia e Perdigão, quer voltar a chamar a atenção de varejistas e consumidores para o seu negócio: produzir alimentos.
Em abril de 2018, após meses de uma ruidosa briga entre acionistas e diretores, o presidente do conselho de administração da BRF, Abilio Diniz, foi substituído por Pedro Parente. Responsável por colocar a Petrobras de volta nos trilhos, Parente chegou com a meta de consertar estratégias erradas que haviam levado a gigante de alimentos a registrar em 2017 o maior prejuízo de sua história, de 1,1 bilhão de reais.
Enfrentando novos problemas como o envolvimento da BRF na Operação Carne Fraca da Polícia Federal, que investiga suspeitas de adulteração de laudos de inspeção sanitária de frigoríficos, o executivo deu início a uma reestruturação operacional. Trouxe de volta gestores que haviam migrado para a concorrência – entre eles, o próprio Martins, que estava na JBS – e colocou em prática um projeto de venda de ativos para reduzir o endividamento.
A participação na Apas Show vai resumir a nova estratégia da BRF, que tem como pilares segurança alimentar, integridade (observância das normas éticas) e qualidade. Com 305 metros quadrados, o estande mostra que o mercado interno brasileiro torna a ser o centro da operação. As marcas mais conhecidas da companhia, incluindo a de margarinas Qualy, têm destaque no espaço e no novo plano, com o lançamento de produtos como o hambúrguer de frango empanado da Sadia e as peças de carne suína temperadas para churrasco Perdigão.
Internamente, a reorganização da atividade da BRF busca ajustar a conexão entre cada etapa de produção, da criação de animais pelos fornecedores até o abastecimento das gôndolas nos supermercados. Um dos equívocos das gestões anteriores foi mudar o cronograma de compra de milho para os frangos, o que bagunçou a cadeia. “Estamos resgatando a essência da companhia, reconstruindo pontes, com metodologia e objetivos definidos de baixo para cima, e não o contrário”, diz Martins.
Uma das principais táticas agora é aumentar a produtividade da equipe de vendedores que faz a ponte com os comerciantes, o que demandou desde um estudo da adequação da frota de veículos que entregam os produtos para os varejistas até uma definição mais clara de metas. A comunicação sobre medidas tomadas também foi aprimorada, a fim de fortalecer o engajamento dos colaboradores de todos os departamentos.
Os investidores da BRF estão aos poucos recobrando a confiança na empresa. Tendo atingido em julho de 2018 o menor valor em nove anos, a ação da processadora de alimentos subiu 72% desde então, para 30,72 reais no fechamento de sexta-feira. No mesmo período, o Ibovespa, principal índice da bolsa brasileira, avançou 36%, para 96.007 pontos.
O papel da dona da Sadia e da Perdigão ainda está muito longe do seu pico histórico, de 70 reais, em outubro de 2015, e as dificuldades do lado administrativo não parecem de todo superadas. A empresa se vê neste momento procurando um novo diretor financeiro apenas dois meses depois de indicar para o cargo Ivan Monteiro, que renunciou em 25 de abril por estafa. Mas o pior já pode ter ficado para trás.
“Embora abaixo do potencial, os resultados devem ter tido uma melhora qualitativa no primeiro trimestre deste ano”, escreveram em relatório a clientes Thiago Duarte e Henrique Brustolin, analistas do banco de investimentos BTG Pactual. “Os aumentos de preços no ano passado e no começo de 2019 no Brasil, somados à elevação das margens do frango para níveis acima da média, devem impulsionar os ganhos antes de juros, impostos, depreciação e amortização da BRF em 5% no período de janeiro a março ante igual intervalo de 2018, para 391 milhões de reais.”
Para seguir na trajetória de recuperação, a BRF precisa que os recentes esforços em desentortar a operação comecem a dar frutos.