Donald Trump; Bob Woodward (Montagem/Exame)
EFE
Publicado em 9 de março de 2019 às 15h19.
Última atualização em 9 de março de 2019 às 15h27.
Washington - Uma das vozes mais respeitadas da história do jornalismo americano, Bob Woodward, não esconde sua preocupação com uma Casa Branca liderada por Donald Trump, que através do terror tenta ocultar o fato de "não saber governar".
"O problema é que temos uma crise de governo porque (Trump), como presidente, utiliza - em certa medida - todos os abusos, os tweets, as declarações furiosas e os insultos como fantasia. Está ocultando o simples fato de que não sabe governar", advertiu o veterano repórter do "The Washington Post".
Woodward recebeu a Agência Efe em seu imponente casarão do bairro de Georgetown, em Washington, para falar de seu último livro: "Fear: Trump in the White House" (Medo. Trump na Casa Branca), Rocha Editora, 2018.
Na obra, o jornalista de 75 anos retrata uma Casa Branca caótica, marcada pela política impulsiva ditada por um líder que gosta de "arriscar e apostar com algumas de suas ideias", frente a assessores que não se atrevem a questioná-lo.
É por isso que, segundo relata o livro, alguns de seus colaboradores optam por ocultar documentos ou diretamente ignoram as ordens do líder.
De acordo com o jornalista - que revelou junto com seu companheiro Carl Bernstein o escândalo do Watergate que acabou custando a presidência a Richard Nixon em 1974 - foi o próprio Trump quem inspirou o título de seu novo livro ao dizer a Woodawrd em uma ocasião que, desde seu ponto de vista, "o autêntico poder é o medo".
Para elaborar o relato, Woodward manteve várias entrevistas com pessoas próximas ao presidente que aceitaram falar em condição de anonimato, um recurso que foi frequentemente criticado por um Trump imerso em uma cruzada contra a imprensa, à qual costuma se referir como "fake news" (notícias falsas).
"Se vai a Casa Branca e pede a um membro do Gabinete a verdadeira história e poder citar 'on the record', o que consegue é um comunicado de imprensa, é uma m****", lamenta.
Apesar de o laureado jornalista sustentar que suas fontes foram "testemunhas importantes", reconhece que a chave da credibilidade do seu livro é que, além de declarações reveladoras, forneceram "muitos documentos, notas, diários e entrevistas", que respaldam sua investigação.
No entanto, ao escritor não surpreende que Trump tenha iniciado uma guerra contra este tipo de jornalismo, já que o mesmo pode revelar alguns dos segredos mais obscuros de qualquer organização e do qual Woodward, como jornalista, aponta como sua "principal preocupação": os segredos do Governo.
"É a velha estratégia usada por Nixon durante o Watergate - aponta - faz com que o comportamento da imprensa seja o problema, ao invés da conduta do presidente".
A referência ao ex-presidente não é superficial. E a experiência do veterano repórter parece especialmente oportuna em um momento no qual o Capitólio respira certo aroma de processo de destituição contra Trump.
"É possível, mas vai depender da qualidade das provas", avalia Woodward antes de dizer que por enquanto não existem evidências de que Trump tenha cometido nenhum crime.
"Segundo avançamos, veremos se há testemunhas, documentos, gravações secretas... mas tudo isso será resolvido pelo aparelho político".
No entanto, Woodward reconhece que a situação de divisão social que o país atravessa, entre "muita gente que pensa que Trump não pode fazer nada bom e muita gente que pensa que não pode fazer nada ruim", pode representar um problema.
É aí, novamente, onde o jornalismo deve ter um papel fundamental; mas para isso, diz, também os repórteres deverão deixar de um lado suas emoções.
"O que necessitamos fazer é tomar calmantes e manter a tranquilidade, nos fixar no que são os fatos e não no que dita nossa opinião política ou qual a reação emocional a Trump".
Com três investigações em andamento, testemunhos de antigos colaborares que acusam Trump de ser um vigarista, um misógino e um racista, e centenas de artigos colocando em dúvida os supostos vínculos do líder com o Kremlin, cabe perguntar o que mais é necessário para que o Congresso inicie um processo político para a sua destituição. Uma gravação, talvez?
"Grande pergunta. Há algo nas gravações, uma pureza evidente, e é possível autenticá-la e não só escutar o que aconteceu, mas também o tom e a natureza da relação sobre a qual as pessoas estão falando...", conclui Woodward com um certo ar de nostalgia no olhar pela lembrança das fitas que silenciaram Nixon. EFE