Cerveja de milho e Heineken: por que a Ambev sofrerá para se recuperar
A Ambev corre para se adaptar ao novo cenário, com foco em marcas premium, mas com a concorrência mais acirrada pode ter dificuldades para recuperar espaço
Karin Salomão
Publicado em 23 de janeiro de 2020 às 11h59.
Última atualização em 23 de janeiro de 2020 às 13h28.
São Paulo — A Ambev já não é mais o modelo de eficiência a toda prova que era há cinco anos. Ainda que a fabricante de cervejas tenha cerca de 60% do mercado brasileiro, o setor mudou completamente. Cervejarias artesanais e brewpubs, além da grande concorrente Heineken , têm ganhado mercado e a preferência dos consumidores.
A companhia está correndo para se adaptar ao novo cenário, com foco em cervejas premium, mas com a concorrência mais acirrada pode ter dificuldades para repassar margens e recuperar resultados. É o que diz um relatório da casa de análise Nord Research, assinado pelo sócio-fundador Bruce Barbosa.
"A Ambev está exposta, com uma participação de mercado mais que relevante. Mesmo com o crescimento econômico, a Ambev terá problemas para crescer. O consumidor quer mais variedade, não quer mais suco de milho", diz o relatório. A Heineken, assim como outras cervejarias, também usa cereais não malteados em algumas de suas marcas, como a Schin, por exemplo. Mas a força de sua marca principal é a maior ameaça à dona de Skol, Brahma e Stella Artois.
Se nos últimos 10 anos o valor de mercado da Ambev cresceu 302% e o Ibovespa , 70%, nos últimos cinco anos o Ibovespa cresceu 140%, enquanto a Ambev subiu apenas 31%.
Mais variedade e qualidade
A variedade de opções de cervejas, estilos e preços é uma característica de mercados desenvolvidos, explica o relatório, como República Tcheca, Alemanha, e Áustria. Já o Brasil está no meio de seu ciclo de desenvolvimento do setor.
Um dos desafios atuais da Ambev é ampliar o seu portfólio para marcas mais premium e de melhor qualidade. A rejeição dos consumidores da cerveja com adição de milho, o que acontece no caso de algumas linhas populares da companhia, abriu espaço para outras variedades, como as cervejas de puro malte."A Ambev focou mais nos custos que na qualidade e abriu espaço para a entrada da competição", diz o documento.
De alguns anos para cá, a Ambev trouxe para o seu portfólio marcas como Corona e Colorado e expandiu suas marcas globais. No terceiro trimestre do ano, a companhia disse que o segmento premium apresentou crescimento de dois dígitos.
Recentemente, a Ambev tem ampliado a abertura de bares voltados para cervejas especiais. A mais recente empreitada são os bares Vista Corona, voltados para a cerveja Corona. Existem ainda os bares da Goose Island e da Heogaarden, além da rede de franquias o Bar do Urso, voltada à cerveja Colorado.
Margens mais apertadas
A empresa não perde apenas espaço de mercado. Sua margem também caiu nos últimos cinco anos, de 47,5% em 2015, para 38,7% nos nove primeiros meses de 2019.
Isso porque cerca de metade dos custos para fabricar uma cerveja são dolarizados e, desde 2015, o dólar saiu de R$ 2,6 para R$ 4,10. Além disso, com a concorrência maior, a empresa perde capacidade de repassar os preços ao consumidor.
A expectativa do mercado, compilada pela Bloomberg, é de um crescimento de 8% no Ebitda e de 10% no lucro para 2020. Em 2019, a receita líquida cresceu 7,4% nos três primeiros trimestres, enquanto o lucro líquido aumentou 1,1% no mesmo período. A margem bruta foi de 58,4% nos nove primeiros meses do ano, ante 61,4% no mesmo período do ano anterior.
De acordo com o relatório, o mercado não está muito otimista com a Ambev e há outras empresas com ações mais baratas e com maior potencial de crescer -- e não só no mercado de bens de consumo.