O destino incerto da Venezuela e seus impactos para o Brasil
Mais de 20 milhões de venezuelanos poderão ir às urnas neste domingo para escolher o seu presidente pelos próximos 6 anos; mas o que esperar do resultado?
Repórter
Publicado em 27 de julho de 2024 às 21h37.
Última atualização em 28 de julho de 2024 às 00h00.
Neste domingo, 28, mais de 20 milhões de venezuelanos poderão ir às urnas para escolher o seu presidente pelos próximos 6 anos. O voto não é obrigatório, mas a disputa entre dois candidatos promete tirar muitas pessoas de casa.
Nicolás Maduro e Edmundo González Urrutia são os dois candidatos que mais se destacam nas pesquisas. Como presidente desde 2013, Maduro busca o seu terceiro mandato, já Urrutia tem como missão acabar com 25 anos de governos chavistas.
Assim como no Brasil, o voto será realizado em urna eletrônica, e os locais de votação serão abertos das 6h às 18h (horário local), das 7h às 19h (horário de Brasília).
O destino da Venezuela, independente do resultado ainda é incerto, mas os impactos dessa eleição podem atingir países vizinhos, como o Brasil.
O venezuelano Rafael Duarte Villa chegou ao Brasil em 1988 e atualmente atua como professor titular de ciência política e relações internacionais da USP. Para ele, um dos alertas que o Brasil deve ter com as eleições venezuelanas é a questão da imigração.
“A proximidade geográfica faz com que a imigração da Venezuela tenha um impacto direto no Brasil, caso a crise política se intensifique nos próximos meses, além de poder trazer impactos para outros países por ser um país petroleiro”.
Outro impacto que o Brasil pode ter é com a imagem a nível global. Segundo Carolina Silva Pedroso, professora de Relações Internacionais da Unifesp, qualquer instabilidade na vizinhança pode ser negativa para o Brasil.
“Uma crise política na Venezuela pode afetar a nossa imagem internacional como liderança regional, afinal, como queremos opinar na guerra da Ucrânia, se mal resolvemos as pendências do nosso entorno”, diz a professora que também destaca a questão da imigração.
Por que María Corina Machado foi proibida de disputar eleições com Maduro?
Maria Corina Machado seria o principal nome para fazer frente a Nicolás Maduro, mas processos antigos a impedem de se candidatar este ano.
“Ela tem processos desde 2014, ou seja, bem anteriores à possibilidade de ela ser candidata presidencial", afirma a professora da Unifesp, que explica que Machado foi julgada e condenada por três tipos crimes, segundo, é claro, o sistema judiciário da Venezuela, acusado internacionalmente de ser cooptado pelos chavistas:
- Incitação à violência e traição à pátria durante os protestos de 2014: ela chegou a clamar por intervenção militar estrangeira;
- Falsidade ideológica: ela se apresentou como embaixadora da Venezuela, enquanto era, na verdade, deputada de oposição, em uma assembleia da Organização dos Estados Americanos;
- Improbidade administrativa do período em que foi deputada e, posteriormente, por colaborar com Juan Guaidó na gestão de ajuda humanitária recebida do exterior que, em tese, foi desviada e nunca chegou ao seu destino.
A pessoa indicada terá força contra Maduro?
Quem entrou no lugar de Machado foi o diplomata aposentado Edmundo González Urrutia, sem histórico de atuação de política e traquejo para discursos, diz Pedroso.
“Ele lê tudo, nunca fala de improviso e está sempre acompanhado de Maria Corina Machado nos comícios, mas apesar de tudo, tem conseguido angariar um apoio importante mundo afora”, diz. “Sobretudo por suavizar a radicalidade do discurso de Machado ao defender a conciliação e a convivência pacífica entre as partes no pós-eleição”.
Quais serão os impactos dessa eleição para a Venezuela?
Sobre as possibilidades de vitórias de um ou de outro, o cenário imediato será semelhante, afirma Pedroso que é especialista em América Latina. Para ela, se Maduro se reeleger, pairarão dúvidas sobre a legitimidade e certamente a comunidade internacional questionará os resultados.
“Ele provavelmente continuaria tendo o apoio dos mesmos aliados internacionais que já tem, China, Rússia, Turquia e Irã, mas teria mais dificuldades na América Latina e outras potências ocidentais", diz a professora da Unifesp.
Por outro lado, se González vencer o governo provavelmente não será questionado sobre o processo eleitoral em si, mas poderia acusar a oposição de ter contado com apoio estrangeiro para interferir da dinâmica política interna.
“Ele deve ter grande apoio internacional, mas dificilmente terá a fidelidade das Forças Armadas, que são o grande fiel da balança na Venezuela”, afirma a professora que reforça um fator adicional que complica a situação. “A eleição é domingo, mas a posse é só em janeiro de 2025, até lá a tensão deve persistir entre os dois lados, que estão convencidos de que podem e vão ganhar e não parecem dispostos a reconhecer qualquer resultado diferente”.
Após 11 anos, Maduro sente que seu mandato está ameaçado. Para a professora da Unifesp, o que a Venezuela mais busca no próximo governo é a melhoria das condições de vida, principalmente o poder de compra.
“Para um venezuelano médio conseguir ter o mínimo, normalmente ele precisa ter mais de um vínculo empregatício. Outras questões são a melhoria dos serviços sociais, como vacinação que foi muito afetada pela crise, com crianças sem acesso às vacinas obrigatórias e retorno de doenças já erradicadas. Falta também investimento na educação, além da própria questão política referente à liberdade de expressão", afirma Pedroso.