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Polícia vira alvo no Egito após massacre no estádio

Tragédia fez aumentar a revolta da população contra as forças de segurança, vistas como um herança da ditadura de Hosni Mubarak

Manifestantes protestaram contra a falta de segurança no Egito após as mortes no Estádio de Port Said (Khaled Desouki/AFP)
DR

Da Redação

Publicado em 2 de fevereiro de 2012 às 14h09.

Cairo - A tragédia no estádio de Port Said colocou as forças de segurança do Egito mais uma vez no alvo da ira popular, diminuindo ainda mais os níveis mínimos de aceitação que possuíam após as revoltas que derrubaram o regime de Hosni Mubarak.

A Revolução de 25 de Janeiro não depôs apenas o ex-presidente. Também varreu o pouco prestígio da polícia mais conhecida por suas arbitrariedades e torturas que por serem fiadores da segurança cidadã.

Em seus últimos dias como presidente, o próprio Mubarak elegeu o Ministério do Interior como bode expiatório, ao retirar todos os policiais das ruas, três dias depois do início dos protestos, e encarregar o Exército da manutenção da ordem.

A partir de então, a Polícia ganhou uma irrelevância perto da invisibilidade, o que fez disparar no Egito a percepção subjetiva de insegurança.

Uma pesquisa do instituto Gallup realizada no ano passado apontou que a sensação de insegurança entre os cidadãos tinha passado de 17% antes da revolução para 39% depois.

Mas não se trata apenas de uma avaliação pessoal. O virtual desaparecimento das forças de segurança teve efeitos muito mais visíveis como um maior caos circulatório e o aumento da delinquência urbana, principalmente nos bairros pobres.

Apenas em algumas ocasiões, como nos protestos da praça Tahrir nos meses de novembro e dezembro, as forças de segurança recuperaram seu protagonismo, com a brutal repressão aos manifestantes que protestavam contra a Junta Militar que dirige o Egito.

Na primeira linha de batalha, tanto nessas manifestações como nas que provocaram a queda de Mubarak há um ano, estavam exatamente os torcedores do clube cairota Al Ahly, que foram alvo ontem à noite da ira dos torcedores do Al Masry em Port Said.

O presidente da Câmara Baixa do Parlamento egípcio, o islamita Saad Katatny, atualmente a mais alta autoridade escolhida pelo povo, situou o ponto de mira nas forças de segurança.

Em um duro discurso hoje durante uma sessão extraordinária do Parlamento, Katatni, membro dos Irmãos Muçulmanos, atribuiu a tragédia de Port Said, que terminou com mais de 70 mortes, à 'deficiência e negligência' das forças da ordem.


O político considerou que os agentes de segurança 'não cumpriram nem com sua missão nem com sua profissão pela falta de organização perante estes eventos'.

Segundo algumas testemunhas disseram à Agência Efe, os torcedores do Al Masry não encontraram nenhuma resistência por parte das dezenas de agentes antidistúrbios no campo quando invadiram o gramado após o jogo para linchar os jogadores do Al Ahly.

Os meios de comunicação independentes também não pouparam críticas ao papel da Polícia, e o jornal 'Asshuruk' viu em Port Said uma reedição da chamada 'Batalha do Camelo', que justamente hoje completa um ano.

Nesse dia, dezenas de seguidores de Mubarak entraram na praça Tahrir em cima de camelos e cavalos para tentar semear o pânico entre os milhares de manifestantes que reivindicavam uma mudança de regime.

O certo é que as promessas da Junta Militar sobre uma investigação entre os altos cargos da Polícia não parece ter mudado muitas coisas em um órgão que ainda é visto como partidário do antigo regime.

Em dezembro do ano passado, o primeiro-ministro egípcio, Kamal al Ganzuri, designou ministro do Interior o general Mohammed Ibrahim Yousef, que tinha sido chefe da polícia da província de Guiza até 2000 e posteriormente responsável por Assuntos Penitenciários.

Em julho, o antigo ministro do Interior, Mansur Esawi, outro veterano do antigo regime, anunciou com estardalhaço a 'maior substituição de altos oficiais na história do departamento', mas essa mudança ainda não foi sentida.

Muitos blogueiros e ativistas se perguntam hoje no Egito como é possível que as eleições legislativas sejam realizadas à revelia dos incidentes, e, no entanto, possa acontecer uma tragédia como a de ontem à noite diante da impassibilidade policial.

À beira de um ataque de nervos, o Egito acumula hoje muitas mais perguntas que respostas em sua duvidosa e turbulenta transição. EFE

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Em seus últimos dias como presidente, o próprio Mubarak elegeu o Ministério do Interior como bode expiatório, ao retirar todos os policiais das ruas, três dias depois do início dos protestos, e encarregar o Exército da manutenção da ordem.

A partir de então, a Polícia ganhou uma irrelevância perto da invisibilidade, o que fez disparar no Egito a percepção subjetiva de insegurança.

Uma pesquisa do instituto Gallup realizada no ano passado apontou que a sensação de insegurança entre os cidadãos tinha passado de 17% antes da revolução para 39% depois.

Mas não se trata apenas de uma avaliação pessoal. O virtual desaparecimento das forças de segurança teve efeitos muito mais visíveis como um maior caos circulatório e o aumento da delinquência urbana, principalmente nos bairros pobres.

Apenas em algumas ocasiões, como nos protestos da praça Tahrir nos meses de novembro e dezembro, as forças de segurança recuperaram seu protagonismo, com a brutal repressão aos manifestantes que protestavam contra a Junta Militar que dirige o Egito.

Na primeira linha de batalha, tanto nessas manifestações como nas que provocaram a queda de Mubarak há um ano, estavam exatamente os torcedores do clube cairota Al Ahly, que foram alvo ontem à noite da ira dos torcedores do Al Masry em Port Said.

O presidente da Câmara Baixa do Parlamento egípcio, o islamita Saad Katatny, atualmente a mais alta autoridade escolhida pelo povo, situou o ponto de mira nas forças de segurança.

Em um duro discurso hoje durante uma sessão extraordinária do Parlamento, Katatni, membro dos Irmãos Muçulmanos, atribuiu a tragédia de Port Said, que terminou com mais de 70 mortes, à 'deficiência e negligência' das forças da ordem.


O político considerou que os agentes de segurança 'não cumpriram nem com sua missão nem com sua profissão pela falta de organização perante estes eventos'.

Segundo algumas testemunhas disseram à Agência Efe, os torcedores do Al Masry não encontraram nenhuma resistência por parte das dezenas de agentes antidistúrbios no campo quando invadiram o gramado após o jogo para linchar os jogadores do Al Ahly.

Os meios de comunicação independentes também não pouparam críticas ao papel da Polícia, e o jornal 'Asshuruk' viu em Port Said uma reedição da chamada 'Batalha do Camelo', que justamente hoje completa um ano.

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O certo é que as promessas da Junta Militar sobre uma investigação entre os altos cargos da Polícia não parece ter mudado muitas coisas em um órgão que ainda é visto como partidário do antigo regime.

Em dezembro do ano passado, o primeiro-ministro egípcio, Kamal al Ganzuri, designou ministro do Interior o general Mohammed Ibrahim Yousef, que tinha sido chefe da polícia da província de Guiza até 2000 e posteriormente responsável por Assuntos Penitenciários.

Em julho, o antigo ministro do Interior, Mansur Esawi, outro veterano do antigo regime, anunciou com estardalhaço a 'maior substituição de altos oficiais na história do departamento', mas essa mudança ainda não foi sentida.

Muitos blogueiros e ativistas se perguntam hoje no Egito como é possível que as eleições legislativas sejam realizadas à revelia dos incidentes, e, no entanto, possa acontecer uma tragédia como a de ontem à noite diante da impassibilidade policial.

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