CEO da Dentsu se demite após suicídio de funcionária
Tadashi Ishii disse que deveria assumir a responsabilidade por não ter conseguido acabar com a "cultura de horas extras notoriamente punitiva" da empresa
Luísa Melo
Publicado em 29 de dezembro de 2016 às 18h46.
Última atualização em 29 de dezembro de 2016 às 20h25.
São Paulo - O presidente da Dentsu, maior agência de publicidade do Japão e uma das gigantes do setor no mundo, renunciou ao cargo depois que uma funcionária se suicidou por trabalhar demais.
Tadashi Ishii anunciou sua saída na noite de quarta-feira (28). Segundo o Financial Times, ele disse que deveria assumir a responsabilidade por não ter conseguido acabar com a "cultura de horas extras notoriamente punitiva" da empresa.
"Apesar de ter tomado várias medidas, não conseguimos uma reforma dramática para o excesso de trabalho", disse o executivo, de acordo com o jornal britânico.
Em nota publicada nesta quinta-feira (29), a Dentsu informou que a demissão de Ishii ocorrerá na assembleia do conselho de administração, em janeiro, e que um sucessor será anunciado imediatamente após a reunião.
Matsuri Takahashi, de 24 anos, trabalhava na divisão de publicidade digital da Dentsu. Ela tirou a própria vida após trabalhar nove meses na empresa, no Natal do ano passado, em Tóquio, segundo o The Japan News.
No mês que antecedeu sua morte, a funcionária havia feito 105 horas extras e tinha escrito diversos e-mails para sua mãe contando os problemas de sua vida profissional, conforme advogados da família relataram ao FT.
"Como uma recém-contratada, ela (Matsuri Takahashi) estava trabalhando no seu extremo, mas estava sendo tratada como qualquer outro funcionário. Não acho que é exagero descrever a situação como um assédio moral", disse Ishii, ainda conforme o FT.
Problema crônico
A renúncia de Ishii à presidência da Dentsu foi comunicada no mesmo dia em que o Ministério do Trabalho japonês levou a agência e um de seus executivos (o supervisor de Takahashi) à Justiça por conta do caso.
Em novembro, o órgão fez uma batida surpresa na companhia e descobriu que mais de 30 empregados eram forçados a trabalhar exaustivamente, ferindo a lei. Eles chegavam a fazer mais de 100 horas extras por mês, assim como a funcionária que se matou.
O problema é antigo na Dentsu. Em 2000, ela foi responsabilizada pelo suicídio do jovem Ichiro Oshima, também de 24 anos, ocorrido em 1991. A Suprema Corte do Japão considerou que a empresa foi negligente ao não prever o incidente, já que o funcionário demonstrava sinais de depressão por excesso de trabalho.
A cultura de trabalhar diversas horas seguidas é comum no Japão e todo o país está em alerta por conta do fenômeno das mortes relacionadas a esse problema, conhecido como "karoshi", que já é considerado uma doença profissional.
Todos os anos, centenas de profissionais perdem a vida por conta do excesso de trabalho no país, seja por suicídio, ataque cardíaco ou AVC (acidente vascular cerebral).
De acordo com uma pesquisa feita pelo governo japonês e divulgada pelo Guardian, 20% da força de trabalho do país corre risco de sofrer "karoshi".
O mesmo documento mostrou que 22,7% das empresas nipônicas admitem que alguns de seus funcionários fazem mais de 80 horas extras por mês, o limite para que a saúde fique comprometida.