Papa rejeita renúncia de cardeal francês e revolta vítimas de pedofilia
O papa rejeitou a renúncia do cardeal francês Philippe Barbarin, condenado por encobrir um caso de pedofilia envolvendo menores de idade em sua diocese
AFP
Publicado em 19 de março de 2019 às 14h40.
Última atualização em 19 de março de 2019 às 14h43.
O Papa Francisco rejeitou a renúncia do cardeal francês Philippe Barbarin, condenado a seis meses de prisão com sursis por não denunciar os crimes sexuais de um padre, revoltando as vítimas que consideram o sacerdote um símbolo do silêncio da Igreja frente à pedofilia.
Segundo um comunicado do Vaticano, o papa evocou "a presunção de inocência" para o caso do cardeal.
"Na segunda-feira de manhã, coloquei minha missão nas mãos do Santo Padre. Ao invocar a presunção de inocência, ele não quis aceitar essa renúncia", disse Barbarin, considerado o mais alto dignatário da Igreja católica na França.
Desta forma, ele que continuará arcebispo de Lyon (leste) à espera de seu julgamento em apelação, mas anunciou que deixará os assuntos correntes da diocese para o atual vigário geral, o padre Yves Baumgarten, "por sugestão" do papa e "porque a Igreja de Lyon está sofrendo".
O Vaticano confirmou, por meio de comunicado, que "o Santo Padre não aceitou a demissão apresentada pelo cardeal Philippe Barbarin", arcebispo de Lyon desde 2002, cardeal desde 2003, primaz da Gália (título honorário conferido ao arcebispo de Lyon desde o século XI).
"Consciente, porém, das dificuldades vividas atualmente pela arquidiocese, o Santo Padre deixou o cardeal Barbarin livre para tomar a decisão mais apropriada para a sua diocese", acrescenta o texto.
Este anúncio provocou a indignação das vítimas de pedofilia na diocese de Lyon, que a consideraram "a d'água".
"Para mim, parecia impossível que (o papa) cometeria tal erro. É inacreditável", reagiu à AFP François Devaux, cofundador da associação de vítimas Parole libéreé.
"Eu acredito que esse homem vai conseguir matar a Igreja", acrescentou, enquanto outro integrante da associação, Pierre-Emmanuel Germain-Thill, lamentou uma decisão "chocante" e "um novo passo em falso" por parte do papa.
A Conferência Episcopal da França, em uma declaração na qual tomou incomum distância, expressou sua "surpresa" com uma "situação inédita".
O presidente da CEF, monsenhor Georges Pontier, afirmou que compreendia que a decisão do papa resulta do "conflito entre duas exigências", aquela de "respeitar o curso da justiça" e aquela de "cuidar do bem estar da diocese de Lyon".
Barbarin, de 68 anos, uma idade precoce na Igreja para renunciar, foi condenado em 7 de março a seis meses de prisão com sursis por seu silêncio sobre os ataques pedófilos cometidos pelo padre Bernard Preynat nos anos 1980/1990 e sobre os quais ele havia sido informado por uma vítima em 2014.
O cardeal insistiu durante seu julgamento que "nunca procurou esconder, muito menos acobertar esses fatos horríveis". Mas o acórdão acusa-o de ter optado por não dizer nada às autoridades francesas "para preservar a instituição" da Igreja, impedindo assim "a descoberta de muitas vítimas de abuso sexual pela justiça".
Apesar de o bispo querer se demitir para apaziguar sua diocese, onde sua presença agora é difícil, ele já recorreu de sua condenação.
O Papa Francisco, por sua vez, defendeu por muito tempo o cardeal francês. Em 2016, considerou que uma demissão antes do julgamento seria "uma imprudência".
Em outubro, Francisco concordou relutantemente, e depois de três semanas de reflexão, a renúncia do cardeal americano Donald Wuerl, arcebispo de Washington suspeito por um júri popular de ter abafado um vasto escândalo de abuso sexual na Pensilvânia (nordeste Estados Unidos).
O prelado americano de 77 anos, que afirma ter agido "no interesse das vítimas" e foi elogiado pelo papa, não foi condenado como o cardeal francês.