"Nunca vamos entregar as bandeiras", diz chefe da Constituinte
Em entrevista, Delcy Rodríguez garantiu que sua aposta na Constituinte não é uma questão de poder, mas de fidelidade à revolução
AFP
Publicado em 4 de agosto de 2017 às 17h53.
Delcy Rodríguez, a beligerante ex-chanceler que o presidente Nicolás Maduro chama de "tigresa" por sua defesa ao governo socialista, não se sente uma figura poderosa do chavismo.
Em entrevista à AFP, uma semana antes de ser designada presidente da Assembleia Constituinte, ela garantiu que sua aposta na Constituinte não é uma questão de poder, mas de fidelidade à revolução.
"Nunca vamos entregar as bandeiras", disse a advogada de de 48 anos, em um palácio no centro de Caracas.
Para que fazer a Constituinte?
É a única saída imediata que temos para resolver os problemas entre os venezuelanos, garantir a paz, derrotar a violência. Frente às balas e ao ódio, votos. A nova Constituição será submetida a um referendo, ali estará sua legitimidade.
A oposição diz que será instaurada uma ditadura comunista. O que você acha disso?
Uma Constituinte não pode retroceder os direitos que já estão na nossa Constituição. Pelo contrário, é para os direitos progredirem.
Vai haver uma caça às bruxas?
Não se trata de perseguir pessoas, mas o crime. Uma das propostas que levarei à Constituinte é transferir a propriedade da ação penal do Ministério Público para a vítima.
A direita substituiu a ação política pela criminal. Você nunca viu a direita condenar cada vez que lincham ou queimam viva uma pessoa (...) por ser chavista.
A maioria desses dirigentes têm imunidade parlamentar, mas assumiram uma espécie de licença para cometer crimes.
O Parlamento será dissolvido?
O que é valorizado é a convivência, deve acontecer um processo de coexistência. O que não pode acontecer é que os poderes constituídos desconheçam as decisões tomadas pela Constituinte.
Em 1999, ambos funcionaram no mesmo prédio (o Palácio Legislativo).
O que vai acontecer com a Procuradoria?
A Justiça está em dívida com os postulados de igualdade da revolução, porque deve ser imparcial, não deve ter peso político. Esse equilíbrio se rompeu, e por isso vamos construir um verdadeiro Estado de Direito.
Alguns países dizem que não reconhecem a Constituinte. Ela tem legitimidade?
Me parece ridículo ver expressões dessa natureza. A posição dos Estados Unidos é de agressividade em todo o mundo. A Venezuela ergueu sua voz e por isso seu modelo é considerado uma ameaça.
Você se sente uma figura poderosa do chavismo?
Não se trata de poder, se trata de fidelidade a um projeto histórico, a Bolívar, a construir uma pátria livre, soberana, independente.
Quando eu comecei a ir às ruas (como candidata da assembleia), me dei conta de que ali estava um povo e que eu só era uma transmissora desse sentimento do venezuelano.
O chavismo está debilitado?
Não, o chavismo é uma força viva. Se não, não teríamos resistido a sanções, agressões midiáticas, econômicas, bloqueios financeiros. Nós não estaríamos aqui. Não deram trégua ao presidente Maduro um dia sequer, mas, se não fosse por Chávez, a Venezuela seria em outra situação.
A Constituinte vai ajudar no diálogo?
Quando a direita ganhou o Parlamento em 2015 se deu um desequilíbrio profundo, porque uma de suas primeiras ações foi desconhecer o chavismo. Esse desequilíbrio será reparado pela Constituinte.
Maduro revelou diálogos com a oposição. Por que não foram à frente?
O principal problema é que a Venezuela não tem uma liderança unificada na oposição para alcançar qualquer tipo de acordo, ela está profundamente dividida.
Mas vamos persistir, a única via é o diálogo. A Constituinte não é para aniquilar o adversário, é para o reconhecimento, a convivência e o diálogo.
O diálogo será para negociar a saída do chavismo?
Jamais, nós nunca vamos trair nosso projeto histórico, nunca vamos entregar as bandeiras. Estamos dispostos ao entendimento mediante o diálogo. Para a paz, tudo; para a guerra, nada. O chavismo não enfrenta a direita venezuelana, mas os poderes mundiais, dos quais essa direita é um instrumento.