Bancos públicos ficam no fim da fila de credores da Odebrecht
BNDES, Banco do Brasil e Caixa têm quase R$ 17 bilhões de dívidas a receber da companhia, que pediu recuperação judicial esta semana
Estadão Conteúdo
Publicado em 19 de junho de 2019 às 11h37.
Última atualização em 19 de junho de 2019 às 13h31.
São Paulo — Os bancos públicos e o fundo de investimento do FGTS (FI-FGTS) são os maiores credores do Grupo Odebrecht S.A. sem garantias reais, como ações e imóveis. Essas instituições detêm quase R$ 17 bilhões de dívidas nessa categoria dentro da recuperação judicial da companhia, que foi aceita ontem pela Justiça. O processo da Odebrecht , que tem dívidas de R$ 98,5 bilhões, é considerado o maior da história.
Sem garantias, os bancos públicos vão para o fim da fila de pagamento dos credores, na frente apenas dos acionistas. Além disso, deverão ter um desconto grande sobre o valor principal, dependendo das negociações na assembleia. Nessa categoria de empréstimos, o maior credor é o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social ( BNDES ). A instituição tem cerca de R$ 7 bilhões em créditos da Odebrecht. Em seguida, aparece o Banco do Brasil, com R$ 4,75 bilhões; e a Caixa, com R$ 4,13 bilhões. O crédito do FI-FGTS é de R$ 902 milhões.
Na outra ponta, estão os bancos privados - Bradesco, Santander e Itaú. Juntos, eles têm uma dívida a receber de R$ 1,3 bilhão, sem garantias. Em contrapartida, detêm um crédito de R$ 8,4 bilhões, com garantias, sobretudo em ações da Braskem. No caso de Bradesco e Itaú, que têm o maior montante segurado com os papéis da petroquímica, o valor foi elevado em 2018, quando os dois bancos aceitaram fazer um novo aporte de R$ 2,6 bilhões no grupo.
Do total de R$ 14,5 bilhões de dívidas com garantias, que não entraram na recuperação judicial, os bancos públicos possuem fatia de apenas R$ 6 bilhões.
Contestação
O BNDES contesta as informações do processo judicial. Em nota, o banco de fomento afirmou que todas as operações firmadas com a Odebrecht têm garantias reais e pessoais. "O banco apresentará sua manifestação no âmbito da recuperação judicial de modo a obter o correto reconhecimento do valor, classificação dos seus créditos." A Caixa informou que a operação é protegida por sigilo bancário, e, por isso, não se manifestaria. BB e bancos privados não comentaram.
Segundo especialistas, a prática de conceder crédito sem garantias não é incomum. Em muitos casos, os bancos avaliam o risco da empresa e, em vez de exigir garantias, incluem nos contratos os chamados covenants - cláusulas com indicadores financeiros que não podem ser descumpridos sob pena de o vencimento de dívidas ser antecipado. Vale e Petrobrás, por exemplo, têm boa parte da dívida atrelada apenas a esses mecanismos, segundo um especialista em estruturação de dívida.
A Odebrecht fazia parte desse rol de empresas. Em determinado momento, com o forte crescimento econômico e a expansão dos negócios do grupo, as instituições estavam "confortáveis com o risco da empresa", disse um executivo de um grande banco. A companhia dava garantias específicas para alguns projetos, mas pegava muita dívida corporativa sem garantia. Exemplo disso, é que entre 2008 e 2015, o endividamento do grupo saltou de R$ 18 bilhões para R$ 110 bilhões.
No caso do BNDES, há um agravante: além de conceder financiamentos para projetos específicos, como hidrelétricas e rodovias, que tinham como garantia a própria receita do negócio, o banco também dava garantias para contratos da empresa com terceiros. Ou seja, se hoje a Odebrecht não pagar um determinado contrato, quem pagará a conta é o BNDES, afirma um advogado.
Impacto
Apesar da dívida bilionária, a recuperação judicial da Odebrecht deve ter impacto limitado nos grandes bancos, segundo a casa de análise financeira Eleven Financial. Isso porque as instituições já separaram recursos para eventuais calotes. "Hoje, eles apresentam níveis de provisionamento mais elevados em relação aos patamares de 2015-2016, período em que sofreram impactado de alguns casos decorrentes da Lava Jato", diz a analista Tatiana Brandt, em relatório ao mercado.
Os empréstimos da Odebrecht com bancos brasileiros totalizam cerca de R$ 32 bilhões. Segundo Tatiana, o BB deve ser o principal prejudicado, já que detém a maior exposição, com menor garantia e sem reserva de provisão adicional. Segundo ela, seus pares privados guardaram recurso em excesso para ser absorvido: Bradesco tem R$ 6,9 bilhões, Itaú, R$ 5,9 bilhões, e Santander, R$ 1,6 bilhão.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.