Negócios

Com novas marcas e acordo bilionário, Odebrecht ressurge pós-Lava Jato

Após escândalo de corrupção, companhia fez mudanças em sua estrutura, mudou nomes de marcas e espera um novo começo.

SEDE DA ODEBRECH: Recuperação judicial do grupo preocupa bancos (Odebrecht/Divulgação)

SEDE DA ODEBRECH: Recuperação judicial do grupo preocupa bancos (Odebrecht/Divulgação)

Karin Salomão

Karin Salomão

Publicado em 28 de março de 2018 às 06h00.

Última atualização em 28 de março de 2018 às 09h05.

São Paulo - Até alguns anos atrás, a Odebrecht era uma empresa praticamente desconhecida do grande público. Isso até março de 2014, quando foi deflagrada a primeira fase da operação Lava Jato, que iria mudar a história da empresa e do Brasil.

A empresa precisou vender unidades, assinou acordos bilionários, teve o herdeiro e então presidente preso e até derrubou o presidente do Peru.

Agora, a companhia está empenhada em mostrar que mudou, com novas políticas e até novos nomes para as empresas do grupo.

A operação da Polícia Federal, iniciada em 2014 e que continua até hoje, investiga um esquema de corrupção envolvendo grandes empresas e contratos com a Petrobras. De acordo com a investigação, a Odebrecht estava profundamente envolvida no escândalo - havia inclusive um departamento inteiro na empresa destinado ao pagamento de propina a políticos e funcionários da estatal.

Um ano depois do início das investigações, o então presidente do grupo, Marcelo Odebrecht, foi preso e, em março de 2016, condenado a mais de 19 anos de prisão por corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa.

Primeiras ações

Foi então que a companhia começou a mudar seu posicionamento. Em dezembro de 2016, assinou o acordo de leniência com os procuradores da Lava Jato. Na época, foi o acordo do tipo mais caro da história, ultrapassado mais tarde pelo firmado pela JBS.

Agora, em março de 2018, o acordo de leniência foi reconhecido pela Controladoria-Geral da União e a Advocacia Geral da União. No documento, a Odebrecht admite irregularidades cometidas em contratos feitos com a União e se compromete a devolver cerca de 3,8 bilhões de reais aos cofres públicos em 20 anos.

Os 77 executivos do grupo envolvidos no escândalo também assinaram, em 2016, acordos de delação premiada, como o herdeiro e ex-presidente Marcelo Odebrecht. Desses, 51 foram desligados, e os outros 26 continuam na companhia, mas sem exercer cargos executivos ou participar de decisões.

A empresa negociou acordos com o Ministério Público Federal e autoridades de diversos países, como Estados Unidos e Suíça. Ela publicou, ainda em dezembro de 2016, um pedido oficial de desculpas, em que "reconhece que participou de práticas impróprias em sua atividade empresarial". "A Odebrecht aprendeu várias lições com os seus erros. E está evoluindo", escreve ela.

Depois do pronunciamento, a corporação anunciou diversas mudanças em sua estrutura, seja ao vender ativos, criar políticas de conformidade, mudar sua política de recursos humanos e até mesmo mudar completamente o nome de algumas empresas do grupo.

O processo de recuperação da crise de imagem é longo e passa por diversas fases, diz Francine Altheman, professora de gerenciamento de crise do curso de jornalismo na ESPM. "A primeira fase foi quando a Odebrecht veio a público e pediu desculpas", afirma a professora.

Conformidade

"Quando a empresa fechou o acordo de delação e leniência, começou um grande processo de revisão de sua estrutura empresarial e de seus sistemas de conformidade", explica Marcos Lessa, diretor de marketing da holding Odebrecht S.A.

Uma das mudanças foi no âmbito do conselho de administração da companhia. Antes, a holding Odebrecht S.A. tinha papel mais ativo na operação diária das subsidiárias. Agora, "a atuação da holding passou a ser restrita ao conselho, em uma postura de arquiteta estratégica e sem intervenção direta", afirma Lessa.

Outra mudança foi a adoção da obrigatoriedade de pelo menos 20% de conselheiros independentes, sem ligação com a companhia.

Desde fevereiro de 2017, a companhia é monitorada internamente por cerca de 20 membros do Ministério Público e do Departamento de Justiça dos Estados Unidos. Eles investigarão, por três anos, os contratos, balanços, pagamentos a fornecedores, documentos e têm carta branca para entrar em qualquer lugar da companhia.

Além do monitoramento pelo governo, a Odebrecht aumentou sua equipe dedicada a conformidade. Em julho de 2017 eram 63 funcionários, enquanto em 2015 eram 30. O orçamento para essa equipe é de 64,8 milhões de reais, contra 11,3 milhões de reais em 2015, um aumento de mais de 80%.

Mudança de nome

Antes do escândalo, a Odebrecht não era uma empresa conhecida pelo grande público. As empresas da holding, de construção e óleo e gás, lidavam basicamente com outras empresas, sem contato com a população.

A primeira vez que muitos ouviram o nome da companhia foi no contexto das investigações. Isso trouxe um problema para a companhia, que ficou ligada apenas à corrupção.

Uma das estratégias usadas para mudar esse cenário é a mudança do nome das subsidiárias. Das sete empresas que ficaram no grupo, quatro já alteraram seu nome ou logo. Nos últimos meses, a Odebrecht Realizações Imobiliárias passou a se chamar OR e mudou o logo; a Braskem retirou o vermelho do seu logo, que hoje é azul e amarelo; a Odebrecht Agroindustrial virou Atvos; e a Odebrecht Óleo e Gás agora se chama Ocyan.

Essa é uma opção simples, diz o professor Sérgio Lazzarini, professor de estratégia empresarial do Insper. "Para o público, acaba sendo uma empresa nova. Quem lê bastante e se informa ainda sabe que é a mesma empresa, mas logo esquece", afirmou.

De acordo com Francine Altheman, da ESPM, "a Odebrecht tinha uma história antes da crise, mas ela não foi contada". Quando uma empresa é conhecida positivamente pelo público, ela tem menos impacto em sua imagem em uma crise, explica a professora.

A mudança dos nomes das marcas, acredita, é principalmente voltada ao grande público, para mudar a imagem que as pessoas têm da companhia. "Em relação às outras empresas, não dá para enganá-las mudando os nomes dos negócios. Mas, como elas já conheciam a Odebrecht antes dos escândalos, continuam fazendo negócios com ela", afirma Altheman.

O diretor de marketing da Odebrecht S.A. reforça que cada companhia teve autonomia para fazer ou não a própria mudança e que não há discussões para mudar o nome da holding.

Algumas marcas ainda foram vendidas, para gerar caixa para a empresa. Nos últimos anos, a companhia vendeu divisões de negócios e participações em projetos, como a Odebrecht Ambiental, arrematada por 2,5 bilhões de reais; a Embraport, que foi comprada pela DP World; o Complexo Eólico Corredor do Senandes; e a sua participação na concessionária RIOgaleão, responsável pelo Aeroporto Internacional Tom Jobim, no Rio de Janeiro, que pertencia à Odebrecht Transport.

A companhia também reestruturou as dívidas de algumas de suas subsidiárias, como a Odebrecht Óleo e Gás.

Política de pessoas

A mudança na política de pessoas é a mais recente. A primeira grande diferença entre a política nova e a antiga é o tamanho dos documentos.

Grande parte da política era - e ainda é - baseada em um livro escrito pelo engenheiro civil Norberto Odebrecht, fundador da empresa, dividido em três volumes de 200 páginas, em média, cada.

O livro, cujo título é "Sobreviver, Crescer e Perpetuar", contém a Tecnologia Empresarial Odebrecht (TEO). "Mas o livro não é lido com tanta frequência. Além disso, a política anterior era muito longa, com um nível de detalhe que não era convidativo à leitura", afirmou Daniel Vilar, vice-presidente de pessoas e organização da Odebrecht S.A.

Para que as pessoas lessem os documentos com mais frequência, a nova versão é bem mais resumida. Ao invés de 23 pontos, agora são apenas oito, em 19 páginas.

A empresa também se esforça para passar o conteúdo dessas políticas de maneira mais simples, por meio de vídeos ou por treinamentos internos. O primeiro treinamento foi sobre conformidade, diz o diretor. Para garantir que a política será seguida, o diretor diz que há mecanismos e processos internos, mas não dá mais detalhes.

No entanto, Vilar garante que não foram as políticas anteriores que levaram a atos de corrupção dentro da empresa. “Os erros do passado não têm nada a ver com a falta de cultura. O que aconteceu é que a empresa fez escolhas erradas”.

Com as diversas mudanças que realizou em sua estrutura nos últimos anos, a empresa quer convencer de que não optará mais por este caminho.

Acompanhe tudo sobre:Corrupçãogestao-de-negociosNovonor (ex-Odebrecht)Operação Lava Jato

Mais de Negócios

15 franquias baratas a partir de R$ 300 para quem quer deixar de ser CLT em 2025

De ex-condenado a bilionário: como ele construiu uma fortuna de US$ 8 bi vendendo carros usados

Como a mulher mais rica do mundo gasta sua fortuna de R$ 522 bilhões

Ele saiu do zero, superou o burnout e hoje faz R$ 500 milhões com tecnologia