EUA: a surpreendente vitória do magnata imobiliário desestabilizou, entretanto, muitas mulheres que ficaram indignadas (Getty Images)
AFP
Publicado em 10 de novembro de 2016 às 16h49.
Apesar das acusações de agressão sexual, das declarações misóginas e sua polêmica posição sobre o aborto, Donald Trump conquistou a Casa Branca graças, em parte, ao voto feminino, que se pensava ser massivamente inclinado à sua adversária Hillary Clinton.
A democrata conquistou 54% dos votos das mulheres, mas Trump conseguiu 42%, mais do que o esperado, de acordo com os números de bocas de urna da emissora CNN.
Mais da metade das mulheres brancas apoiaram o candidato republicano, segundo a CNN, e 62% não possuem título universitário.
Esses resultados contradizem os prognósticos segundo os quais as declarações sexistas do republicano durante a campanha - incluindo uma gravação de 2005 onde se gaba por ter agarrado uma mulher por entre as pernas - levariam as mulheres a fazer de Hillary a primeira presidente dos Estados Unidos.
Para os especialistas, os resultados das eleições mostram que os eleitores se concentraram em economia, emprego, imigração e no medo de atentados muito mais do que no próximo inquilino da Casa Branca ser uma mulher ou um homem.
A condição social primeiro
Apesar dos ferozes tuítes contra a ex-Miss Universo Alicia Machado, ou das declarações sobre a menstruação de uma jornalista de televisão, que enfureceram muitas eleitoras, isso "não gerou uma grande irmandade", disse Diane Heith, professora de Ciências Políticas na Universidade de St. John, em Nova York.
"A forma como tratava as mulheres não escondeu os pontos importantes para seu eleitorado: a condição social, a impressão de ser desprezado pelas elites, de a maneira como Hillary age", acrescentou.
A surpreendente vitória do magnata imobiliário desestabilizou, entretanto, muitas mulheres que ficaram indignadas pelo fato de muitas mulheres não terem castigado o futuro presidente por sua atitude machista.
"Mais da metade das mulheres brancas votaram em um homem que se gabava em um vídeo de ter cometido agressões sexuais, que disse que nomearia um juiz para a Suprema Corte que anularia a sentença 'Roe v. Wade', que legalizou o aborto, e que passou 30 anos diminuindo as mulheres publicamente a seus atributos sexuais", escreveu L.V. Anderson em um artigo no site da revista Slate.
"As mulheres brancas traíram suas companheiras, seu país e a elas mesmas", acrescentou.
O aborto
Uma das preocupações pelos direitos das mulheres se relacionam com a posição que Trump adotará a respeito do aborto, uma vez que esteja no Salão Oval.
Trump se posicionou mais à direita sobre esse tema durante a campanha, chegando a sugerir inclusive que concordaria em submeter as mulheres a "alguma forma de castigo" se o aborto fosse proibido.
Após a polêmica, ele se retratou. Mas a influência de seu vice-presidente, Mike Pence, que coloca à frente seu ponto de vista religioso e socialmente muito conservador, ainda não está clara.
Como governador da Indiana, Pence impulsionou medidas entre as mais restritivas do país contra o aborto e para privar de financiamento os centros de planejamento familiar, onde os abortos são feitos.
"Os americanos que zelam por suas liberdades reprodutivas deveriam se preocupar com a presidência Trump-Pence", assegura Heith.
Juliet Williams, professora de Estudos sobre a Mulher na UCLA, destaca que o voto das mulheres surpreendentemente forte para Trump reflete uma leitura errônea do voto feminino.
"A tese que se instalou muito rapidamente na campanha era que o voto a favor de Trump vinha de homens brancos cansados, como os mineiros de carvão na Virgínia Ocidental ou os trabalhadores da indústria automotriz em Michigan" e isso omitiu o fato de que "as mulheres brancas enojadas também tinham peso eleitoral".
Este esquecimento, segundo a especialista, foi o que custou a Casa Branca a Hillary Clinton.