A Cadillac demorou, mas entrou no mercado de SUVs
A principal marca de carros de luxo norte-americana relutou, mas se rende à moda dos utilitários esportivos
Da Redação
Publicado em 26 de maio de 2018 às 09h06.
Última atualização em 26 de maio de 2018 às 11h50.
Quando a General Motors recrutou Johan de Nysschen, importante executivo da indústria automobilística, para chefiar a Cadillac em 2014, ele esperava produzir toda uma frota de novos veículos utilitários para reforçar a posição enfraquecida da marca de luxo.
Enquanto aguardava por reforços, a Cadillac perseverou na legião de sedãs esportivos muito elogiados, o tipo de veículo maravilhosamente projetado que seus rivais alemães teriam orgulho de ter feito.
Agora, porém, a Cadillac se vê ultrapassada por utilitários esportivos alemães e asiáticos, e os chefes da General Motors afastaram o homem que já foi visto como o futuro da empresa. E a principal marca de carros de luxo norte-americana precisa aceitar uma verdade desconfortável.
“A Cadillac simplesmente não está vendendo o que as pessoas querem comprar hoje, principalmente nos EUA”, explicou Karl Brauer, editor executivo do Kelley Blue Book.
A General Motors atraiu de Nysschen – um raro forasteiro da companhia a liderar uma divisão da GM – por causa da força de seu sucesso à frente da Audi of America. Seu primeiro ato importante foi colocar uma distância física e psicológica entre a Cadillac e Detroit, mudando a sede para Manhattan em 2015. Um dos resultados foi uma ação de marca – mas não um showroom de vendas – chamado Cadillac House.
De Nysschen acreditava que em Nova York a Cadillac iria contratar os principais talentos, descobrir as tendências dos consumidores e conquistar os compradores da costa que a empresa vinha lutando para atrair. Ele também delineou os planos da GM para investir US$12 bilhões até 2020 a fim de desenvolver oito modelos novos da Cadillac, entre eles o tipo de utilitário esportivo crossover que continuava claramente ausente de sua linha.
“Como é possível termos tão poucos crossovers nesta marca de luxo icônica dos EUA?”, perguntou de Nysschen em uma entrevista na época. “Os alemães possuem mais do que eu posso contar em duas mãos.”
Somente na BMW, essa conta inclui o X1, X2, X3, X4, X5 e o X6, e o mais caro, o X7 de três fileiras de bancos, que será lançado no ano que vem. Tudo isso em uma marca alemã que construiu sua reputação com sedãs esportivos de alto desempenho e foi criticada por ceder ao gosto dos norte-americanos produzindo veículos esportivos. Em contraste, enquanto a GM é conhecida por sua expertise em veículos utilitários esportivos e caminhões, a Cadillac tem somente um carro desse tipo: o XT5 de porte médio, que apenas substituiu o defunto SRX.
Mesmo enquanto as marcas de luxo rivais ganhavam dinheiro com utilitários esportivos menores, a Cadillac só mostrou seu primeiro compacto crossover, o XT4 2019, em março, na New York International Auto Show. E, o que talvez seja mais intrigante, o maior sucesso da história de utilitários da Cadillac, o Escalade, agora está sendo ofuscado pelo incandescente Navigator, da Lincoln, cujo estilo e interior luxuosos impressionaram críticos e compradores.
O resultado é que a Cadillac, uma marca que havia começado a transformar sua imagem insípida, a de fabricante de carros para aposentados, após o retorno da GM depois da falência, está passando por dificuldades. Suas vendas anuais domésticas haviam se recuperado de cerca de 110 mil na crise da recessão de 2009 para mais de 180 mil em 2013. Mas as vendas despencaram para 156 mil em 2017, mesmo com as marcas alemãs crescendo. Na corrida das marcas de luxo, a Mercedes aumentou as vendas de sua própria linha de utilitários esportivos para 337.236 unidades em 2017, enquanto a BMW encontrou 305.685 compradores, superando a Lexus, que vendeu 305.132.
Agora, a liderança da GM substituiu o sul-africano de Nysschen por Steve Carlisle, presidente da General Motors Canada, que entrou na empresa há 36 anos. Em um comunicado, Dan Ammann, presidente da GM, disse que de Nysschen havia estabelecido uma “base mais sólida” para a Cadillac.
“Olhando para o futuro, o mundo está mudando rapidamente e, a começar com o lançamento do novo XT4, é importante que a gente capitalize imediatamente as oportunidades que surgem com essa mudança”, disse Ammann.
O XT4 2019 finalmente começará a ser vendido no outono, com preço a partir de US$37.790, e vai precisar abrir caminho em meio a um grupo lotado de utilitários esportivos compactos. O XT6 de três fileiras de bancos também está sendo projetado, mas não será lançado até 2020, segundo George Peterson, presidente da AutoPacific, uma empresa de pesquisa automotiva. Peterson já conta 38 crossovers pequenos no mercado, com preços entre US$20 mil e mais de US$90 mil, e diz que o número deve chegar a 45 em breve.
“A Cadillac está reconhecendo que este é um mundo crossover, mas eles foram lentos para se mexer. Agora vão fazer o lançamento em um campo de batalha muito competitivo”, disse Peterson.
A Cadillac talvez tenha perdido a chance de se mover mais rapidamente.
Depois de ter sido contratado, de Nysschen tentou persuadir a liderança da GM a colocar os utilitários esportivos na frente da linha de desenvolvimento, segundo dois funcionários da empresa, que pediram para não ter seus nomes divulgados porque não estão autorizados a discutir questões internas. Os sedãs e os cupês tradicionais que já se encontravam na linha de produção, entre eles o carro-chefe CT6, continuaram sendo montados. Apesar dos comentários extremamente positivos, não venderam tanto porque os consumidores estavam mais apaixonados pelos utilitários esportivos.
Outro ex-executivo da GM, Robert A. Lutz, entende a situação enfrentada por de Nysschen. Lutz, que também foi executivo da Chrysler e da BMW, era um forasteiro que gerava grandes expectativas quando a General Motors pediu que saísse da aposentadoria, em 2001, e o nomeou vice-presidente, dando a ele amplo controle sobre os projetos e a linha de produtos da empresa. De Nysschen, no entanto, segundo Lutz, não tinha poder de veto e precisava responder a vários executivos de escalões mais altos.
“Johan foi um executivo muito hábil, certamente capaz de liderar uma marca diferenciada. Mas nunca esteve realmente no comando”, diz Lutz.
Brauer, editor do Kelley Blue Book, criticou duramente a mudança da Cadillac para Nova York como um ato de fachada. Talvez fizesse sentido, disse ele, se a marca tivesse montado estúdios de design ou de engenharia em Nova York, mas esses elementos-chaves da criatividade automotiva permaneceram em Detroit. A mudança de endereço pareceu uma continuação duvidosa, afirmou Brauer. Entre seu tempo na Audi e o na Cadillac, de Nysschen liderou a Infiniti, onde convenceu a empresa-mãe, a Nissan, a mudar sua sede de luxo do Japão para Hong Kong.
Alguns observadores culpam de Nysschen por fazer muito esforço perseguindo os alemães, inclusive desafiando-os em seu próprio território: o famoso circuito de Nürburgring. O CTS-V da Cadillac, com 640 cavalos de potência e quase 320 quilômetros por segundo, tornou-se o primeiro sedã em produção a percorrer a pista de 20,8 quilômetros em menos de oito minutos.
Lutz, no entanto, que construiu sua própria reputação na indústria como um verdadeiro “sujeito do carro” ao lançar lendas de desempenho como o Viper, da Dodge, e o CTS-V, disse que a maioria dos compradores de luxo de hoje ignora as nuances de velocidade ou manuseio.
“Nem um em mil americanos sabe onde fica Nürburgring”, afirmou.
Quando foi contratado, de Nysschen disse que a Cadillac seria uma alternativa distintamente norte-americana, igualando qualquer rival em design, qualidade e desempenho. Por e-mail, porém, de Nysschen rejeitou a ideia de que a Cadillac “estava tentando ‘perseguir os alemães'”.
“A equipe quer alavancar um patrimônio americano único”, escreveu, reconstruindo a reputação de excelência da Cadillac em áreas como técnica, adequação e acabamento.
“Acredito que seja uma busca nobre, digna de uma marca icônica como a Cadillac.”
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